Relatos sobre o Fora do Eixo

Marcus Faustini

Agência de Redes para Juventude

desconfio de qualquer pessoa que tenta demonizar a Fora do Eixo e Pablo Capilé. Uma coisa é fazer crítica, outra é demonizar. Digo isso deste lugar: nunca fui alinhado diretamente com a organizacão, mas sempre tive grande admiração pela capacidade de invenção de um novo lugar no imaginário da cultura desta garotada boa. Já discordei, concordei, deixei claro minhas críticas e também fui criticado por eles.Com outros parceiros que respeito muito, mais críticos com a FDE, também já defendi aspectos da experiência e também já fiz coro nas críticas.Entretanto, o que está acontecendo agora não é crítica, é demonização.E não posso concordar com este caminho que, ao infantilizar o debate, caminha para o autoritarismo.Sim, demonizar algum grupo ou pessoa é um dos aspectos do autoritarismo, como surto de uma multidão apavorada que pretende queimar um corpo para se livrar de algo que os assombra por ser novo e ainda não captura-se.Quero chamar atenção de todos que estão se aventurando nesta trama, que é preciso saber o por que isto está acontecendo, o por que desse linchamento que junta tanto atores sociais diferentes, independente das críticas.

1- a fde não vem do dna da intelectualidade estabelecida
2- a fde disputou um modo de producão da indústria musical no país.
3- a fde disputou a narrativa do imaginário da cultura nos últimos anos.
4- a fde incomodou aqueles que narravam as manifestações ao disparar o ninja
5- a fde disputa o campo de influência de políticos importantes

Esse é o motivo da demonização, o tamanho que a fde virou, a sua força, a sua capacidade de realização. É a peça teatral Roda Viva, do Chico Buarque, acontecendo na vida. E assim, devo alertar que massacrando-os, nao estaremos melhorando como campo social.Voltemos as críticas ao fde, as críticas apaixonadas pelas diferentes visões de sociedade, mas sem demonização.

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Atilio Alencar

ex-membro do Fora do Eixo Porto Alegre

A quem possa interessar: sobre a polêmica da vez, o Fora do Eixo.

Antes de mais nada: se alguém espera ler aqui uma fábula de terror psicológico pontuada por requintes de crueldade ou um conto de fadas sobre dedicação e superação, esqueça. Não tenho a mínima intenção de engrossar o caldo dos relatos passionais contra ou à favor do Fora do Eixo. Aliás, acho lamentável que tanto quem ataca quanto quem defende, tem optado por adotar uma linha de exacerbação dos aspectos pontuais que ora geram a ideia de uma rede análoga a um pesadelo com grades de ferro, ora pintam em cor de rosa a experiência da vida em coletivo. Prefiro pensar que em algum ponto entre esses extremos, podemos tratar do fenômeno da organização em si, do que ela significa, e não do conjunto de seus dramas individuais.

Pois bem. Minha história junto ao FdE faz mais sentido se contada do final – porque o início não difere muito de mil outras histórias: apenas um rapaz latino-americano querendo viver o mundo da produção cultural para além do caráter estrito do mercado, lá pelos idos de 2009. Foi em dezembro do ano passado que, depois de um processo de longos meses de reflexão, tomei a decisão de comunicar meu afastamento da rede – e mais precisamente, da casa que eu compartilhava com outras cinco pessoas em Porto Alegre. O procedimento para comunicar meu desligamento de uma rotina de muito trabalho, viagens e reuniões inacabáveis (sim, no FdE, boa parte do seu tempo desperto é, ou ao menos era, ocupado por reuniões on line e off line) foi razoavelmente simples, muito embora doloroso por motivos pessoais. Sentamos na sala da casa de onde não faria sentido eu evaporar sem conversar com as pessoas; expus meus motivos, ouvi questionamentos, respondi os que me eram possíveis, me reservei o direito de silenciar sobre motivações de caráter íntimo. Ouvi votos de felicidade, senti o desapontamento de alguns no olhar, trocamos abraços sinceros e vim-me embora para Santa Maria, cidade de onde havia saído cerca de um ano e meio antes para encarar a empreitada de trabalhar e viver em Poa. Nunca fiz questão de alardear minha saída publicamente, justamente para evitar especulações ou figurar nas intrigas que naturalmente viriam a surgir, dado a curiosidade doentia sobre a vida alheia que vez ou outra pauta as rodas e redes sociais. Contei para os mais chegados, não menti quando alguém me perguntou; mas alarde, não vi motivo pra fazer. E da confusão e fragilidade emocionais comuns aos tempos de transição, fui aos poucos me reorganizando, reencontrando velhos hábitos e amigos, constituindo um novo – ou velho – modo de vida. Mesmo das atividades que precediam minha adesão ao FdE, me vi repentinamente deslocado. Já não fazia sentido, por exemplo, seguir associado ao Macondo Lugar, casa noturna que ajudei a fundar oito anos atrás. Uma vez que a gestão da casa havia passado por um processo de coletivização, e a mim já não interessava estar imerso em um estilo de vida coletiva, o rompimento se fez a atitude mais coerente a ser tomada. E assim procedemos, formalizando meu afastamento definitivo do quadro de sócios do Macondo, mediante aquisição das minhas cotas-proprietárias pelos demais administradores.

Dessa passagem da minha vida, o que poderia interessar ou contribuir para as discussões atuais? Acho que alguns pontos merecem ser sublinhados: desde que saí do FdE, rompi contato com praticamente todo mundo da rede, salvo raras e brevíssimas excessões. Não me tornei, no entanto, nenhum recluso, muito menos nos ambientes virtuais. Falo muito, opino muito, teço críticas e elogios no campo da política, da comunicação e da arte, me envolvo em campanhas orientado única e exclusivamente por minha vontade individual de participar dos debates contemporâneos. Nunca recebi mensagem dos gestores do FdE, entretanto, recomendando cautela ao assumir posições políticas em função da natural confusão que minha saída não divulgada poderia causar – e de fato causou. Critiquei abertamente interlocutores do FdE, fiz críticas que poderiam muito bem ser endereçadas a eles, e assim como não sofri assédio na ocasião de meu afastamento, também não o senti ao optar pelo dissenso. Se aconteceu com outros, como está sugerido em alguns relatos recentes, e isso não se tornou um debate aberto, me pergunto quais teriam sido os motivos do silêncio. Não há registro de “queima de arquivos” por parte do FdE, e a condição franzina da maioria dos meninos da rede não chega a inspirar receios quanto à violência física. Se a mim fosse recomendado o silêncio, eu teria respondido fazendo uso da minha liberdade de expressão – e não teria esperado nenhum segundo sequer para isso. Estranho que a enxurrada de depoimentos das supostas “vítimas” coincida com o momento de visibilidade global da Mídia Ninja (iniciativa que tem origem junto aos midialivristas do FdE); se isso não invalida o debate, como de fato não o faz, ao menos suscita questionamentos sérios sobre integridade e oportunismo por parte de quem efetua os ataques. Não há discurso descomprometido, e me intriga a motivação tardia dos que resolveram só agora falar.

Mas isso é só desconfiança minha, e portanto, vazia de valor porque carente de fundamentação. Melhor seria, talvez, aproveitar o gancho de algumas denúncias para ampliar o debate.

Sobre a Beatriz Seigner e sua malfadada experiência com o FdE: não a conheci pessoalmente, assim como não estive diretamente envolvido em nenhuma conversação com ela. Mas lembro de uma troca de e-mails que acompanhei como observador, que registrava sua indignação com o que ela classificava de “descaso” com a arte por parte dos integrantes do FdE. Segundo Beatriz, o fato de as pessoas ligadas à rede não consumirem bens culturais na mesma medida em que se envolviam com produção ou discussão sobre políticas públicas seria um atestado de miséria estética e intelectual, uma falha imperdoável na formação individual, uma opção intencional pela pobreza de espírito. Isso, essa leitura dela, dá margem para uma discussão pertinente, mas que não traz em si nenhuma novidade. A relação entre militância e fruição remonta, quem sabe, ao início do século passado, ou antes. Mas tem outros elementos a serem levados em conta. Particularmente, pertencendo à geração que pertenço (não sou um nativo da era digital; a maior parte das minhas leituras não se realiza na tela de um monitor), me causa estranhamento a rapidez vertiginosa com que se acessa hoje (via downloads de arquivos compartilhados ou streamings que não geram remuneração para o autor) vastas discotecas que são tão facilmente acumuláveis quando descartáveis. Sou mais habituado ao tempo dos discos de vinil e laser, seus rituais de eleição e sua atmosfera, seu tempo fora do tempo funcional. As trilhas sonoras da minha vida, elas não me arrebataram enquanto eu manipulava uma planilha no Google Docs, nem cabem na urgência do formato mp3. Mas isso não significa que eu ache plausível pautar a discussão sobre Cultura Digital à partir das minhas preferências ou caprichos. Quando o FdE faz a opção aparentemente etapista de primeiro fazer e depois aproveitar, eu não estou de pleno acordo. Mas consigo entender a provocação contida na frase “ler é perda de tempo”. Já ouvi, aliás, consideração semelhante por parte de intelectuais engajados em relação à ficção e poesia. Fiquei surpreso, mas entendi a opção como um gesto radical que descarta a leitura recreativa em nome do domínio das ferramentas conceituais de luta. Além disso, com os jovens do FdE provavelmente ocorra o que ocorre com uma geração inteira: sua forma de assimilar é outra, a simultaneidade se apresenta como o modo óbvio de lidar com os diversos campos de conhecimento, os suportes passivos (como livros e discos) estão desgastados perto do grau intenso de interação virtual, e sua atenção é difusa demais para ser suportada em uma página de cada vez, como exige a leitura tradicional. Se isso é bom ou ruim? Nem acho que possa ser avaliado em tais termos. Mas é diferente, intrigante. Abre novas possibilidades de formação, com os quais a educação formal não sabe ainda como lidar. Daí a dizer que é mais pobre, eu não diria; muito menos desautorizaria essas pessoas a debater cultura dessa nova perspectiva. Assim, no campo simbólico, eu prefiro ler na reclamação da Beatriz mais um desconforto dela frente ao modo irreverente com que as novas gerações se colocam frente à ideia de cultura, do que propriamente uma denúncia de “traição à arte”. Porque se sua equação for simplista a ponto de dividir o mundo entre analfabetos e ilustrados culturais, entre alta e baixa cultura, estaríamos falando de uma artista nos moldes aristocráticos, indissociável dos milhares de pedantes que ainda tratam de arte como tema para espacialistas. E imagino que a Beatriz, sendo a artista-pesquisadora que é, não deve querer ser considerada um deles.

Ainda quanto às expectativas frustradas expressas pela Beatriz em sua carta, percebo ali o descontentamento habitual de quem produz cinema, contando com parcos recursos e boas ideias, e sofre com o constante risco do vácuo, do produto visto por poucos e logo engavetado, ou perdido em meio aos ruidosos canais virtuais, onde a tarefa de se separar o joio do trigo é sensivelmente mais desafiadora. Mas é um discurso de autoralidade, por si só discutível, como tudo o é, nesses tempos de ressignificação. Ela viu no FdE a oportunidade de fazer decolar seu filme. Quem sabe uma fala mais apaixonada tenha despertado nela o vislumbre de uma fórmula alternativa e supostamente infalível de sucesso; mas o projeto, seja pelo motivo que for, não foi levado adiante. Imagino o tamanho da decepção, mas não consigo, sinceramente, ver nesse naufrágio nenhum indício de crime capital. Produtoras convencionais concebem e engavetam projetos com a mesma naturalidade com que trocamos de roupa. Porque seria diferente com coletivos que dependem diretamente da mobilização de pequenas células e da incerteza orçamentária para viabilizar suas ideias? O que não entendo – e isso não passa por deslegitimar a Beatriz como uma interlocutora importante em momento algum – é como e porque, à partir de uma insatisfação pontual de um autor em relação ao projeto que envolvia o seu filme, se constroi misteriosamente uma convergência entre colunistas da imprensa corporativa, articulistas partidários, teóricos radicais do “comum” e militantes ocasionais. Vocês conseguem perceber a contradição gritante implicada em, por exemplo, em defender o copyleft e reconhecer e exaltar o pixo e o remix como linguagens artísticas autênticas, e ao mesmo tempo, aderir e tomar como sua uma campanha essencialmente orientada pela noção de propriedade intelectual? Pois eu tenho lido arroubos de irracionalidade muito intrigantes, nesse sentido. Coisa típica de uma caça às bruxas, na qual o consenso sobre o acusado é mais importante que os diversos discursos que, mesmo contraditoriamente, o sentenciam.

Agora, se o que a Beatriz cobra no seu texto for verdade, sobre compromissos financeiros supostamente assumidos e não cumpridos, imagino eu que a solução é simples: que seja calculado e pago o que o Fora do Eixo deve à ela. Simples. Se em nenhum momento houve acordo quanto a um cachê desmonetarizado, se ela não se sentiu contemplada por trocas de serviço, se houve qualquer espécie de engodo ou calote, a dívida é vigente e tem que ser sanada. Se, no entanto, ela mudou de ideia somente um ano depois sobre o acordo firmado, fica como uma experiência de resultados aquém dos projetados, mas não distorcidos nem criminosos. Aliás, quanto ao filme da Beatriz, que não deveria ser eclipsado no debate aberto por ela: lembro que assisti quando houve a exibição em Porto Alegre e gostei bastante; se não me engano, aqui em Santa Maria, segundo o relato das pessoas que o projetaram, a exibição reuniu cerca de 100 pessoas, o que é um número considerável para qualquer um que conheça a realidade dos cineclubes. Ou seja, não me parece que tenha sido uma parceria totalmente infrutífera.

Já quanto ao texto da Laís, que importa no que diz respeito à organização interna do FdE e no modo de convívio entre os integrantes dos coletivos, vou buscar dar um relato que abrange apenas parcialmente a experiência da rede, mas que considero um ponto de vista importante, dado que fui morador da segunda Casa Fora do Eixo criada no país. Dividi o espaço com cinco outros moradores fixos e vários viventes ou hóspedes que passaram pela casa. Vi gente deslumbrada num primeiro momento que simplesmente percebeu que a vida coletiva não era o que esperava, ao menos ali, depois de poucos dias. Vi gente chegando desiludida com a vida universitária e aos poucos se aprimorando em linguagens como fotografia, edição, design gráfico. Vi gente se divertindo ao compartilhar as tarefas domésticas mais prosaicas, e brigando por motivos ordinário (embora isso não fosse regra). Vi gente satisfeita quando as coisas davam certo e desestimuladas quando davam errado; alguns, como eu, buscavam os velhos amigos ou a família quando achavam que o convívio estava saturado, viciado, ou se encontravam numa fase depressiva. Assim como seres humanos normais, entendem? Cheios de convicções e dúvidas, oscilações, companheirismo, divergências, mas nunca desprovidos do direito primordial de optar pela porta da rua. Sobre quase tudo, se conversava abertamente, numa tentativa de desmistificar tabus e crises pessoais. Se isso é escravidão, não saberia como definir qualquer outro ambiente de trabalho ou estudo. As opções, quando se está num coletivo, para mim seguem parecidas com as de outras situações da vida social, e por maior que seja o grau de autonomia, não há garantias dentro nem fora. Tudo depende da soma da sua disposição, sensibilidade e diversos outros fatores externos que não são determinados por uma simples escolha. Não fosse assim, estaríamos vivendo numa sociedade livre. E não é o caso do sistema capitalista, pelo que me parece.

Há casos de machismo no Fora do Eixo? Eu não diria que há casos, porque isso levaria a supor que existe algum ambiente social imune à essa tradição, onde já tivéssemos superado os séculos de patriarcado em nome de uma igualdade de condições, em que o machismo fosse tão somente um “tropeço”. Havia incidência e discussão. Havia, como deve haver ainda, laboratórios, oposições, falas e silêncios. No tempo em que morei na Casa Fora do Eixo em Poa, executei tarefas como a limpeza dos banheiros, ao mesmo tempo em que achei normal que as mulheres predominassem no revezamento na cozinha. Por preconceito ou costume (o que dá no mesmo, nesse caso), mas com a diferença que ali isso não estava naturalizado, não era uma prática blindada. Fui tão machista vivendo lá como tento não ser em qualquer outro lugar. Se agi, eventualmente, como se nós homens tivéssemos alguma atribuição exclusiva, e as mulheres idem, isso não foi tema proibido em reuniões de avaliação. Minha proposta de desconstruir o machismo em mim não é nenhuma garantia de “cura”; imagino que deve ser assim como todo homem que se propõe a encarar um processo parecido. O desafio de romper com os paradigmas sociais de opressão começa na escala das micro-relações, geralmente as menos perceptíveis. Assim, se até mesmo a Laís foi perceber, segundo ela mesma, que várias vezes protagonizou disputas movidas pelo egocentrismo, ela pode bem imaginar que o restante dos moradores não estaria livre desse tipo de atitude. Talvez eu encarasse o relato de forma distinta se nunca houvesse saído do ambiente familiar para viver em repúblicas estudantis, se não tivesse enfrentado o cotidiano de truncada administração que muitas vezes torna a lavagem da louça uma crise em potencial, ou a negociação dos quartos uma questão essencial para a privacidade. Mas tudo isso eu vivi antes do FdE, e não me causa estranhamento que um coletivo com organização interna eleve essas questões a um nível mais rigoroso, estabelecendo regras de convívio. Regras são discutíveis, claro. Mas não posso concordar, porque não testemunhei nada parecido, que a carga de trabalho das mulheres no FdE as coibisse do convívio social, ou que as relegasse a postos subterrâneos. Na casa onde morei, inclusive, as gestoras eram praticamente todas mulheres, com idêntico ou maior espaço de fala que os homens. Pelo que percebo em publicações nas redes sociais, segue sendo assim. E não foram poucas as vezes em as meninas, tanto quanto os meninos, largavam o que estavam fazendo para desestressar numa mesa de boteco.

Que o choque de uma vivência assim seja negativo para alguns, não tenho porque duvidar. Que tenha perturbado o equilíbrio psicológico da Laís, acredito também. Afinal, do pouco que conheço dela, através dos relatos que ela mesmo fez, percebo que se propôs a uma reviravolta grande na vida. Mas o exercício do livre-arbítrio está aí para garantir a nossa saúde, em caso do meio ser encarado como opressor. Foi o que ela fez, o que me parece uma atitude coerente com suas aflições. Só não entendo exatamente porque a insistência no tom proscritivo, como se nossos fracassos pessoais fossem indexadores das experiências alheias.

Mas enfim, me demorei mais do que gostaria na análise dos relatos que vieram à tona recentemente. Acho que movido pelo tom sensacionalista com que foram divulgados e até festejados, de maneira eufórica pelos mais obcecados, eu posso ter me contaminado pelo clima de “Fla x Flu”. Não acho que seja o caso de cair na cilada da polarização “bem versus mal”. Nem acho que o FdE, por ter sido a organização na qual militei num passado recente, esteja acima dos debates necessários. Mas desconfio muito de todo linchamento público cuja justificativa seja a “moralização”. Nisso, com todos os erros – coletivos ou individuais – que possam estar contidos na atuação do FdE, eu acho que há uma pressa estranha em classificar o coletivo como a “maçã podre” das organizações contemporâneas. Quando oriundas da direita, a vulgaridade das críticas não me surpreende: “máfia”, “cartel vermelho” e “petralhas” são infâmias recorrentes nas bocas de parte da grande imprensa; já algumas críticas que se pretendem à esquerda, surpreendem pela incongruência entre o que exigem e o que de fato praticam enquanto coletivos. Grupos de intelectuais formados por carreiristas acadêmicos e empresários convencionais, repentinamente, convertem-se em juízes de qualquer concessão, como se o lugar de sua fala fosse isento das contradições que condenam com tanta veemência.

A isso, ao espetáculo da carnificina que iguala humores antagônicos, eu prefiro o viés que disputa essas novas organizações pela esquerda, mas sem a paixão pela derrota. Antes de qualquer condenação sumária, eu quero é apostar que o Fora do Eixo vai assumir a responsabilidade histórica de estabelecer uma ética radical de transparência, criando canais de debate ainda mais densos sobre a relação financiamento e autonomia no Brasil. Eu quero mais é que as camadas retóricas que porventura possam obscurecer o funcionamento das moedas soldárias sejam amplamente aprofundadas, gerando materiais didáticos legíveis, de fácil replicação e adequação por parte de empreendimentos periféricos e colaborativos. Se o feminismo no FdE é incipiente, eu desejo mesmo é que a organização seja provocada a debater com as feministas clássicas e com as vadias contemporâneas os projetos de luta e emancipação feminina. Que o papel de uma rede como o FdE enquanto entidade de interesse público seja de fato hackeável, que toda tecnologia gerada pela rede seja posta a serviço dos movimentos sociais sem ônus nem acúmulo material ou simbólico para nenhum dos envolvidos. Que movimentos ainda precarizados tecnologicamente se apropriem e potencializem sua atuação à partir do compartilhamento de saberes. Que a Mídia Ninja seja lida como mais uma das experiências interessantes, e que seja canibalizada por outras mídias, menores, invisíveis, autônomas, para que no caso dos ninjas sucumbirem ao mercantilsmo da informação, outros tantos tentáculos sigam fazendo o contraponto nas ruas. Que uma liderança como Pablo Capilé (porque sim, Pablo é uma liderança e das mais instigantes) seja constantemente intimado a renunciar à tentação do poder cristalizado em nome de estar junto, mas nunca acima dos movimentos sociais.

Pra mim, se não for isso, é recuar pela direita; é como se decidíssimos nos retirar das ruas com medo das marchas serem cooptadas pelo inimigo, ao invés de disputá-las.

Basicamente, é isso que eu tinha pra dizer.

*Ah, sim, só mais um detalhe: você que se declarou chocado com as supostas “terríveis violações de direitos humanos” praticadas por integrantes do Fora do Eixo, mas adora fazer uma piada com a deformidade labial do Capilé, saiba que o inferno é mesmo cheio de contradições. Piadas são um tipo de discurso que naturalizam preconceitos; mulheres, negros e gays que o digam.

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Dríade Aguiar 

Integrante do Fora do Eixo publica texto em resposta às críticas e denúncias da cineasta Beatriz Seigner

 

Polêmica envolvendo Beatriz Seigner e o Fora do Eixo ocorreu após denúncias da cineasta contra o grupo. Bruno Torturra, integrante da mídia ninja, também publicou uma resposta. Confira abaixo a íntegra do texto de Dríade Aguiar.
Dríade Aguiar, Facebook
Você que vai ler este texto provavelmente não me conhece. Eu sou a Dríade Aguiar e tenho 23 anos. Sou negra e nasci na periferia de Cuiabá. Hoje moro na Casa de Brasília, vivendo o Fora do Eixo, grupo ao qual pertenço desde os 16. Por dois anos morei na Casa de São Paulo, onde conheci e convivi por quase um ano com a Beatriz Seigner. A quem eu já tive como uma amiga.
Faz vários dias que estou escrevendo este texto. E pensando se devo ou não publicá-lo. Depois de tudo que tenho visto nos últimos dias, decidi que não vou ficar mais com essa angústia guardada só pra mim.
Eu sou uma das escravas do Fora do Eixo. A Beatriz não, ela é alta, branca, bonita e vem de uma família de elite. Por isso ela pode escolher. Ela sabe o que quer. E por isso pode dizer que eu sou apenas uma escrava que segue ordens de um líder de uma seita. Por isso talvez em breve ela apareça na capa da Veja, como a moça corajosa que denunciou os bárbaros do Fora do Eixo. E salvou os escravos que agora poderão ser seus assalariados, no máximo assistentes de sua direção.
fora do eixo beatriz seigner
Dríade Aguiar, autora do presente texto. (Foto: Arquivo pessoal / Facebook)
Tô impressionada como algumas pessoas passaram a nos atacar a partir de um relato repleto de invenções fraudulentas de alguém que eu ja achei que foi parceira. De alguém com quem trabalhei lado a lado por quase um ano de graça, sem receber nada dela, fazendo planos de comunicação pra divulgar seu filme e ajudando a agendar exibições. E ao mesmo tempo, quando ela ficava tempo o suficiente perto, dividindo pensamentos, ouvindo música, fazendo rango e planejando junto.
A Beatriz entrava na nossa casa na hora que bem entendia. E ficava o quanto desejava. Quem conhece nossas moradias coletivas sabem que elas são abertas, que tem sempre um monte de gente nelas. Que todos podem entrar e sair a qualquer momento.
Aliás, a Beatriz não fala no texto dela, mas ela teve uma relação com um dos moradores. Não era um namoro, era um outro status, mas teve. E agora ela e a Laís vêm dizer que quem mora na casa do Fora do Eixo só pode ficar com quem é de lá. Como assim? Ela não era da casa e ficava com um morador de lá. Mas isso não interessava dizer. O que importavam era nos transformar em monstros.
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Como alguém pode ter guardado tanta mágoa e não se incomodar nem um pouco em mentir loucamente pra acabar com um projeto? Um projeto de vida. Sim, eu vivo no Fora do Eixo porque eu quero, porque gosto, porque tenho feito coisas que nunca faria se não estivesse nele.
Já li muitas vezes o seu texto Beatriz. Umas quinze, vinte vezes. E sempre paro no ponto onde você nos chama de escravos pós-modernos. Se alguém escravizou alguém nessa história foi você. Eu investi minha força de trabalho, trabalhei pra você sem cobrar nada pensando que éramos parceiras, que estava construindo algo pro cinema e pros cineclubes brasileiros.
Você tem coragem de dizer na minha cara que eu não dei um duro danado para divulgar o seu trabalho? Tem coragem de dizer na minha cara que não éramos parceiras? Tem coragem de dizer na minha cara que eu não fiz um plano de comunicação que levou o seu filme a ser exibido em lugares que ele nunca iria passar nem perto?
Eu adoraria poder te dizer um monte de coisas frente a frente. Se você é tão corajosa assim pra nos difamar, pra nos chamar de escravos, porque você não aceita um debate franco sobre o nosso projeto de cultura? Porque não expõe de forma clara sua lógica financista de cultura? Porque não diz claramente que se acha artista e que por isso tem que ganhar muito mais que eu pra manter seu status quo?
Beatriz, você poderia ser mais honesta. Poderia dizer que tudo que você decidiu “denunciar” não tem a ver só com o que fazemos ou com o que você diverge das nossas propostas. Tem a ver com outras questões subjetivas. E você misturou tudo pra tentar acabar com um projeto.
Você está sendo mimada e egoísta, Beatriz. Pense nisso. E como você tá dizendo que não debate com o Pablo, que tal debater comigo? Que sou apenas uma escrava. Uma escrava pós-moderna.

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Daniel Scandurra

 

parar de só tomar notas

O MUNDO NÃO SUPORTA MAIS O PENSAMENTO LINEAR

JORNADAS JUNINAS . CASO BEATRIZ . EXP FORA DO EIXO . PROTÓTIPOS . texto abaixo:

cineasta profissional?

hj o livestream é ponta de lança da cinematografia: laptops|telas de cinema: click|ato cinematográfico : fusão do on-offline analogico-digital (‪#‎viahipertextual‬, ‪#‎ruamenu‬)

ser artista é uma questão de consciência do uso dos meios q temos em mãos.
o vocabulário dos “ninjas” (guerra memética) é bastante atual. o dialogo|uso que fazem dos novos meios de comunicação (INTERNET) somado a imersão de uma consciencia de|em rede, mostrou ser uma dinâmica artistica muito frutífera.

o FdE está por tras da elaboração|propagação inicial do organismo midianinja, portanto é certo q tem algo interessante por lá, no meio dos zumbis. quantidades: esforços hipercoletivos e potencializados pela estrutura-internet-TECs; geram qualidades (midia ninja / aplicativos-processos-prototipos / ___________) .

parei de ler o longo texto de ‪#‎beatrizseigner‬ a partir dum trecho q mostra um problema crítico dentro de seu discurso:
a sua ideia da profissão Artista é um pensamento ultraPassado. (*ler o trecho a q me refiro no primeiro comentario deste post)

jogadores profissionais do mundo, caiam fora!
a bola ta na rua, é a rua, PELADA!

o FdE, se é Legal como ainda não esclareceram direito, tem o dever público de tornar-se um PROTÓTIPO (midianinja idem).

o primeiro passo, para além da questão transparência financeira, tem q contemplar a visão de signos|LINGUAGENS, tem q contemplar uma ideia mais aprofundada de abertura das estruturas do FDE (como funcionam os fluxos alí) para que a dinâmica interna dessa rede (palpável e não) possa ser discutida e consequentemente construída ainda mais colaborativamente do que se diz, open source.

há um clamor por esclarecimentos… há um clamor por PROTÓTIPOS nesse mundo novo, hipertextual (‪#‎aldeiaglobal‬?)…

‪#‎midiaNINJA‬ é (pode ser muito mais) um protótipo e o fora do eixo incubou-a, mas fora do eixo ainda não é um protótipo… será possível se transformar e transcender a ideia de marca ou pós-marca?

ponto crucial: até que ponto o FDE trabalha formas novas e até q ponto legitima o sistema político falido atual (dos editais públicos insuficientes)?

colocar-se como PROTÓTIPO para que outras experiências possam usar|dialogar e se espelhar|espalhar. para que a velha mídia não se refortaleça / pra não dar pano pra veja / pra ajudar a falir de uma vez quem está dificultando o fluxo das informações. PELA INTERNET LIVRE.

denovo: para além da que$tão planilhas o(s) FdE tem q se ocupar em conceituar a dinâmica estrutural que faz funcionar as engrenagens da rede (se existem essas engrenagens, de q matéria são?)
META:LINGUAGEM.
estimular a sociedade a pensar a utopia q significa não precisar mais de planilhas.

:

manifestos sobre FdE,
de dentro pra fora!
de maneira construtiva direta e reta.

.

já virou senso comum q vivemos tempos de mudanças radicais de paradigmas. o fde está incomodando a todos, dos felicianos aos cineastas, q bom. se ainda não temos uma resposta de como será a sociedade-internet é melhor começarmos a pensar e difundir a busca por protótipos.

texto em progresso, atualizado em 15/08 as 23h19

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Celso Athayde

CUFA

Fora do Eixo

Se querem falar do Fora do Eixo, eu respeito e entendo. Vivemos numa democracia e podem falar mesmo. Mas até aqui só escutei manifestações depressivas de quem não está com os caras nesse momento em que eles estão bombando. O que li até agora sobre esse assunto de mais interessante fui isso aqui . Lucidez e ponderação ajuda sempre

Texto de Ivana Bentes em resposta aos frequentes ‘ataques’ ao FdE.

“As pessoas me perguntam porque eu defendo o Fora do Eixo. Defendo porque conheço o Fora do Eixo desde 2011, quando foram os primeiros a reagir e lutar contra os retrocessos no MinC de Ana de Hollanda, defendo porque vi o trabalho nas Marchas da Liberdade em 2011, porque conheço as Casas coletivas e comunitárias, conheço as causas politicas que defendem e que são as minhas e as de muitos, conheço uma parte trabalho nas cidadezinhas do interior do Brasil e me encanta a diversidade e autonomia dos 200 coletivos que participam da rede.

Dentro de uma rede de 200 coletivos e 2 mil pessoas a verticalidade e centralização de “seita” com trabalho escravo é uma caricatura que criminaliza o comunitarismo e a economia informal e/ou solidária e moraliza uma opção de vida. Com portas abertas e postagem aberta no Facebook me pergunto porque esses relatos não vieram a tona antes da explosão e visibilidade do NINJA.

Uma questão (sobre a qual estou escrevendo) é clara. O fora do Eixo é uma afronta tanto para a VEJA e tudo o que ela significa quanto para certa “classe média artistica” com projeto individualista (projetos que são legitimos diga-se de passagem e complementares ao mundo das redes). Tem muito o que debater na nova economia e processos de desmonetização e de criação de experiência do Comum. Isso já esta acontecendo e não é de hoje.

Muita gente chegando agora no debate na vibe difamatória. Muitos “especialistas” em Fora do Eixo e em redes da noite pro dia, transformados em juizes, policiais e advogados. Eu não fui informada da existência do Fora do Eixo por um post denuncia no Facebook! E conheço pessoalmente também a Beatriz Seigner e a circunstancia que a levou a romper com a rede (profissionalmente e afetivamente).

Estudo, pesquiso, participo, apoio projetos do Fora do Eixo, busco entender o processo e “como” funciona. É dificil mesmo pra mim, pois é um processo complexo. Acredito conceitualmente e de coração aberto nesse projeto e se a “marca” ou o nome Fora do Eixo acabasse hoje e se dissolvesse, ainda assim a rede de colaboração e de afetos construida se mantem de pé. Essa é a força, a grandeza e a beleza do processo.

O que está em questão não é um cachê de 900 reais pago com atraso, nem uso de verbas públicas, nem muito menos a denuncia de que os participantes não gostam de ler nem de ir ao cinema e que não gostam de Arte e não estão nem ai para assinarem “sua” produção autoral. É o projeto de uma outra geração e de uma multidão que transformou precariedade em potencia. Estamos no meio de uma mutação e o Fora do Eixo esta pagando a conta de ter saído na frente e feito a experiência mais radical. Estamos abertos para o debate. Se não disputarmos esse processo ai sim já perdemos!

Essa é uma das lutas pela qual vale a pena. Estamos juntos!”

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Rafael Vilela

Casa Fora do Eixo São Paulo

Conheci a Beatriz Seigner em uma viagem que fiz para Belo Horizonte em 2012. Mas na verdade isso não importa muito..

Meu envolvimento com a Rede Fora do Eixo começou em meados de 2010, ainda quando morava em Florianópolis, capital com cara de interior, cidade pacata com bons amigos mas poucas atividades. Participava do DCE da Universidade Federal há quase 3 anos, estudava fotografia por conta própria e empurrava com a barriga meu curso de design para me dedicar a atividades que me interessavam mais, em geral todas fora da sala de aula – a faculdade atrapalha nossos estudos, é o que dizem. Era um momento interessante da minha vida, não posso negar. Tocava djembe – um tipo de tambor africano – tinha estágio “fixo”, dinheiro do papai, fotografava uns freelas e usava horas e horas da minha vida em dedicação exclusiva ao meu ego. Muito espelho, muito papo furado, muito eu, eu , eu.

Como muita gente que tá na rede, comecei com a música. Quando tava no DCE percebemos a enorme necessidade de uma cena independente em Floripa, falta de espaco pra bandas independentes e um público universitario sedento por conhecer novos sons e artistas. Resolvemos resgatar uma iniciativa bacana dos anos 2000, o festival UFSCTOCK.
Em poucos meses organizamos estrutura, comunicação e logística pra que dezenas de bandas pudessem se apresentar de forma livre nas praças da UFSC, tudo de graça, cerveja barata, todos contentes. Na sequencia fundamos o coletivo Cardume Cultural, eu com mais dois, e resolvemos convocar alguns nomes e experiencias culturais do país para debater e pensar nossa atuação na cidade.

Entre os convidados, um representante do Fora do Eixo, mais especificamente Talles Lopes, de minas, que passou 3 dias comigo e com a galera do Cardume, entusiastas do paradigma coletivo, conversando e tirando todas nossas duvidas inocentes de um coletivo em formação. Depois dele ainda passaram Atilio, Claudia e mais várias cabeças interessantes do circuito pela nossa casa. Uma frase do Talles me marcou profundamente nessa epoca: “A vida em coletivo é a fórmula da juventude” – acho que não envelheci um dia sequer depois disso.

O encontro acabou e seguimos nossas vidas, agora oficialmente como um ponto Fora do Eixo em Florianopolis, máximo respeito. Já chegava pra conversar com as pessoas sendo parte de uma das maiores redes de cultura da América Latina. Pra quem não sabe o que é capital simbolico ou acha que apenas que uma pessoa se capitaliza de uma construção em bloco como essa, afirmo: cresci em dias o que grupos demoram anos pra crescer em um lugar como Floripa. Capital simbolico é a capacidade de se empoderar, ser feliz e confiante sem precisar de dinheiro.

Passamos a receber inputs, tecnologias e formas de lidar com o coletivo e com a gestão da música, o que nos fez muito rapido repercutir – e incomodar – na cena local. Imagina, eu, que nunca fui um musico sério ou produtor ou qualquer coisa desse tipo, em menos de um ano agia e falava em nome de um coletivo que passou a ser um dos protagonistas da musica no estado de santa catarina. Com meses de trabalho duro a gente foi acessado até pela merda da Globo pra fazer a curadoria do palco independente de um festival coxa deles. E não falo isso como uma farsa orgulhosa, acredito que a capacidade de absorver o conhecimento coletivo e permanecer em um estado mental de que “tudo é possível” contamina e inspira todos em nossa volta. Participei de incontáveis papos e articulações onde o objetivo único era ter o interlocutor mais estimulado, empolgado, e disposto a seguir com os seus ideais, sonhos e projetos.

Nessa epoca ainda tinha poucas informações sobre a Casa Fora do Eixo São Paulo, mas logo senti a mística que a envolvia. Desde sempre rolavam os boatos que nela moravam pessoas bitoladas, que trabalhavam loucamente sem saber pra onde estavam indo. Ainda bem que nunca segui conselho de gente assustada. O que sentia na prática como um membro de coletivo novo da rede, nesse tempo, era um acompanhamento responsa da galera da casa, sempre muito próximos nas horas mais difíceis. Aí já dava pra começar a sacar os valores que pautavam o grupo: solidariedade, colaboração, dedicação ao proximo, formação. Aprendi a respeitar mais o corre alheio, e olhar menos pra o meu umbigo. Aprendi que não é o “onde” que importa tanto, mas o “como” – os valores e dinamicas que levamos adiante na construção do comum.

Do cardume pra Casa Fora do Eixo foi um processo. Passamos por uma imersão em julho de 2011 com umas 10 pessoas do coletivo. Foram dias intensos, módulos mil de todas as áreas, comunicação, música, banco, partido, universidade.. tantas loucuras inimagináveis se não fossem tão paupáveis. A imersão faz com que os coletivos se vejam em uma dinâmica alucinante de produção e trocas dentro da casa em fluxo, aprendendo no tete a tete as multi habilidades pra se gerenciar e construir a vida em rede. Nesse período fiquei muito marcado pela experiência e paciencia da Mariele, da Carol, da Lenissa e da Driade em dedicar horas e horas a cada um dos módulos, passando adiante todo seus acúmulos sem pedir nada em troca.

A imersão também faz sentir a dureza do processo de se transformar. Assim como a lagarta deve sofrer para fazer o musgo empoeirado virar aquelas asas coloridas, sair da lógica “escola-faculdade-emprego-carro-casamento-casa-filhos-netos-caixão” é dolorido. Migrar pra vida coletiva, sem salário, sem “carreira”, sem uma escola formal, com caixa e armário coletivo é pular fora do seu mundo e mergulhar de cabeça no novo mundo possível, que é nosso, de todo mundo.

Me orgulho de cada segundo imerso, já são quase dois anos fora do eixo e fora da zona de conforto, viajando pelo mundo e me questionando a cada dia como testar todos os limites do que já foi criado.

Vazei de Floripa como quem vai comprar um cigarro e não volta mais. Nada pessoal, tinha encontrado um novo rumo na vida, larguei faculdade, ex-namorada, tambor, movimento estudantil, praias, baladas. Amigos e familiares tiveram um delay de alguns meses, mas no fim me entenderam. Algumas semanas morando na casa fora do eixo sao paulo e assumi a frente de Poéticas Visuais do circuito, que antes de mim era tocada por uma designer incrível da rede, a Laura Morgado. Comecei a trabalhar com tudo quanto é fotógrafo, designer e artista visual, num processo completamente colaborativo que conectava coletivos pelo país inteiro em varias ações que envolviam lançamento de novos cds, ações de movimentos sociais, criação de identidades para projetos solidários espalhados pelo interior, cartazes, flyers, e tudo que é possível imaginar. Não lembro de usar valores nem cifrões em praticamente nenhum material.

Passei a fazer parte do famoso Caixa Coletivo. É tipo mudar de combustível – de um poluente pra um biodegradável. Você continua se alimentando, tomando banho, tendo os equipamentos que precisa, as roupas que gostaria de usar mas o que te move já não é mais o mesmo. A ânsia por ter cada vez mais e ser cada vez menos já não nos alcança. É trocar um modelo de salário, de acúmulo e de fetiche pelo pertencimento por uma vivencia comunitária, compartilhada em bens, serviços e afetos, onde o medidor máximo de sucesso é o FIB – a Felicidade Interna Bruta.

É impossivel imaginar alguem vivendo em uma casa fora do eixo que não confie naqueles que o cercam ou que não tenha tesão extremo no que faz. Não é o dinheiro, definitivamente, que segura alguém nesse processo. Também não é o medo porque qualquer um que absorve um pouco do que se passa ali dentro sabe muito bem que essas experiências são bem valorizadas no mercadão, ávido e necessitado de autenticidade e coragem.

Desde o segundo colegial tenho a fotografia como tesão e um dos grandes objetivos em minha vida. A fotografia de contar histórias, aquela que expõe, levanta temas e debate o mundo. Nada contra a fotografia contemporânea, o topo borrado da árvore, a abstração dos padrões já abstratos, podem ser até dar boas imagens, mas nunca me interessaram por sua capacidade narrativa ou intencionalidade política. Respiro fotografia documental, enfim, há mais de 7 anos.

Misturar essa linguagem com a bomba aceleradora de partículas que é o Fora do Eixo sempre me levou a experiencias incríveis. Não digo que foram espontâneas em todos os momentos, muitas vezes fui puxado pelo coletivo a me abrir mais, a ser mais humilde, a escutar, a aprender, a observar. Nunca fotografei tanto na vida até me aproximar do FdE. Passei a fotografar tudo que via, contar toda e qualquer história, cobrir festivais, circular com bandas em turnê, a fazer ensaios, retratos, editorial, institucional, moda, documentar colunas e viagens infinitas pelo interior do país.

A intensidade da vivência coletiva apurou minha leitura crítica do mundo, fiquei mais rápido, atento, sensível. Com o avanço da mídia fora do eixo para o laboratório do NINJA comecei a me defrontar, dia após dia, com a épica jornada humana. Viajei por dias nas aldeias indígenas do Mato Grosso do sul conhecendo histórias horripilantes da ação dos fazendeiros, pude ver de perto o terrorismo de estado no Pinheirinho, fui pro interior da Amazônia investigar a morte de um casal de ambientalistas, documentei o carnaval de rua de dezenas de cidades, fotografei em dedicação exclusiva cada uma das manifestações de junho e julho com toda sua intensidade, conheci o norte e o nordeste do país, conheci a Argentina, Venezuela, Bolívia, tantos outros países da Latino America, conheci a Espanha. Ainda acabei indo pro Egito: em missão especial fotografei a queda de um presidente eleito por 30 milhões de pessoas nas ruas, uma das maiores manifestações humanas da história. Aprendi alguma coisa de árabe, gastei meu inglês, me virei pra caraleo e nunca passei tanto medo na vida.

Tenho 24 anos. Não tenho dúvida de que fazer parte do fora do eixo foi fator decisivo pra estar aqui, escrevendo pra quem quiser ler, essas linhas tortas e sinceras. Assim como me possibilitou desenvolver uma linguagem própria na fotografia, aprender a antecipar situações, me envolver com contextos e personagens, conquistar confiança daqueles que fotografo e retribui-la com meu trabalho. Em suma, o fora do eixo encurtou meu caminho entre querer e poder viver fazendo o que sempre quis.

Nesse bolo todo assumimos um processo radical de autoria coletiva das imagens, por entender que não é impossivel, no processo criativo da fotografia e do jornalismo, entender qualquer atividade como ação individual. Quando estamos documentando qualquer pauta, chegamos com um ponto de vista que é fruto de nosso contexto, de nossos acúmulos, pesquisas, das relações e raciocínios que desenvolvemos em coletivo a partir de muito debate. A empatia com os fotografados, suas histórias e suas vidas é sempre um encontro de dois mundos, dois grandes indivíduos em diálogo, cada retrato tem 50% do fotógrafo e 50% do fotografado. Ainda, a edição, escolha do material final e difusão envolvem dezenas de outras pessoas. Toda estrutura e sistemas que criamos para financiar esse tipo de empreitada só existe porque muita gente se doa pra aquilo acontecer. Como, então, imaginar uma fotografia, fruto do nosso encontro com o mundo, pertencente a uma pessoa só, sozinha?

Quando nada é de ninguem, tudo é de todos e a gente voa. Parei de assinar individualmente as imagens que fazia e elas começaram a duplicar e triplicar sua capacidade de replicação.

Em 2013 estamos sendo convidados pelos principais festivais de fotografia do País, de norte a sul, para participar ativamente nas mesas e debates com nossa visão, assim como expor nossa produção nas exposições oficiais dos eventos. No longínquo 2011 eu era um frequentador anônimo, desconhecido e acuado desses mesmos espaços.

Mas o que diabos tem a Beatriz Seigner com isso tudo? Em minhas memórias lembro dela assustada, assim como bem descreve em seu post-longa-metragem baseado em fatos reais e em percepções distorcidas. Assustada com a autoria coletiva, assustada com pessoas que preferiam escutar ao invés de sair vomitando opiniões, assustada com gente que não precisa ter um salário pra ser feliz, com um projeto que não tem o artista como um gênio indomável, assustada, enfim, com os diversos paradigmas que um processo forte e necessário como o Fora do Eixo nos obriga a questionar.

Se ela pode vir a publico fazer um relato pessoal sobre o que é o Fora do Eixo eu também posso, com muito mais propriedade de causa. E que se confrontem nossas integridades e lastros de confiança. Desde que entrei nessa sempre coloquei tudo que tenho no processo de forma aberta, todos que me conhecem sabem a seriedade e dedicação que nutro pela rede e tudo que desenvolvemos até hoje. O texto de Beatriz é uma trama roteirizada com inúmeras inverdades – que deixo para serem pontuadas pelos mais analíticos em momento posterior. Cabe aqui a mim uma impressão do lado de dentro, de quem escolheu se envolver e se implicar no processo sem medo de ser feliz ou de se assujeitar.

O papel de vilão que Beatriz cria pra Pablo Capilé é covarde e desonesto. O drama que tenta imprimir ao Fora do Eixo só pode se supor real se partimos do princípio que todos que fazem parte da rede, com excessão de Pablo, são vítimas. Zumbis, mortos-vivos, insensíveis, que não admiram arte, que não tem bom gosto musical e são impedidos por um ente supremo de tocarem seus tambores.Tia, se liga, a gente troca o cineminha de quarta-feira pela incrível sensação de não saber onde vamos estar amanhã. Isso que você chama de previdência social e aposentadoria a gente chama de companherismo, confiança, construção comum, não é uma brincadeirinha de coletivo da faculdade, é uma escolha de vida. E, sinceramente, se tem gente que tá vendo pouco filme porque entende que mudar o mundo exige muito mais do que isso, é porque assim escolheram.

E que a cultura da publicidade lhe seja cara, Beatriz. Porque não dá pra olhar um ataque como esse, com timing perfeito – dois dias depois do maior pico de visibilidade do Fora do Eixo em sua história – com os olhos inocentes de um coletivo em formação. Fora do Eixo e Midia Ninja viraram temas de debate nacional. É certo e esperado que muitos dos que já estiveram perto queiram agora reacender sua luz a partir do brilho que reflete no suor de nossas testas. Faz parte do jogo. Nunca nos importamos em dividir.

E que coragem não falte para que venham mais relatos, e que todos busquem quebrar as máscaras do consenso, como fazemos todos os dias.

#vidaFdE
#midiaNINJA

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Rafael Andreazza

Advogado, produtor de cinema independente e professor de Produção Cultural da UFPel (Departamento: Centro de Integração do Mercosul)

Sobre as denúncias de Beatriz Seigner ao Fora do Eixo, pesquisei o que pude, sei que faltam informações, mas aí vão reflexões e dados. Como Professor de Produção Cultural e produtor independente de cinema estudo muito para tentar entender as questões do nosso tempo e meu único objetivo é pensar a cultura e os valores que ela gera. E nesse caso há questões importantes que vêm á tona, e apesar do texto ser longo, não se esgota a questão. Não vou discutir nenhuma questão pessoal nem bater boca com ninguém.
O filme Sonhos Bollywoodanos de Beatriz Seigner não foi realizado com dinheiro público, coisa rara no Brasil. Foi financiado por um produtor indiano e lançado em 2011 no circuito comercial de cinemas, em mais de 19 cidades brasileiras, distribuído pela Espaço Filmes, ou seja, muito bem distribuído.

Temos tradição de que poucos filmes brasileiros chegam ao cinema, e estar em cartaz em 19 cidades é um feito. Faça-se justiça em 2012 o número de filmes brasileiros que chegaram ao cinema passou de 100. Mas muitas vezes em única sala, por uma semana. Sabemos da dificuldade de distribuição e exibição de filmes brasileiros no próprio país e da hegemonia do cinema americano, em público e bilheteria, no mundo. Mas isso é outro papo.

Voltemos ao Bollywood Dreams.
Segundo o jornal O Globo, 30% da bilheteria era a remuneração da co-produtora indiana que pagou os custos de produção do filme, cujo orçamento desconheço. Mas os valores tangíveis, ou seja, os valores econômicos que o filme gerou, serão abordados adiante.

Quando Beatriz, segundo ela mesma, achou “o máximo” a ideia de distribuir seu filme nos cineclubes do Cine Mais Cultura, outros pontos de cultura, escolas, universidades, coletivos e pontos de exibição alternativos, que estavam conectados à internet nas cidades mais longínquas do Brasil, o que ela estava pensando? Segundo ela “na necessidade de democratizar o acesso aos bens culturais no país, e sei como é angustiante, nestas cidades distantes, viver sem acesso à cultura alternativa e mais diversas artes”. O valor a que Beatriz se refere é, portanto, intangível, ou seja, os valores simbólicos contidos no filme.

Mas Beatriz em seu texto mistura os valores tangíveis com os intangíveis e acaba por confundir a pessoa que lê seu texto de 6 páginas no Facebook. Eu li, e reli, com a certeza de que de uma forma geral poucas pessoas o fizeram. Não é tamanho de texto que se poste no Facebook, assim como esse, admito. Mas estou a refletir e compartilhar minhas reflexões.

Pergunto-me se a distribuição do filme no fora do eixo foi pactuada como PRODUTO COMERCIAL OU CULTURAL.

Antes de tudo, friso que pouco conheço do Fora do Eixo e que não conheço Beatriz.
Mas como indica Beatriz, o que foi tratado foi dentro da lógica da troca, ou seja, dentro da lógica do fora do eixo: “Com relação à remuneração eles me explicaram que aquele ainda era um projeto embrionário, sem recursos próprios, mas que podiam pagá-lo com “Cubo Card”, a moeda solidária deles, que poderia ser trocada por serviços de design, de construção de sites, entre outras coisas. Já adianto aqui que nunca vi nem sequer nenhum centavo deste cubo card, ou a plataforma com ‘menu de serviços’ onde esta moeda é trocada.”

Pergunta-se: Beatriz solicitou os serviços? Os procurou? Parece que não, ao que tudo indica, e creio que se tivesse nãoperderia a chance de dar maiores detalhes. Os elementos que tenho para pensar, leva-me a conclusão de que não foi pactuada nem exibição onerosa, nem distribuição onerosa entre Beatriz e o Fora do Eixo. Nem gratuita. Mas sim, uma parceria de troca.

A tentativa de aplicação da lógica comercial no caso da distribuição gratuita do fora do eixo me parece uma tentativa de insuflar os incautos, e favorecer quem vem perdendo prestígio. Há muitos interesses dos grupos midiáticos em conflito, nesses tempos de revolução digital. Sobretudo depois da entrevista dos representantes do grupo no Roda Viva do dia 05/08/2013.

Depois desse programa, vem Beatriz se colocar como partidária de democratização do acesso a bens culturais, defensora dos valores intangíveis que gera a cultura, mas só quando a convém: porque no seu texto, sem mais nem menos adere à lógica econômica, e centra-se nos valores tangíveis que geram a cultura. Isso não me parece correto.

Mas no caso Beatriz X Fora do Eixo, me parece, não é possível conciliar as duas coisas. E que essa conciliação dos dois valores da cultura – valor simbólico e econômico – é o que todos queremos. Mas digo que não é possível essa conciliação no caso, simplesmente porque não foi o acordado entre as partes.

O resultado é uma confusão sistemática das próprias intenções de Beatriz: ora o intagível, simbólico, ora o tangível, econômico. E nenhuma menção ao imenso trabalho realizado pelos integrantes do grupo de fazer o seu filme chegar gratuitamente aos mais diversos públicos, em todo Brasil.
Lá no meio do seu texto, em meio à poesia da cultura que chega nos excluídos – poesia do valor simbólico, aparece a poesia da moeda real – poesia econômica. Trata-se do caso da exibição pelo SESC de SP. Mas era o SESC, e não o Fora do Eixo, que estabeleceu relação onerosa para exibição do filme de Beatriz. Me chega o dado, de que a remuneração do SESC pela exibição foi de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais) pelo SESC de Baurú/SP e de R$ 435,00 (quatrocentos e trinta e cinco reais) pelo SESC de São Carlos/SP. E mesmo tendo recebido essa valor, acusa o distribuidor parceiro – o Fora do Eixo – de “tentar” apropriar-se dessa bagatela.

Acusa de tentativa de apropriação indébita, embora admita que recebeu o valor. Acusa um exército de produtores de sessões gratuitas que distribuíram seu filme. Ela reclama que demorou a receber do Fora do Eixo, eis o motivo da acusação.

Vem informação de que a sessão no SESC Baurú foi em 06/03/2012, e que a nota fiscal para pagamento foi emitida pela produtora de Beatriz somente em 05/12/2012 e que o SESC a pagou em 12/12/2012. Ou seja, a produtora de Beatriz, a Miríade Filmes, teria demorado 9 meses para emitir a nota. Se isso é verdade foi culpa da produtora, porque o SESC naturalmente dependia d emissão da nota para fazer o pagamento.
Da gravidade da acusação de Beatriz, se essa informação é verídica, há que se questionar a integridade do texto de Beatriz, e os interesses por detrás do texto. Certamente essas provas virão à tona.

O ponto que Beatriz ataca com suas acusações é o econômico, com alegações aparentemente concretas, mas, se bem analisado no seu longo texto, não fazem muito sentido. Na verdade, Beatriz toca no mesmo ponto que os jornalistas do Roda Viva no dia 5, o econômico, o que foi constrangedor aos jornalistas. Os dois jovens mostraram-se bem articulados e atentos a um momento muito dinâmico da história da humanidade.
Me pergunto por que razão a “denúncia” não veio antes do programa, que colocou o Fora do Eixo na pauta das redes sociais?

Ora que os jornalistas da velha escola não conheciam e nem conseguiam pensar o sistema que lhes era apresentado, como as motivações dos integrantes, relações não monetárias, tudo bem, pois para eles esse é um mundo desconhecido e sem lógica. Mas é real e contém uma lógica interna e própria, que precisa ser melhor explicada. Os jornalistas nem sabiam o que falar na entrevista e acabaram sendo informados pelos jovens. Poderiam ter estudado antes.

Mas Beatriz não. Desde o início entendia o sistema, ou podia entendê-lo, suponho.

Segundo Beatriz o Fora do Eixo havia prometido como contra-partida uma foto de cada exibição onde fosse visível o número de público destas, e uma tabela com as cidades e quantidades de exibições que foram feitas. Se é verdade, ela tem razão. Mas aqui não é dinheiro e é evidente que o Fora do eixo é uma superorganização espontânea, mas com problemas de organização, o que é compreensível, afinal a gênese do coletivo foi se realizando no caminho e de uma maneira bem tradicional brasileira: primeiro chegam as pessoas, depois a estrutura para elas. Mas nesse caso parece que as pessoas são a própria estrutura.

A organização da distribuição democrática de filmes brasileiros, valorizando seu aspecto intangível é a grande questão que Beatriz Seigner traz à tona, mesmo sem querer. E que é necessário pensar uma forma de remunerar todos na cadeia de produção, mesmo na distribuição de acesso gratuito. Beatriz, e todo produtor de obras culturais, quer remuneração por seu trabalho. E ao mesmo tempo quer chegar em todos os recantos do Brasil. É o que todo artista quer. Se criarmos um sistema para que isso aconteça, e os meios estão postos, todos sairão beneficiados: artistas, produtores/organizadores e sociedade.
Há no Brasil a valorização da exibição de cinema pago. E não é contabilizada para nenhum efeito, a exibição de acesso gratuito. Um método de contabilização deve ser criado para sessões gratuitas.

Mas ao que transparece no texto polêmico, não foi combinada remuneração, nem cessão gratuita, mas relações de troca. E essa história não foi bem explicada.

Mas vamos aos valores tangíveis do filme O Sonho de Bollywood, de Beatriz Seigner.
Sem o fora do eixo, o filme Bolywwod Dream – O Sonho de Bollywood teve público comercial de 6.105,00 nos cinemas, com renda bruta de R$ 60.561,00, segundo os dados oficiais do OCA, no site da ANCINE.

Passo a fazer suposições, com base na praxis do mercado: dessa renda de R$ 60.561,00 metade da bilheteria provavelmente ficou com o exibidor, menos os tributos. Então pode-se supor que aproximadamente R$ 30.280,50, na verdade menos que isso, ficou com o exibidor, e a outra metade, com a produtora de Beatriz, a Miríade Filmes. Supondo que a distribuidora do filme, que o levou a 19 cidades em 23 salas ficou com a comissão de distribuição em 20% que é a praxis do mercado, sem considerar o possível reembolso por gastos de publicidade que são retidos pela distribuidora, sobraria R$ 24.224,40. Desse valor 30% por contrato foi para o co-produtor na Índia, o que se conclui que, na melhor das hipóteses, sobraria para a produtora de Beatriz o valor bruto de R$ 16.957,08 pela carreira comercial no Brasil em 2011. Considerando que se havia contrato de reembolso à distribuidora com gastos de publicidade, pode-se supor que a produtora do filme, assim como a maioria dos produtores de cinema no Brasil, receberam nada, muito pouco ou até ficaram devendo. O co-produtor indiano teve prejuízo, no Brasil. Calculou mal, a Ìndia tem uma superpopulação de 1,2 bilhões de habitantes, tem público formado – que consome o cinema do próprio país e o ingresso custa R$ 0,70. Não sei como o filme foi naquele país e se pagou seus custos, mas gostaria de saber.

Do ponto de vista do impacto cultural, de pessoas “sedentas por cultura” como Beatriz tanto discursa, 6.105 pessoas assistiram seu filme no sistema comercial de exibição no Brasil.

Lembrando que Beatriz cobrou R$ 50.000,00 do Fora do Eixo para colocar a “marca” do coletivo no filme. E que fala em “superfaturamento” na contabilidade de pessoas.
Por fim, pergunta-se: Quantos cidadãos o viram filme no circuito fora do Eixo?

Segundo informação do Fora do Eixo, que disponibilizou tabela com os números https://docs.google.com/spreadsheet/pub?key=0Ar_2NN05blsRdFVvdW1uZGI1bkhFS0NfS0lqQTc0T3c&gid=0 o público foi de 1.463 pessoas no circuito gratuito, em 41 exibições, em várias cidades do Brasil. É quase uma quarta parte do público total. Não me parecem números superfaturados. Parecem bem verossímeis.

Estamos muito longe de uma economia da cultura para o cinema nacional, na janela tradicional de exibição pública coletiva, paga ou não. Mas temos avanços no sentido de democratizar o acesso ao cinema nacional: a Lei 12.485 , o Recine, proliferação de cineclubes etc. O Fora do Eixo também realiza esforços nesse sentido, como o fez no polêmico caso em questão. Isso não se pode negar. E se as contas dos projetos que propõe não foram rejeitadas, nada se pode dizer quanto à gestão de seus projetos. E se as pessoas voluntariamente levantam uma bandeira sem fins lucrativos, ainda há esperança.

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Lenissa Lenza

Casa das Redes

Acho engraçado como as pessoas falam de outras pessoas e de ações com tanta propriedade, conhecendo quase menos que a superficialidade delas. Dessa maneira, toda interpretação própria vai se tornando uma grande ficção com o risco cruel de ser a prova da verdade. Uma verdade PESSOAL com a esnobe pretensão de ser a verdade de TODOS. Uma atitude tão vil quanto se escorar na arte pra se achar iluminado detentor da verdade. E se teve algo de profundo teste pra minha própria superação de rancor, ao longo desses 11 anos de processo-vida coletiva, foi a existência de “artistas iluminados”.

Me lembro que bem no início do Cubo, coletivo que comecei minha trajetória pré fora do eixo em 2002, surgiram várias questões sobre como atuaríamos. Sem a pretensão de ter um plano mirabolante, só nos entregamos à pratica diária em conjunto, “depositando” tempo, desejos, angústias, problemas, anseios, estímulos, propostas e o que mais possuíamos individualmente, num caixa comum que fosse gerido coletivamente. Por sorte um de nós era muito visionário e também cedeu, num grande gesto de generosidade, seu particular “dom” pro coletivo. Os resultados dessa “salada orgânica de singularidades” apropriadas coletivamente, “ditariam” os próximos passos e assim sucessivamente. Isso se tornou premissa pra tudo: o laboratório, o experimento coletivo, em que nós éramos os primeiros “ratos do laboratório”, experimentando qualquer invenção que criássemos, sentindo e concluindo por conta própria, se era positivo ou não. Se formando a partir do empírico, do instinto, do afeto, da colaboração, da entrega e de qualquer visão que nos identificássemos ou elaborássemos. Desnudar-se de manter somente a elaboração subjetiva, teórica, pré concebida, fruto dos cérebros alheios e dos nossos próprios, pra concretizá-los em práticas de nós mesmos. Em vida. E assim, diminuir cada vez mais a distância entre o que se faz e o que se fala. Conselho sábio de Paulo Freire pra determinar um dos primordiais e principais elementos da nossa experiência: autonomia e liberdade.

O primeiro passo foi morarmos juntos num único lugar que seria nossa casa e sede, na avenida ipiranga 121, centro de Cuiabá. Pactuamos que tudo que cada um tivesse, seria colocado “na roda” pra gestão coletiva. A casa ficou cheia de mobília, tendo até alguns itens em “excesso” que “de cara” virou “salário” da nossa primeira diarista, super querida, politizada e sensível, “santa” Verinha. Alguns saíram do emprego, outros da faculdade pra se dedicarem exclusivamente ao coletivo. Eu mesma não saí da faculdade. Fazia Comunicação na UFMT. Não saí pra manter a negociação estável com meus pais, pois tudo que poderiam me dar era a formação que não tiveram. Nasci e cresci no interior de goiás. A faculdade em Cuiabá, aos 17, foi minha chance de “ganhar o mundo”. Mas tudo que eu queria era não precisar mais ir até lá. Não que a faculdade não tivesse sido importante. Foi. Até criarmos o Cubo. Depois disso ela teria perdido a sua função prioritária: me formar pra sobreviver. No Cubo eu sobrevivia me formando, o que me fazia muito mais sentido. Enfim, entre “trancadas e voltadas”, tratei de ver a universidade como uma estensão do coletivo e não o inverso, o que a tornou muito mais interessante, proveitosa e desejável.

Contextualmente, começamos experimentando o que cada um trazia de proposta em cima de seus desejos: núcleos de roteiros, filmes, eventos de música, gravinas, ensaios, rodas de violão, leituras coletivas, sessões de filmes e video games, reuniões em bares e restaurantes da cidade, bebidas, maconha, orgias, etc. Tínhamos 20 e poucos anos, nada a perder e tudo a ganhar. Arte e “ócio criativo” era o que não faltava na sede e nas vidas do coletivo. Inclusive, em demasia. Brincamos que foi a fase do iluminismo. E foi mesmo. Dali surgiu todo o início de um processo tão extenso, intenso e extensor que ninguém poderia imaginar nos seus mais audaciosos sonhos. Entretanto, só foi possível justamente por não parar ali, na arte, exclusivamente com fim em si mesma. O equilibrio teria que vir pra ser sustentável, continuado, perene, transcendente e enraizável. E tudo que queríamos, era continuar.

Percebemos a necessidade de levar cada vez “mais a sério” nossa experiência, enfrentando o paradigma de se sustentar num esquema padrão, com um conceito não padrão. Nos organizamos de modo a atender as necessidades estruturais e conceituais, nos desdobrando e aprendendo a exercer “funções” das mais diversas possíveis. Desde as intangíveis como mediar conflitos, estimular e nivelar nossas idéias, vontades e sensações, ser código aberto, transparente, compartilhar tudo o que tínhamos, engolir sapo, respeitar opiniões, ouvir, falar, “comprar” desgaste, criticar, auto criticar, ponderar, trocar, recuar, avançar, costurar, dosar, ser propositivo e etc; até as tangíveis como gravar cd’s, produzir, contabilizar, administrar, planejar, filmar, editar, desenhar, cozinhar, limpar, carregar, montar, sistematizar e etc. Buscamos agregar a maior diversidade de pessoas entusiastas para colaborar, se emponderar e participar do que estávamos construindo. Tudo que fosse necessário fazer pra manter e desenvolver o coletivo, éramos capazes de aprender, criar e mobilizar, independente das condições precárias e difíceis que tivéssmos passando. E que inclusive, se fez presente ao longo de todo o processo. Não foi uma nem duas vezes que não tínhamos comida, luz, água, telefone, internet, passe, gasolina, ou qualquer outro item básico pra sobreviver. Imagina reivindicar “salário” pra nós mesmos. Mas o desejo, a vontade e a disposição sempre falaram mais alto tornando a dificuldade em oportunidade de aprendizado, de desapego profundo, como aprender a tirar leite de pedra e valorizá-la mais do que achar que é “só um monte de pedra” pra atrapalhar o seu caminho.

A vivência coletiva não é nada fácil pelo parâmetro da vivência individualista. Já se imaginou morando com mais de 20, 30, acordando e dormindo todo dia, as vezes sem comer direito, as vezes dormindo no chão, usando as roupas disponíveis no armário comum, aprendendo a respeitar, compartilhar, amar e trocar com qualquer um que esteja aberto pra isso? Já se imaginou tendo que se abrir pra receber qualquer um que esteja afim de provar que tá aberto a viver isso, ainda que mil “pré conceitos” estejam ao entorno desse um? Ainda que não se saiba exatamente se é confiável e nunca vai saber se realmente não experimentar, não der a chance? Muito se fala em direitos, deveres, em princípios e valores nobres, mas duvido que muita gente esteja disposto a se superar pra exercê-los, mantê-los e continuá-los de fato. Se desprender de uma série de vícios mesquinhos, egoístas, egóicos, hipócritas, arrogantes, desleais, moralistas, preconceituosos e desonestos é tarefa pra qualquer um, mas não é exercitada por muitos. Especialmente pelos que costumam se “apropriar” da VERDADE, tornando-a absoluta e por um único filtro, é garantia de distorção dos fatos. Pior ainda é usar da “estética” pra se tornar um produto atraente capaz de credibilizar qualquer inverdade no seu conteúdo. Quando a arte começa a querer ditar exclusivamente a realidade, se torna a própria hegemonia, igual a tudo.

No início do nosso contexto, a música, em especial o rock, se tornou a frente “mais fácil”, não só por ser mais agregadora como por trazer mais “pedreiros” do que “artistas” exclusivos e iluminados. O audiovisual, arte da qual eu mesma iniciei meu processo “artístico”, trazia aquela sensação de “apropriação do coletivo” por precisar de várias pessoas e funções pra executar o seu produto. Porém, completamente vertical. O diretor como o chefe de todos sem nenhuma necessidade deliberar junto aos demais pra fazer o que quisesse com o “seu filme”. Na música pelo menos, se percebia de cara a necessidade de um compartilhamento, negociação e distribuição maior de decisões entre os integrantes sem que um “chefe” fosse o juiz maior. As pessoas do meio audiovisual, além de poucas, eram as mais difíceis de se agregar em torno de projetos comuns. Ainda mais pautadas na lógica analógica da película (caríssima especialmente pra Cuiabá) e da verticalização da gestão. Até mesma eu, uma amante praticante do audiovisual, fui “obrigada” a perceber isso na prática. E por mais que as pessoas tivessem paixão por esta arte, não conseguiam se empreender por muito tempo, continuadamente, com pouquíssimas excessões entre os velhos e novos medalhões do padrão. Quando decidi fazer o meu curta em digital, com pessoas não necessariamente “experientes”, fui considerada praticamente uma herege da sétima arte.

Não quero dizer que o audiovisual é detentor da verticalização e a música da horizontalidade. Nem que uma arte é “melhor” que a outra. Tô dizendo que as práticas em contextos variados formam resultados que nem sempre dimensionamos coerentemente e muitas vezes é preciso resignificar pra direcionar pro que acreditamos. Na música foi mais “natural” agregar interessados dispostos a colaborar pra uma causa comum e começar a história num padrão fora do padrão. Mas também vivemos muitas resistências para o investimento na própria cena musical (em tese comum a todos), em especial daqueles que queriam só tocar e receber o (alto) cachê com base no seu prestígio-subjetivo-intelectual-artístico-técnico-glorial. Mesmo que esse “prestígio” não rendesse em R$ o que ele “valia”. É claro que esse paradigma começa a ser um dos primeiros a serem enfrentados. O cachê dos músicos sobrepondo o custo das próprias plataformas necessárias pra gerar a rentabilidade dos músicos. Pra mim, isso nunca foi possível ser entendido. Como é que um músico pode ganhar qualquer coisa se não tiver um evento, um palco pra ele tocar, o público pra lhe consumir, a banca pra ele vender seus cd’s e todos os trabalhadores necessários pra fazer isso acontecer? E se todos esses itens necessários não conseguem ser custeados com o que se consegue levantar de recurso em R$, porque as bandas são obrigadas a receber um cachê? Justo as bandas que simbolicamente já são as mais favorecidas simbolicamente com a ação? São elas que ganham a fama, são elas que tem os holofotes, são a elas que a imprensa quer dar voz, são a elas que seu público se devota muitas vezes virando seguidor e propagador do que nem se conhece além das letras e harmonias musicais. Não existe público fiel de um produtor, de um técnico de palco, de um roadie, de um eletricista, de um montador. Eles não ganham capas frequentemente nos jornais pra auxiliar no portfólio, credibilidade e com isso poder aumentar a “rentabilidade”. Eles não tem a suposta “iluminação”. O produtor, além de tudo, é quem tem que assumir a dívida de todos eles, além da sua própria, sobreviver a isso e manter a continuidade dos eventos e palcos pras bandas continuarem a se apresentar sem custo nenhum. Nessa lógica, quem tá explorando os produtores são as bandas. E quem diria que com a queda das grandes gravadoras – as antigas “exploradoras” dos artistas que ganhavam mais do que gastavam “em cima deles” – fosse render frutos da lógica inversa: As GRANDES (auto declaradas) bandas explorando os produtores independentes. Não tô dizendo que as bandas ou qualquer outro trabalhador não tenha que receber pelo trabalho. Tô dizendo que existem contextos onde isso como “imposição” vira mais hegemonia verticalizada e autofágica do que justa, legítima e horizontal. Especialmente quando essa “imposição” é feita desconsiderando vários outros trabalhadores dessa ação comum que estão investindo seu próprio “trabalho” pra que tudo aconteça. Além disso, cachês e salários são negociáveis em qualquer espaço e tempo. Se não quiser, é só não fazer. O problema é berrar pros 4 cantos do mundo querendo “vender” a idéia isolada de que sem cachê, é desonesto. O Ladislau Dowbor pode dar uma palestra pra casa fora do eixo de quase 2 horas, sair dela conhecendo e conversando com todo o público que foi lá pra vê-lo, sem cobrar cachê (R$). Uma banda quase nunca.

Sem contar que o espaço cubo – e assim foi prática dos demais coletivos da rede – além de arcar com a “festinha” pras bandas mostrarem seu trabalho, cedia estudio de ensaio, gravação, serviços de comunicação, audiovisual, distribuição, produção musical, hospedagem solidária, alimentação, bebidas e etc “de graça”. E quando fez isso virar moeda própria, uma vez que era o próprio trabalho que também deveria ser “remunerado”, facilitando inclusive para as bandas “usufruirem” de tudo isso sem exigir o R$, virou alvo de piadinhas das mais cruéis possíveis e ignorantes na medida. Afinal, se alguém acha que o dinheiro não foi inventado pra medir e intermediar as relações de trabalho e produção, é um ignorante. O que a moeda social faz nesse caso, é justamente dar liberdade pra que o trabalhador possa trocar o seu trabalho com o que lhe interesse, sem a necessidade de fazer dinheiro primeiro pra depois custear o que precisa. Ou seja, mais óbvio impossível e ainda assim, tem “inteligências notáveis” que insistem em não entendê-la ou descredibilizá-la. Além disso, a moeda social facilita gerando um crédito a quem prestou o serviço para que depois possa pleitear o serviço de sua necessidade em troca. Favorece pra que as negociações entre as partes se estabeleçam com autonomia gerando uma relação de confiança. Auxilia a corrigir distorções de preço e valor, quando a necessidade sanada de cada um é o que importa na equação. No fundo, o preço é o que menos importa e sim, manter as trocas de necessidades que garantam a continuidade dos projetos e objetivos comuns. Essa é a moeda mais potente da economia fora do eixo e por que não da cultura? Se as trocas é a alternativa de todo mundo que faz acontecer sem ter dinheiro. A diferença é que sistematizamos isso pra de fato traduzir, dar visibilidade e potencializar essa economia. Engraçado é ver gente dizer que não usou os cards prometidos sem nunca ter enviado um mail pro card afim de fazer a retirada. Mais engraçado ainda (pra não dizer trágico) é ver gente se “assustando” com a tentativa de negociar logo no seu produto, em troca da distribuição em centenas de cineclubes no país. Realmente é assustador a capacidade de tantos trabalhadores serem muito mais generosos do que um, o principal interessado, o “artista”, sempre ele.

O mais triste é perceber que a prática do “artista iluminado” é de se apropriar de toda arte e cultura, desvalorizando os outros trabalhadores dessa história. Alegar que “falta de paixão” pela arte e pela cultura é não querer ver filme ou assistir a um balé, parece débil. Trabalhar dia e noite na construção de milhares de produções sejam elas de quaisquer natureza, ralando e muito pra conseguir fazer tudo acontecer de modo colaborativo, participativo, “cortando um dobrado” pra driblar a falta de grana que as próprias produções não geram, mas precisam pra serem custeadas, não é ter paixão nenhuma pela arte e pela cultura? E alguém vai se propor a bancar produções “só” pra aglutinar gente que não paga por tudo isso pra se “capitalizar” em cima, apostando na incerteza de patrocínios que sequer cobrem os custos das ações? E isso seria “se capitalizar” em cima de quem se não do próprio trabalho, cara pálida? Que mundo é esse que você vive? Mundo de alice? Eu é que fico chocada com esse tipo de alegação! Ou melhor, vinda de uma “artista iluminada”, depois de toda minha experiência com os “ditos”, nem me choca mais. Se o patrocínio só pagasse todas as produções que ele bancou + o salário próprio pelos resultados culturais que ele próprio gerou com essas produções, não seria mais que JUSTO. Mas a realidade amigo, é MUITO diferente da ficção criada no mundo de “alice”. Fazer produções artísticas e culturais, mobilizar pessoas tanto pra investirem nessas produções quanto pra serem expectadoras é muito mais difícil e suado do que pode supor a vã filosofia de “alice”. Aliás, sem dinheiro que custeie isso, só a paixão explica. Mas pro “artista iluminado” a paixão também é propriedade dele.

Se tem alguém que se capitaliza com a humanidade é o próprio “artista iluminado” que usa da expressão e conhecimento humano adquiridos milenarmente pra “forjar” uma autoria própria, botar preço e ganhar sozinho. Nada contra já que todos os outros trabalhadores “mortais” fazem o mesmo, porém, sem pagar de paladino dá “áurea” humana. E geralmente são esses os mesmos “artistas” que tem o cinismo de acusar quem luta pra que haja a melhor distribuição da sua “renda”, dos seus holofotes, do seu ego inflado, da sua “magia”, de golpista. Se a xuxa quiser ceder os filmes de modo gratuito e os coletivos fizerem campanhas pro filme ser consumido em troca de capital simbólico, NADA MAIS JUSTO. Ou o trabalho dos coletivos não merece nada, nunca? Quem merece é só o “artista”? No mínimo, a Xuxa estaria auxiliando pra uma melhor distribuição de renda, seja renda simbólica ou em R$. Mas o nível de distorção e oportunismo é tão grande, que os pequenos é que se tornam os oportunistas PREDADORES dos GRANDES. É pra rir? A maior ironia da história da arte é que ela principiou como algo subjetivo, capaz de traduzir expressões e comunicação, sensibilidade, mostrar culturas, se esbaldou de diversos conceitos pra mostrar que o humano estava além das relações de trabalho fordista, industrial, maniqueísta e hoje se vê intermediada por uma classe de “artistas” que se colocam como os próprios detentores dela, acima do bem e do mau, porém, não acima de um salário qualquer que se torna o próprio impeditivo de fazê-lo se expressar. Ou seja, se não pagar via o meio mais convencional possível – o dim dim, eu não me expresso. Grandecíssima independência e demonstração de humanidade. Outra grande distorção: querer “independência” de quem contribui de outras formas pra que você se expresse, pra ser dependente do dinheiro que qualquer um possa pagar. Nada mais “nobre”.

Imagine que você faz parte de uma rede de trabalhadores da cultura, multifuncionais em que ser artista é só mais uma das diversas funções valorizadas de maneira equânime que são distribuídas proporcionalmente ao que é demanda do comum, que investe a própria vida de modo integral e dedicado nas relações coletivas com milhares de pessoas e ações, que tem uma velocidade ímpar por muita paixão e disposição, por ser livre de padrões burros e mesquinharias que só te engessam e por se assumir num grande laboratório orgânico e vivo, disposto a colocar a sua cara a tapa, a prova, para o seu próprio aprendizado e o do outro num constante exercício interpessoal de trocas, desapegos, doação, generosidade, controle do ego e etc, criando uma inteligência coletiva. Imagine sistematizar tudo isso considerando as milhares de ações e pessoas de pelo menos 200 coletivos que se conectam permanentemente, além de cada um conectar vários outros parceiros nos seus arranjos locais. Sem contar que cada projeto do fora do eixo hoje, se transforma em novas redes com grupos e pessoas que participam de determinada ação e frente, mas não necessariamente são pontos fora do eixo. É redes em rede, em fluxo, contínuas e só tende a se expandir mais e mais. O fora do eixo é tão transparente que joga na internet centenas de documentos e planilhas em tempo real, construindo-as como um show “ao vivo” pra quem quiser acompanhar. São vários documentos que se tornam fontes pra compilação de informações a medida que surgem as necessidades. E sobre os números tão falados de movimentação da rede, percentual de recurso público e etc, já foram publicados sim. Faz tempo. Os balanços anuais de 2010 e 2011 (dados mais recentes) estão disponíveis há mais de anos no diário oficial fora do eixo e wiki fora do eixo. Se não sabem pesquisar, não acusem a rede de não ser transparente. Além do que, quero ver cada “artista” e/ou cidadão cultural aí abrir sua planilha e seu balanço anual pra que a gente possa conferir tim tim por tim tim como ele está gerindo o recurso público e PRIVADO. Pois além dos coletivos do fora do eixo serem os únicos cobrados de publicar suas prestações de contas públicas (cujo o próprio órgão público já cobra sob pena mínima de não ser mais patrocinado), ele é OBRIGADO a publicizar suas cifras de recursos próprios/privados. Isso porque somos uma rede de pequenos empreendedores culturais tão cidadãos quanto qualquer outro. Mas nos cobram “transparência” como se fôssemos o estado e remunerações como se fôssemos um monopólio do mercado padrão. É mole? Mas pra ter mais transparência, a mais infalível de todas, vá lá, confere, viva, participe, colabore, contribua, se aprofunde. Somos “reféns” da própria abertura de código pra ser modificado e desenvolvido nessa inteligência coletiva. Prova disso é tudo que já andamos e crescemos em tão pouco tempo e com tão pouco recurso financeiro. Nosso maior e mais valoroso ativo mesmo, é os recursos humanos.

Os pequenos coletivos do fora do eixo, depois de tantos anos no rala e se mantendo no rala, com toda a autonomia possível, no trabalho “frenético” como alguns gostam de “irradiar”, agora virou a organização mais rica do país, dependente de dinheiro público e dos partidos de esquerda. Isso porque, segundo os dados de 2011, cada coletivo gere a bagatela de 89 mil REAIS (desse total só 34 mil foram provenientes de recurso público), produzem a média de FdE$ 513 mil cards pra dar conta do recado. Quem investe 7% do total de um orçamento não pode apitar muito né? Além do mais existe um erro grande de achar que as empresas que patrocinam via editais a partir de renúncia fiscal e portanto, dinheiro público, podem interferir na autonomia de um projeto. Ela só tá transferindo o dinheiro do imposto que iria pro estado, pra um projeto cultural que ela viu e gostou. O máximo que ela pode exigir com isso é a prestação de contas. Os coletivos realizaram ao todo 2 mil ações no ano, com 85% de recurso via CARD, 8% via REAL próprio e 5% via REAL do poder público, foram pra cima da ana de holanda (ex ministra da cultura, do PT), entre várias outras iniciativas cujo o fora do eixo não concordava, seja de partido X, Y ou Z e recentemente impulsionaram a mídia ninja que foi a única a trazer realidades da PM (governo) imprescindíveis pra virar o jogo (que tava quase ganho) entre estado X sociedade no brasil, tornando notória toda a sua autonomia, independência e cidadania, favorecendo o lado mais fraco, o lado injustiçado, o lado fora do eixo. Se isso é ser dependente, ser desonesto, ser corrupto, ser submisso, ou ser qualquer lado “mal da força” nessa visão maniqueísta, moralista, preconceituosa, reducionista, falsa e hipócrita que tem de tudo, menos “espírito” humano, continuo seguindo sendo ainda mais feliz de ser um “espírito” fora do eixo.

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Ivana Bentes

A Critica que se faz ao Fora do Eixo e ao NINJA, que estão na linha de frente e no front dos principais embates e lutas atuais. é a de que poderiam (ou seriam) um “adaptador”, um “mediador” dos novos contextos. Mas o que faz para o NINJA ou o Fora do Eixo não virar um “adaptador da Multidão” ou um “captalizador” e “explorador 2.0” etc ? Ficar de fora tentando desqualificar o processo? Ou chegar junto e de forma critica disputar de dentro dos processos? Ficar de fora, julgando procedimentos, colocando regras, difamando as vezes. Ficar de fora desqualificando uma das bases desse processo que passa pelas próprias dinâmicas do Fora do Eixo ? Tentar destruir, difamar e desqualificar o Fora do Eixo?

O Fora do Eixo também é um experimento e processo , com dinamicas de centralidade, de adaptação e multidultinárias. Não conheço esse processo puro da Multidão, sem atravessamentos dos poderes e potencias. Vivi e experimentei processos extremamente centralizadores e adaptadores dentro da Revista Global e da Rede Universidade Nomade da qual fiz parte. Poderia fazer um relato muito mesquinho da minha experiência dentro desses dois grupos. Não o farei porque respeito os processo e limites e porque não tenho medo da potencia de cada um.

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Ney Hugo

Me lembro certinho de como me aproximei do Fora do Eixo. Aliás, de como me aproximei de um coletivo que seria um de seus membros fundadores, ainda antes do surgimento do do FdE. Participei com uma banda que eu tinha (completamente amadora, o começo de tudo) em uma prévia de festival, que dava oportunidade para bandas novas se classificarem para a programação ao lado de outras bandas mais conhecidas. Nesse ano que participei, 2005, a circulação e possibilidade de interação de novos músicos com bandas mais experientes ja era intensa e a programação do festival tinha nomes como Autoramas, Pata de Elefante, Vanguart, Forgoten Boys, Walverdes, entre outras. Da experiência, fiz em meu blog pessoal que só os amigos acessavam um texto bastante ácido e crítico. Num primeiro momento até acreditei que passaria despercebido. Tal foi minha surpresa quando fui muito amistosamente chamado para uma conversa e onde ouvi que de tão bem colocado o texto-crítica, ele serviu como elemento de reunião visando melhorias na equipe. Ou seja, o meu primeiro contato com o processo foi vendo o quanto era aberto, colaborativo, participativo e co-gestado. Por coincidência (ou não), o momento que me aproximei do coletivo era o mesmo momento em que a então recém concebida Macaco Bong passava por uma reformulação em sua formação. Em pouco tempo ja era integrante do coletivo e da banda.

Vejamos, à época, com 20 anos, tinha muitos sonhos e poucas ou nenhuma perspectiva de ve-los acontecendo. Gostava de música, mas não tinha grana pra comprar cd, curtia tocar mas não tinha grana pra um instrumento, curtia tecnologia e comunicação mas tudo o que tinha era um computador velho, comprado usado e internet 56k (só no fim de semana com o pulso único). Foi num domingo desses a 56k que vi que tinha as prévias e num outro domingo que publiquei o texto-crítica em meu blog. Dali então as coisas aconteceram muito rápido, como comumente acontecem ainda hoje, numa incrível velocidade que faz com que cada ano que passe seja o melhor da minha vida, e com a deliciosa sensação de saber que ano que vem será ainda maior, inimaginável.

De 2006 em diante o processo de formação de público do Macaco se confundia com o nosso papel de levar as ideias e tecnologias e compartilha-las com muitas cidades nos rincões do país. Um trabalho nem um pouco fácil, num mercado que àquela época, ainda sofria o caminho do meio entre a queda das grandes gravadoras e a estruturação e profissionalização do cenário independente. Como formar público com um som anti-comercial, pesado, sem refrão, sem letra, e cujos músicos não tinham a fisionomia padrão nem dos sonhos de Hollywood e nem de Bolywood Dreams?? E como convencer os jovens músicos, produtores, comunicadores etc dos rincões do país de que havia possibilidade e que um novo caminho se abria para todos eles, todos nós? Com a prática! Cada passo de circulação sempre foi dado com compartilhamento de notas musicais e de tudo o mais o que se tinha. Informação, tecnologia, know-how, caminhos, contatos, cartilhas, planilhas, planos, projetos, patuás. E sempre falamos a mesma língua, por sermos igualmente capiau, caipira, rústico e interiorano. Passa-se o tempo, e o festivalzinho de Cuiabá a cada ano grita mais rock e de passo em passo, apos mais de 10 anos, rola em centenas de cidades, algumas internacionais. Com um regulamento claro, que participa quem quer, muitos dos quais, não ligados ao fde. Será que sao mais de 300 escravos que se inscreveram? que tal perguntar pra cada um deles? não temos a assinatura de cada um, afinal, não queremos abrir uma legenda partidária. Mas cadastro online com contato para acesso imediato, sim. e isso que importa, na real. Manter-se conectado.

Umas das grandes experiências do Fora do Eixo é a radicalização na vivência coletiva entre aqueles que tem dedicação integral, ao ponto das relações serem totalmente horizontalizadas, desde a gestão política e executiva, passando pelos processos de empoderamento e chegando ao caixa coletivo, onde ninguém recebe salário, tampouco quantias divididas em partes matematicamente iguais, mas compartilham um fundo coletivo à disposição de todos para necessidades básicas coletivas e individuais. A radicalização do compartir.

Hoje em 2013, quem se relaciona minimamente conosco percebe claramente quais são os projetos em que a sua iniciativa podem se conectar, e sempre nos mantivemos abertos o tempo todo pra diálogo e debate. Portanto acho leviano proferir que “nunca viu uma tabela de serviços”, nem que nao viu “nenhum centavo do cubo card”. Há uma dificuldade muito grande de algumas poucas pessoas entenderem o tanto que usufuíram, e portanto, nao dão um pingo de valor no que é compartilhado com o comum. Valorizam as cifras.

Nos relacionamos de maneira orgânica, porque vivemos e não porque supomos. É engraçado pra mim ouvir alguém falar “se eu tivesse nascido em uma dessas cidadezinhas”, em tom de suposição, enquanto na verdade, eu sou de uma dessas “cidadezinhas”, uma chamada Cuiabá, onde morei por 25 anos (tenho 28).

Desde Cuiabá que bandas participam de festivais, turnês e inúmeros shows para centenas (algumas vezes milhares) de pessoas. Esse protagonismo era possibilitado através das trocas de serviços viabilizadas pelo Cubo Card, moeda solidária através da qual ja ali no processo inicial as bandas tinham acesso a ensaios, gravações, consultoria técnica e estética, aula de instrumento, discos, dvds, revistas, e até mesmo restaurante, vestuário e tatuagem. Alguns desdenham, mas o card sempre fez NA PRÁTICA a sistematização desse “dividir o que se tem”.

Fico imaginando, como seria se fôssemos cobrar o “direito de exibicao” de cada web radio, radio comunitaria, cineasta independente e afins que usou musica do macaco bong. Eu certamente teria mais dinheiro, e menos diálogo cultural com as “cidadezinhas” – e faço questão de manter as aspas pra demonstrar meu afastamento do tom pejorativo desse termo. Principalmente porque muitas vezes as ditas “cidadezinhas” sao referencias de vivencias longe do sistema opressor do “modelo de negocios” e da “propriedade intelectual”. Tem uns aí que querem privatizar o conhecimento, a sabedoria…

Tem um monte de gente fazendo transmissao, fazendo video e postando como ninja. E nao vamos cobrar os roaltys. é isso aí. é os remix das redes. nao vejo problemas em exibir videos que provam a inocência do reporter ninja preso arbitrariamente. Pelo contrario, o video da prisao de um midia ninja tinha mais que ser exposto pelo canal. Eticamente discutível seria o Bruno ter ido parar na prisão de Bangu porque pra fazer a denuncia no mesmo canal por onde o garoto foi preso seria necessário se passar os recursos pro “dono” do video. No tempo das inúmeros e velozes conexões das redes sociais, querem privatizar o compartilhamento.

Centenas de pessoas não ligadas ao fora do eixo continuam enviando emails, inbox, fotos e videos todos os dias para a midia ninja. Como poderiamos espalhar boatos anonimos, se desde o primeiro dia todos sabem que os ninjas somos nos? todos identificam os ninjas numa manifestacao. Se perguntarem quem é o midia ninja, pelo bem, pelo mal, pela crítica, pelo elogio, todos vão apontar: aqueles ali. No rio fizeram vigilia na delegacia e carregaram nos ombros um dos reporteres que havia sido preso.

Mas bem, voltando à vivência no mercado independente, vejamos, fiquei no Macaco Bong de 2005 a 2012, fiz cerca de 720 shows. Fizemos muitos investindo, muitos com caches dignos, a maioria no colaborativo, dois ou três recebemos em dólares e assim vivemos. Infelizmente tambem nao temos um catalogo de todos esse shows como gostaria. Com certeza há erros na trajetória, que levam aos acertos inclusive. Porém, alguns posicionamentos, se não fossem mau intencionados, poderiam ser uma leitura crítica da rede, uma análise/reflexão, que é o que a gente já faz, 24h por dia. O processo, muito mais do que o produto, é o que eu entendo como um compartir mais humano. Ir fazer muito mais que a arte. Ir compartilhar tudo o que se tem. ser ao mesmo tempo produtor da obra. e ao mesmo tempo duto do trocar de culturas. o significado de duto é que pode ser utilizado para ligar uma coisa à outra. o conteúdo dele depende do que vc coloca la dentro.

Chega a ser engraçado… enquanto tem gente que toma susto por não ter os centavos da passagem, tem gente que toma susto porque “nossa!, desistiram da proposta só pq eu pedi 50 mil”. Vejo que muitos ainda seguem a lógica noventista do artista. A do Artista Iluminado. A do ser divino com um papel messiânico sobre a terra, em detrimento do pensamento de que o artista é um trabalhador como outro qualquer.

Sim, trabalhamos pra caralho, somos focados no bagulho. Mas tenho certeza que de nenhuma outra maneira teria visto tantos shows na minha vida… tanto de bandas novas quanto alguns crássicos. nunca teria viajado para tantos lugares, e nunca teria tocado para mais de 10 mil pessoas. ouço música o dia inteiro, leio (até gosto de livros, mas tenho preferência pela oralidade dos Mestres), ando de bike, faço um som e jogo futebol. no teatro eu nao vou, pq prefiro o teatro de rua. vejo muitos tb. Alguns deles construídos em parceria. ja ta tudo ali, a vivencia, o trabalho-vida é poder acender o banza no meio do trampo a hora que eu bem entendo, e não naquela lógica depois das 18h, qdo se bate o ponto, e se encerra o trabalho: “pronto, agora eu vou viver. Quem sabe ver um filminho…”

Alem disso vivemos a autoralidade coletiva. quem está em uma casa fde sabe que nao vai precisar apresentar um portfólio de suas fotos, texto, vídeos, ações, produções pra conseguir um freelazinho, pra suprir suas necessidades básicas e comprar seu prazer. E sabe que, enquanto coletivo, a mesma autoralidade coletiva que ele doa pra rede volta 2 mil vezes mais. vc coloca a sua força na autoralidade coletiva para uso de duas mil pessoas. E 2 mil pessoas colocam sua força na autoralidade coletiva que você pode usufruir. é matematicamente impossível sair no prejú por não ter “assinado uma criação”.

Grave nao é estar no mesmo “precariado cognitivo” pelo qual passa o nosso povo. Grave é consumir produtos artísticos desproporcionalmente para ter um olho e virar rei na terra de cego. Uma lógica um tanto quanto esquizo: Enquanto uns tem oportunidade na vida pra ler e assistir do bom e do melhor e se tornarem a “elite cognitiva”, o caipira da “cidadezinha” só consegue ter acesso ao cineasta que cobra 500 conto num skype. Isso sim é que é escravidão. Racismo cultural.

Acho que tem gente que precisa entender que na realidade do Brasil existem muitas pessoas que não tem fundo de garantia. Nós preferimos viver bem com pouco, viver sem salário e sem luxos, porém com muita dignidade e felicidade, compartilhando o que se tem. É o mesmo caso do precariado. Eu prefiro estar nesse precariado institucional, sem FGTS, tal qual a realidade dos que estão à margem.

Recebo com muita empolgação cada um desses momentos de tanta exposição, visibilidade e debate. Quando se parte pra um debate franco, se sucede uma clara polarização. Fica insustentável para os inertes se manterem em cima do muro. E é ótimo que as pessoas assumam suas posições, que deixem claro o lado em que estão. A franqueza é sempre melhor que a dissimulação. Tem um monte aí que paga de amigo, fala nas costas e tiram as máscaras nesses momentos de polarização. É ótimo saber quem é quem.

Estive algumas vezes com a menina Beatriz, dentro de uma mesma casa. Nunca conversou comigo. Nunca apurou de maneira honesta e digna as informações que queria passar pra frente. Nunca me puxou um papo nem que fosse pra falar sobre arte, pra perguntar como era tocar no mesmo palco do sonic youth, do queens of the stone age, pixies, tortoise ou mudhoney. Ou como era fazer um som com o Gilberto Gil e a banda de pífano Princesa do Agreste, de Caruaru.

E ela jamais me perguntou como era ser interiorano, como era ser de “cidadezinha”, nunca me perguntou como era ter uma banda, e como se conseguiu circular tocando, fazendo show, fazendo arte, por todo o brasil, a partir de uma cidade que de tão anônima e quente, o Brasil só ouve falar na previsão do tempo. Me chamar de escravo dentro dessa conjuntura e inventar um mar de lorota, pra mim, é o que mais representa a total ausência de comprometimento com a verdade, com a pesquisa, com a acuidade dos dados e fatos.

E ao contrario da escravidão por dívida, as pessoas podem sair da casa fde o momento que bem quiserem, sem precisar pagar uma “dívida” ao caixa coletivo. Teve quem saiu com a boca e a barriga bem cheinhas. Lançado o desafio: entra numa casa fde e veja se tem alguem ali que ta em péssimas condicoes, mal tratado, triste, querendo ir embora sem poder. Eu particularmente entrei nessa justamente por fugir apavorado de ter que ser um médico, advogado, empresário, polícia… Acho bizarro a colocação de que alguém se torna artista a partir da frustração por não ter conseguido ser um grande empresário.

Falando muito sério é uma afronta enorme pra mim enquanto um aprendiz griô ser chamado de escravizado. No meio de toda essa trajetoria de ancestralidade, ouvir branquinho me dizer que sou escravo, que estou escravizado por dívida ao caixa coletivo, só porque eu prefiro a vida compartilhada radicalmente – o que inclui os recursos financeiros – do que um salario. Isso sim é que dá processo. Se todxs xs negrxs do fora do eixo partirmos pro arrebento contra esse tipo de falácea quem falou iria engolir bem sequinho. Não aceito ser chamado de escravo, principalmente quando vem de quem vem. Me reúno cotidianamente e organicamente com a frente quilombola, que tem advogados e jornalistas que denunciam, investigam e lutam contra o trabalho escravo. Tenho certeza que dariam risada diante da sugestão de “investigar a escravidão no fora do eixo”. Há muito por fazer. E quem não carrega a vivência da dor da opressão, não tem a mínima noção do que é escravidão. “Meu Deus, como classe média sofre nesse país.”

A mesma que me chama de escravo, desdenha da comunicação das redes sociais, dizendo que se não fossem por esses meios, a divulgação não aconteceria nas mídias tradicionais. É claro que não! A proposta de distribuição audiovisual (por exemplo) que acreditamos não é similar à globo filmes. Um viva às redes sociais. Eu adiciono quem eu quiser numa rede social. E só me aceita quem quiser. Justo!

Eu vejo como boçal a ideia de que precisa-se “levar cultura para a periferia, para a “cidadezinha”, como se essas ja não tivessem a sua propria cultura. A proposta é intercambio e comunicacao, e nao “eu, cheio de conhecimento, artes e pompa, vou levar arte pra vc, periférico”. Vejo como verdadeira afronta à periferia e aos povos originários a subestimação de sua cultura a partir de ditames acadêmicos. É bem coisa de quem pensa que a faculdade é o único lugar onde se obtem conhecimento. A máxima eurocentrista. A cultura não pode estar jamais submetida aos canudos.

E portanto, vejo como muito torto esse papo de “eu quero sim ajudar a “cidadezinha”, mas é quinhentão o skype ta?”

500 reais por um skype é uma coisa que deixa chocado e me assusta muito. Eu penso de outra maneira, penso no artista igual pedreiro. O que constrói. Me assusta igual a propriedade intelectual ser pensada como “crédito paypal” para escolas, universidades e pontos de cultura. Querem privatizar o conhecimento. É isso que é desenvolvimento humano? eu sou um adepto do conhecimento livre.

Agora ha pouco na manhã fiz um skype com um fórum de jovens no Cabo Verde, onde a “cidadezinha” sofre com instabilidade na rede elétrica que impossibilita muito do acesso à tecnologia. No meio de nossa video-conferencia aconteceu um dos apagões. Pergunta quanto cobrei por esse skype… se pudéssemos investir pra estar la presencialmente, era o que eu mais queria. Não deu. É uma pena. Não temos toda essa grana que acham que temos. Zé povinho ainda não entende o valor da cultura enquanto intercambio entre os povos, e recai no “modelo de negocios” que o “enobrece” enquanto artista que confeccionou um produto, seja esse um filme, um disco ou um espetáculo ao vivo em turnê. Não é de hoje que surgem os paladinos da justiça, de moral e razão perfeitas, nobres, que acreditam estar cumprindo dever público.

Dever público é compartilhar o que se tem, meu irmão. Mesmo com todos esse shows, mesmo tendo tocado no mesmo palco que Rage Against the Machine, Iggy Pop, Sonic Youth, Pixies, mesmo sendo instrumentista de um disco que foi considerado o melhor lançado no ano por uma revista musical respeitada: não cobrei nem um real por esse skype. Se houvesse viabilidade, investiria pra estar in loco. O papo foi ótimo, o feedback é que estamos juntos, conectados na busca por uma nova sociedade possível. E os indícios ficam cada vez mais evidentes. Aqui no Brasil, o ser humano ta na maior fissura. Tem gente desesperada. Ta cada vez mais down no high society.

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Aderbal Ashogun

Nasci em uma comunidade de terreiro na Bahia sou um Ogã ,mestre de cultura tradicional dos povos de matriz africana , no ano de 2012 em cima da cúpula dos povos, tinha arrumado uma casa de caboclo, pois tinha pleiteado que os povos de matriz africana tivesse seu protagonismo na luta pela ecologia e cultura na cúpula dos povos na Rio + 20, consegui uma tenda enorme , 12 onibus, e passagens para participação do meu povo neste importante evento que tinha como participantes megas ongs, que contavam com uma estrutura para realizar suas ações, apesar de ter conseguido todo apoio eu não sabia como produzir, uma professora muito diferente que deixa a dita extensão falar e nos olha com admiração, seu nome Ivana Bentes mulher forte , o que parecia mais uma burguesa bem vestida se tranformava em uma defensora dos conhecimentos extra academico , fiquei espantado, mais meu filho Ronald Duarte falou “ela é assim mesmo um furacão!!!!! esta mulher me apresentou ums meninos e meninas,foi ai que conheci umas pessoas que estavam sempre disposto s a fazer de forma colaborativa qualquer coisa, fizemos uma cúpula dos povos maravilhosa, com participação de 600 lideranças de matriz africana das 05 regiões, logo em seguida começamos a produzir de forma constante como nunca tinha produzido, fiquei tentado a conhecer mais este grupo, fui a Casa deles em SP , quando cheguei , me chamou a atenção aquela organização que se parecia com uma comunidade de terreiro, todos trabalhavam em tudo acordavam faziam o café , depois lavamos a louça , fomos comprar o almoço, que me candidatei a fazer e me disseram vai ai do lado no mercadinho e pega fiado que pagamos depois , comprei mocotó , botei no fogo e logo o cheiro atraiu mais jovens em volta da cozinha, conversando comigo, o mocotó ficou pronto e comemos juntos e voltei a ficar observando o ritmo frenétco da produção , um flyer que me diziam levar dias para ser feito , um chamado Pira fez em dez minutos, comecei uma conversa com um negão de sorriso facil, que logo me identifiquei era Ynaiã Benthroldo logo me vi diante de uma nissei super bonita e competente era Carol Tokuyo no Rio tinha conhecido outro gente boa eraCaiubi Mani , em SP me senti em familia , primeira vez que vi um coletivo abrir as portas de sua casa para um desconhecido de forma tão inocente , fui dormir em um quarto coletivo, como nos terreiros, o outro dia conheci um que parecia o mais velho Pablo Capilé depois começamos a conversar, ai pude ver como os meios produtivos excluem e pasteuriza as culturas, Capilé me falou dos projetos e como poderiamos fazer para potencializar as ações dos povos de terreiros, propomos formação , articulação /comunicaçãao e fomento depois de um ano estamos com o mapeamento da rede afroambiental terminada, curso de extensão em parceria com a UFRJ , percusso em defesa da diversiade cultural parceria coma a Agencia Solano trindade, estou escrevendo para dar meu apooio a este coletivo que se tornou minha familia, pois na minha cultura os jovens e os sábios (velhos) tem sua importância, bem escrevo para dizer que apoio e repudio este linchamento e discriminação de formas de convivio coletivo , bem meu recado é continuem fazendo e nnao dê atenção a estes pelegos que nnao levantam sua voz contra esta imprensa FDP que trabalha com a miséria humana.Fora do Eixo somos todos que estão a margem desta merda toda que esta ai posta.~!@#$%&*()(*&%$#@!~!@#$%&*()_)^(*&%$#@!~

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Marielle Ramires

Casa das Redes

Meu nome é Marielle Ramires, tenho 33 anos, e ajudo a construir o Fora do Eixo desde sua fundação. Vi e vivi a fundação e lançamento de tantos projetos que para nós foram zonas autônomas temporáreas importantes e que nos fizeram a chegar até aqui.

Para a rede, a cultura é e sempre foi comportamento. A maneira de “fazer, viver e criar” dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, ou em outras palavras, a maneira como articulamos nossas formas de se relacionar e fazer políticas; as formas que optamos em gerar e administrar abundâncias; as múltiplas possibilidades de formação e produção de conhecimentos; a comunicação e suas múltiplas maneiras de se comunicar; a arte e as multifacetas do fazer simbólico.

Quando o Fora do Eixo iniciou suas atividades no início de 2006, eu estava lá. Vi e debati o nascimento das três premissas que seriam as políticas originárias da rede: a circulação de artistas, produtores e jornalistas; a distribuição de produtos culturais; e a produção de conteúdo com metas de promover a divulgação. Era um tripé de ações simples, em que o objetivo era desenvolver os arranjos que compunham a cadeia produtiva das culturas locais com metas de promover processos autogestionários, em que os envolvidos nessa cadeia pudessem viver de um circuito autoral, e sobretudo, que pudessem “viver daquilo que gostavam” de fazer. Sempre foi, desde sua gênese, a busca pelo “trabalho desalienado”, em que o ofício não precisa necessariamente ser sofrimento, sacrifício, e sim construção autoral em que o instrumento trabalho é usado para transformar realidades. Foi assim que soluções e tecnologias genuínas foram criadas. Assim surgiu, por exemplo, o card, por exemplo.

“Desmonetizar” a economia foi a forma como a cultura encontrou há anos, antes do Fora do Eixo, para criar processos viáveis de produção. É prática comum no setor cultural o mutualismo, a relação de trocas a partir de escambos de serviços e produtos, ou mesmo a ajuda ao outro – a tal “brotheragem” (vem da palavra brother em inglês, termo comumente usado no setor da música independente).

A riqueza desse novo olhar sobre a questão é racionalizar a relação, evidenciando a capacidade que essas forças de cooperação tem em gerar e distribuir riquezas, sem, na maior parte das vezes, o envolvimento de dinheiro. A capacidade que os projetos possuem em estimular esses escambos ou levantar doações a partir das trocas ou práticas voluntárias é a “moeda complementar” existente nessa economia, que movimenta inúmeros processos culturais dentro do setor. Sem ela, ouso dizer, a cultura brasileira, em sua abrangência, se moveria numa velocidade muito menor. Pensar nessa perspectiva, pelo menos ao meu ver, é motivo de plena esperança: primeiro porque a história oficial contada sobre a economia da escassez cai por terra como falácia diante dessa matemática, como bem já conceituou a ‘Economia Solidária’.

Foi assim que surgiu o nosso card: tínhamos meios de produção criados na “sevirologia” (fazer se “virando”, mesmo sobre condições de precarização) – estúdios de gravação, ensaio, serviços de assessoria de imprensa e uma gama ampla de serviços para trocar por outros na ausência do Real. Estrutura simples, por vezes precária, sim, mas que realizava e ainda hoje realiza e gera produtos e processos, e milhares de laboratórios, incontáveis, que forma tecnicamente e emocionalmente uma geração de jovens que poucas opções tinham frente aos modelos de produção e consumo que o mercado hegemonicamente oferece.

O avanço da experiência econômica sistematizada pelos coletivos culturais foi trazer o elemento novo de considerar e narrar que nessas relações de troca existiam uma economia potente, pujante e da abundância, que sublinho, ao contrário da lição que todos os dias a “economia formal” nos ensina.

O curioso nisso tudo é que diante dessa lógica, desde o começo do processo, convivemos incessantemente com pessoas das mais diversas fazendo “troça” da moeda. “Dá um card aí pra eu comprar um galão de água”, li numa timeline dia desses em tom de deboche; “Quero ver o card pagar luz ”. Quantas vezes fomos forçados a sublinhar que o Card era moeda complementar! Complementar! Os envolvidos, por exemplo, ao fazer uso da moeda, não páram de gerar Real $ de outras fontes de recursos. Eles passam só a ter outras opções para fechar a conta da autogestão no fim do mês. E quer saber? Nunca gostamos de ter que ressaltar isso. Sempre achamos que ter que explicar desse modo, que era moeda complementar, era jogar o projeto para um campo mais de “direita”, afinal, como bem já falou o Capilé, complementar para gente é o Real (R$). Para nós e grande parte do setor cultural do nosso país.

Só sei que se chegamos até aqui foi por conta dele. Foi ele que possibilitou com que cada um de nós, construtores dessa parada, estivésses aqui, apostando vidas nessa construção. E não me refiro só ao card movimentado a partir de trocas não, mas sobretudo, o card fruto de um financiamento colaborativo que muitos parceiros injetaram e injetam com poucas a muitas horas de trabalho solidário investido: seja trocando ideias e ajudando na ampliação de repertórios; seja divulgando a rede; ou mesmo doando roupas, comida; apoiando moralmente nos mais diferentes momentos duros que já vivemos em nossas trajetória, entre tantas outras coisas. Tudo isso é recurso nessa economia.

E antes que falem que sou eu sou uma maria ninguém sem personalidade (com todo respeito às marias), desqualificações (no plural sim) com que me vejo obrigada a lidar há anos, reforço aqui que não é do Fora do Eixo que estou falando, ledo engano de quem pensa isso. O Fora do Eixo foi só um eventual nome necessário pra simbolizar esse projeto multifacetado que criamos, e que do mesmo modo que optamos por abrir mão de salários, apê, carro do ano, etc, em prol de uma vida comunitária, desapegar dessa marca é coisa de “dois tempos”. Não é atoa que falamos há anos em pós marca.

Continuando, estou falando aqui de projeto político de transformação de sociedade. Eu sonho em viver um mundo justo desde os 10 anos de idade. Vi e acompanhei o Lula perder a eleição de 89, me emocionando junto ao meu pai, sem nem entender direito os meandros políticos do que aquele momento representava. Só queria, dentro de uma visão até cristã, que fosse possível vivermos num mundo mais de todo mundo. O que me motivou a estar junto nesse conjunto de coletivos foi acreditar que como outros muitos de outras gerações, que poderia também dar o meu quinhão também nessa rEvolução história.
Vale sublinhar, para que ninguém venha se vitimar de “desavisado”, que NUNCA escondemos que a política era a nossa motivação. A rede nasce como uma atitude política, se articula a partir de desejos políticos de criar rotas alternativas de produção cultural que gerasse sustentabilidade a um circuito até então invisível no país. Em acreditar no óbvio, que o Estado tinha o papel de co-formular junto com a sociedade, políticas culturais abrangentes. E a política, a que me refiro aqui, é aquela bradada pelo Bertolt Brecht em seu memorável “Analfabeto político”: “(..) O analfabeto político é tão burro que Se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política. Não sabe o imbecil, Que da sua ignorância nasce a prostituta, O menor abandonado (…)

Sobre os erros e acertos, esse é outro importante a falar aqui. Nós NÃO SOMOS UMA EMPRESA. Nossos LABORATÓRIOS, como desde os nossos primórdios sempre fizemos questão de classificar, é realizado em cima de erros e acertos. E a partir disso é que se constrói tecnologias sociais a partir dessa proposta empírica. No é atoa que vivemos num ritmo de caldeirão de pressão todos os dias: porque para um processo que ousa tanto, errar pode significar perdas muito grandes. No mínimo, muitos dedos-apontados-na-cara, como estamos acostumados a lidar. Mas o fato inegável é que em uma rede de muitos, meu amigo, sinto informar, errar é algo que vai estar presente na matemática. Esse é o preço do processo colaborativo (vida a entrevista do Paes para o NINJA). Ser só é realmente mais fácil. Mas sou do tipo que prefiro estar junto a uma multidão, que recursa o medo. Vale dizer também que ter um monte de casamentos (cada pessoa com quem você divide uma casa é alguem com quem se é casado) é algo que demanda disciplina, comprometimento, coragem, firmeza e culhão. Porque vou te contar, para conviver com 30, dormindo e acordando todos os dias, tem que ter muito boa vontade: para querer avançar nas limitações pessoais, tem que ter disposição para ser paciente, e sim, aprender a comprar desgastes, aprender a franco (coisa difícil para a maioria, viu?), “abrir os códigos” para permitir a interação orgânica com o outro; avançar; ser generoso; etc. Dentro do Fora do Eixo, não existe fofoca, e cito isso, para sublinhar que o efeito dessa política laboratorial não é pouca coisa, pelo menos eu acho.

Sobre o Pablo Capilé, um dia vão entender que ele “aparece” como “aparece” não é porque ele “adora se mostrar”, ou é “um mandão-ditador” como tentam a todo o custo desqualificar. Pablo Capilé é uma grande liderança da nossa geração. É um cara que consegue despertar muita gente do transe da descrença, do medo e cinismo que todos os dias nos servem em doses homeopáticas de notícias na tevê, páginas nos jornais e em tantos outros meios. Já disse isso em outra ocasião e repito: medo e descrença são formas de dominação. E sinceramente, para mim, além do Fora do Eixo, esses são elementos que na nossa sociedade precisamos desconstruir. “Otimismo” é ato subversivo. Quem me conhece sabe que acredito piamente nisso.

No mais, eu sinceramente fico pensando que no meio dessa agenda de Brasil que estamos vivendo, pós junho/2013, porque não estamos debatendo essas formas de economia sem criminalização? Porque não somamos esforços para o debate da democracia de comunicação, para superar essa máquina de construção de paranóia que nossa sociedade se meteu? Porque não debatemos qual a Reforma Política queremos? Porque não ousamos separar o debate mesquinho do debate construtivo? Entre tantas outras agendas importantes. Será que vai demorar tanto tempo assim para compreenderam o que representou aquele Roda Vida da última segunda-feira (05/08)?

Daqui a pouco, quem aparece para dar as caras e contribuir para ajudar a “aclarar” esses pseudos-escândolos é a Veja, a Folha e outros tablóides que se apropriam muito bem de pautas das quais eles tem amplo interesse. Afinal, desqualificar inclusive iniciativas como o Ninja, em pleno ano de pré-eleição, em que precisam anular forças progressistas (sim, o Fora do Eixo é uma delas), pode ser um bom negócio, certo?

Tem tanta coisa que ainda preciso falar, mas se continuar me alongo demais e corro o risco de ninguém ler. Deixo aqui a promessa que esse será só primeiro artigo de uma série que farei sobre essa ‪#‎VidaFdE‬. Sei que temos um debate longo pela frente à enfrentar, e sempre tivemos muita disposição para ele. Espero que para o bem do avanço de vários processos coletivos, que nos pautemos mais no debate sobre metodologias e conceitos, e menos em passionalidades, “paixões mal resolvidas” e visões mesquinhas. Críticas são sempre muito bem vindas. Mas que sejam feitas com o respeito que merecemos. Avante! Continuemos conversando.

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André Grillo

Sobre o Fora do Eixo – Pesquisador que estuda o Fora do Eixo

Bom, com tanta polêmica no ar, se tornou inevitável expor um pouco do que vi, vivi e pesquisei sobre o Fora do Eixo nos últimos anos.

Então, venho desenvolvendo uma Tese sobre as relações entre o panorâma (tecnológico e social) contemporâneo e a produção cultural, vislumbrando a influência de processos de auto-reflexão e auto-crítica da “sociedade ocidental” nos anos 60 do século passado na conformação (seja em sua face crítica ou cooptada) do mundo atual.

Sendo mais direto: Sociedade (mundial) Contemporânea e produção cultural, passando pela Contracultura.

Conheci a Rede Circuito Fora do Eixo em meados de 2010, alguns meses antes do III Congresso Nacional da rede, realizado em Uberlândia. Me inscrevi como observador, e fui pra lá em companhia de uma amiga de Juiz de Fora que representava o Coletivo Sem Paredes, recém-formado e que iria pleitear a adesão a Rede, e do pessoal do Coletivo 77 de Barbacena, que estava acompanhando esse processo

É difícil descrever aqui em poucas palavras a experiência que foi participar deste Congresso, e de me ver imerso naquele mar de informações sobre algo impressionante que era novo para mim… Conheci muita gente interessante, de todo o país, gente nova extremamente articulada e comunicativa, que falava apaixonadamente de uma infinidade de experiências que desenvolviam em suas cidades, trocando informações, articulando, em meio a rodas informais e descontraídas, possíveis parcerias, intercâmbios, rotas para otimizar o deslocamento de bandas…

Pelo que pude acompanhar, foi nesse momento que se fortaleceram idéias como sede-moradia, dedicação exclusiva, caixa coletivo… Existiam então uma infinidade de coletivos, alguns que já adotavam esses princípios, outros em parte, outros que só produziam eventos, e assim por diante…

Esse, vamos chamar aqui, de “Case” “Casa Fora do Eixo”, seria então lançado no ano seguinte, em grande parte como desdobramento das discussões desse Congresso.

Surgia então, em meados de 2011, a “Casa Fora do Eixo São Paulo”, que seria o modelo mais acabado desse novo modelo de vida e de gestão, de vida e trabalho, em verdade pautado muito na impossibilidade de diferenciar vida e trabalho, tempo de trabalho e tempo livre. Algo que, para mim, embaralhava algumas concepções teóricas, como a de Ricardo Antunes, que fala de uma vida plena de sentido dentro e fora do trabalho com principal meta emancipatória, indo além da idéia de ser necessário aumentar o tempo livre… enfim, sem querer me perder nessa discussão, pois aqui não é o lugar… o que vale ressaltar é que me pareceu muito interessante essa idéia de implodir essa dicotomia (tempo de trabalho x tempo livre), e que não era só uma idéia, mas uma prática dessas pessoas…

Mas voltando a Juiz de Fora, que é a cidade em que vivo há alguns anos e na qual se localiza meu curso de doutorado. Acompanhei o coletivo aqui desde o princípio, e cheguei a colaborar em algumas atividades, estando, de lá pra cá, mais próximo em alguns momentos e mais afastado em outros, de acordo com as exigências da minha pesquisa. Sempre tive uma relação amistosa, apesar de nunca ter de fato me integrado ao mesmo.

Venho desde então acompanhando o processo, tendo circulado em alguns eventos, como boa parte dos festivais do Circuito Mineiro de Festivais de 2012, nos quais participei da cobertura colaborativa com textos em alguns, fui muito bem recebido em todos, e pude presenciar o envolvimento e dedicação espontânea dos participantes… Também estive no Congresso Nacional do FDE em 2011, no Congresso da regional Minas em 2012, tendo realizado algumas entrevistas, principalmente neste último (além de já ter feito algumas ainda em 2010). Neste momento, pude realizar algumas entrevistas mais direcionadas ao foco da minha pesquisa, no caso a Instituição em si (se é que podemos chamar assim uma rede…). Todos, não só aqui mas sempre, foram muito solícitos e atenciosos, sem nenhuma garantia de que eu “falaria bem” ou coisa assim, o que sempre esteve claro que não é meu papel como cientista…. Entrevistei as principais gestoras nacionais reponsáveis pelas diferentes Frentes de atuação, como o Banco FDE (Débora Bernardes), a Universidade FDE (Carol Tokuyo) e o Partido FDE (Marielle Ramires) (que difere muito do sentido tradicional de partido, e é um desdobramento interno a partir do mais antigo PCult, o Partido da Cultura, que é uma entidade Supra-Partidária formada por agentes (políticos ou não) engajados na defesa, formação e implementação de políticas públicas para a área de cultura). Foi também nesse momento, logo após o Congresso regional, que passei uns dias na Casa Minas, seguindo em seguida pra outro festival (ressaltando que tudo isso com recursos próprios). Também estive na Casa FDE SP, em diferentes momentos.

Participei também de imersões, como a Imersão do Fora do Eixo Minas no começo de 2011, e mais recentemente, na agora Casa Fora do Eixo Juiz de Fora, que já frequento eventualmente, mas nesse caso passei alguns dias lá junto com o pessoal de Três Rios (cidade vizinha no interior do Rio de Janeiro), que é a minha cidade natal e na qual vivi 21 anos, antes de me mudar pra Juiz de Fora. Esse ano, foi realizado em Três Rios a terceira edição do Grito Rock. Em 2012, fui assistir o evento, impressionado com a qualidade das bandas (principalmente em uma cidade que não oferece nenhuma opção de divertimento que não seja a cultura de massa), e aproveitando para rever os amigos.

Enfim, em 2013, conheci o pessoal responsável pela produção do Grito em TR bem no começo da produção, e passei a acompanhar as reuniões abertas para a sua preparação. Todo o processo foi bem aberto e colaborativo. Mas o que me chamou a atenção é que o pessoal não conhecia bem o que era o Fora do Eixo (lembrando que este é um evento, como outros, aberto a produtores que não fazem parte da Rede)… daí, busquei aproximar o pessoal de lá da Rede, a partir dos contatos que havia feitos durante os anos, em meio a essa observação que se tornou então mais participante. Participei recentemente da produção da SEDA-Semana do Audiovisual realizada pela primeira vez lá, e posso dizer que foi bastante gratificante estar ali envolvido com todo o processo, junto de um coletivo que ainda está se estruturando. Minha observação ficou ainda mais participante, o que não diminui minha postura crítica em relação ao processo, e nem houve em momento algum coerção para que fosse de outro modo.

Por fim, o importante aqui é descrever as impressões que tive e tenho dos agentes da Rede e de seu processo. Uma coisa que afirmo de antemão é o reducionismo de querem imputar a toda uma rede distribuída a experiência de algumas pessoas apenas, pessoas que tiveram experiências ruins. Nenhum processo, ainda mais dessas dimensões e relativamente recente, está isento de contradições, erros de avaliação, posturas equivocadas e frustração, principalmente de quem, inicialmente fascinado com o que acontecia e com o seu (real) potencial, acabam se ressentindo ao não conseguir se incorporar ou se manter nesse processo.

Uma coisa que me chama a atenção nos depoimentos acusatórios (e não apenas críticos, o que seria natural) que vem surgindo, é que todos ficaram impressionados e fascinados com o potencial da Rede ao primeiro contato. Bom, é muita ingenuidade supor que pessoas tão inteligentes e articuladas, genuínos agitadores culturais, como eu e muitos podem testemunhar a respeito dos agentes do FDE, seriam tão facilmente enganados por um “grande líder”, que seriam “obrigados” a viver em um coletivo e fossem constrangidos a não sair e a não falar a respeito (o que, pontualmente, pode acontecer, estamos falando de seres humanos, que enfrentam as situações das mais variadas formas, erram e acertam…

O debate sobre horizontalidade e lideranças já tinha sido emancipado em entrevista, que recomendo muito, feita a Rodrigo Savazoni http://outraspalavras.net/destaques/otimismo-atitude-subversiva/   reproduzo o trecho específico, em itálico:

“A outra crítica é que alguns nomes seriam lançados como poderes nessas redes enquanto outros nomes se manteriam no anonimato. Haveria uma catapulta política para alguns em detrimento de outros.

Pode ser que isso ocorra. No caso da Casa da Cultura Digital, nós reunimos algumas lideranças que já tinham uma trajetória antes de sua existência, como é o caso do professor Sergio Amadeu da Silveira, dos grandes defensores do software livre no Brasil, ou de Cláudio Prado, que articulou os projetos de políticas de cultura digital na gestão de Gil no Ministério da Cultura. Ao mesmo tempo, outras lideranças foram emergindo, gente importante, que é referência desse debate no Brasil, como Daniela Silva e Pedro Markun, do Transparência Hacker; Lia Rangel, André Deak, Bianca Santana, destaque no debate sobre recursos educacionais abertos; Gabriela Agustini, Georgia Nicolau, Dalva Santos, à frente do Festival CulturaDigital.Br; Lucas Pretti, Andressa Viana, Thiago Carrapatoso, entre tantos outros, que pariram inicialmente o Baixo Centro. No caso do Fora do Eixo, eles também foram criando inúmeras lideranças, como Pablo Capilé, Felipe Altenfelder, Talles Lopes, Carol Tokuyo, Lenissa Lenza, Bruno Torturra, isso mais recentemente, mas tem aí o Daniel Zen, o Ricardo Rodrigues, gente do Brasil inteiro. Há muitas lideranças surgindo, gente qualificada que foi formada nessa luta. Pessoas extremamente capazes de desenvolver projetos ultraqualificados, de atuar com maturidade emocional, cultural, política. Vemos quadros na boa tradição dos processos políticos sendo formados, gente muito boa surgindo de dentro. Muita gente reinvestigando sua formação e percebendo como pode viver uma vida inteiramente distinta. O papel de liderança, dentro de processos políticos vigorosos, se forma não pela sua capacidade de ser você mesmo, mas pela capacidade de localizar desejo para muito mais pessoas além de você. Vejo como um ato generoso, de se colocar, muitas vezes, como o instrumento de um processo. Erro é esquecer que, por trás de um nome, de um porta-voz, há todo um processo que o constitui.

Pensei no Gilberto Gil falando do Lula. Gil faz a metáfora do cavalo de santo, aquele que vai para a linha de frente e se coloca à disposição, coloca a sua individualidade guiada por coletivos, não guiada pela sua necessidade de satisfazer o seu ego. A grande liderança é forjada dessa maneira. Lula é um cavalo de santo, incorpora-se nele o povo brasileiro. Pode parecer uma análise complicada, que apontaria para o populismo, porque fica parecendo que um homem é o povo. Mas isso toca muito fundo no nosso tipo de sociedade, que sempre busca alguém que seja o responsável, o representante. E precisamos lidar com isso. Mesmo agora, entre os coletivos aunomistas, como o Passe Livre, eles elegem um porta-voz para lidar com a sociedade tal como ela está organizada, porque não é possível, a cada vez que se precisar negociar com uma empresa, com a mídia ou com o Estado, que se envie uma pessoa diferente. É necessária uma continuidade na conversa. Essa é a questão: qual é a relação que se quer ter com a sociedade tal como ela é? Porque às vezes o que parte da maioria das críticas é que querem que façamos da política um exercício abstrato, que não dialogue com a realidade e o contexto social ao qual nós estamos inseridos. Dentro das estruturas, há horizontalidade, tarefas, responsabilidades partilhadas. Para fora, muitas vezes, isso não fica claro, e o que aparece é a verticalidade.”

As vezes as divergências extrapolam, e fica inviável a permanência, o que é natural.

Outra coisa importante: a Rede é descentralizada, por que os pontos tem autonomia, não são como franquias de uma empresa central, mas tem a liberdade de produzir os eventos que quiserem e atuar como quiserem, e de gerir seu caixa como quiserem (o que não exclui um estímulo natural a se produzir os grandes eventos, como o Grito Rock). Cada ponto tem seu caixa coletivo, e presta contas por ele. Um ponto pode pleitear recursos de um edital, e será responsável pela prestação de contas do mesmo. A estrutura não é a de uma empresa gigante, uma espécie de corporação com controle rígido de cima, e sim uma rede distribuída de produtores e agitadores culturais. O que não exclui lideranças. E o que não exclui certas orientações mais gerais, coisas como uma identidade visual pro Grito Rock (que é mínima, apenas algumas fontes e logos, a partir das quais se cria a vontade). Além de articulações práticas em Rede, como a discussão de datas próximas em cidades próximas para otimizar a circulação de bandas e artistas, a atualização sobre como estão as manifestações nos mais diferentes lugares em assembléias gerais…

Enfim, há muita discussão que pode ser feita, discussão teórica por exemplo, à qual venho me dedicando. tenho minhas dúvidas, críticas e incertezas, que foram e serão colocados em momento certo e lugar oportuno. Coisas inclusive mais gerais do trabalho dito flexível, como a questão da previdência e da precariedade em termos de direitos trabalhistas, por ex.

O que pra mim fica de mais importante é não desmerecer o trabalho (e a vida) de uma série de pessoas dedicadas, engajadas e lúcidas, subestimando a inteligência de pessoas que realizam tanto, mesmo com poucos recursos, e muito mais do que ficar fazendo marketing de uma marca. Basta pesquisar um pouco e ver o volume de atividades realizadas, e a importância da Rede na oxigenação (e até na criação) de cenas de cultura alternativa em várias cidades pequenas e isoladas do circuito cultural, e também (e por que não) em grandes centros. As possibilidades são enormes, as implicações de toda essa experiência são no mínimo inquietantes e, com seus erros e acertos, colocam em cheque muitas das concepções dadas e confortáveis do sendo comum sobre o trabalho e  a vida. 

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Ricardo Brasileiro

Coletivo CECAC

 

Sobre Lideranças na Rede Fora-do-Eixo

A Rede Fora-do-Eixo é composta por ativistas, produtores culturais, jovens idealistas, artistas, crianças e por aí vai. Galera motivada com uma nova possibilidade de mundo. Praticamente o mesmo sentimento e entusiasmo das ruas e praças espalhadas pelo Brasil afora. Esse pessoal vem de desafios e disputas em suas localidades pela cultura e democratização da informação. Então, é naturalmente uma Rede formada por lideranças. Dentro do processo de gestão do Fora-do-Eixo, quem cria lastro de postura e ação acaba se tornando liderança (mas não é um título hierárquico, mas uma posição colocada processualmente). Entendam que em todo processo de trabalho nada é mandado, muito pelo contrário. O barato é tão imerso que tudo se discuti saborosamente. Eu admiro muito essas lideranças todas e de certa forma, também sou uma liderança.

O texto de Beatriz Seigner acusa Pablo Capilé de dono e patrão da “marca” Fora-do-Eixo. Pois bem, especificamente sobre Pablo, eu afirmo pela minha experiência em discussões, reuniões, congressos e outros encontros da rede, dos quais ele participou, que Pablo é sim uma liderança totalmente carismática. Ninguém baixa cabeça, ao contrário, levanta e se estimula pelo debate que ele provoca. Eu admiro essa sua liderança, assim como das outras centenas pulverizadas e distribuídas pelos interiores desse país. Do Fora-do-Eixo ou de outros coletivos e movimentos sociais. Mestres da sabedoria popular ou articuladores nessa disputa em ebulição do século XXI. Admiro cada uma delas e me espelho, aprendo e toco o barco na construção de um novo mundo partindo do corre local com portas abertas

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Ricardo Targino

Cineasta e ativista dos movimentos de cultura e comunicação

 Xô urucubaca e suas catracas!

Semana decisiva para os protestos que desde junho sacodem o Brasil

As manifestações que desde o mês de junho tomaram conta do país inauguraram um processo inédito de participação popular na democracia brasileira. Fizemos as mais grandiosas manifestações de rua de toda nossa história política e de lá para cá as ocupações se multiplicaram por todo o Brasil e os protestos, ainda que menores, seguem acontecendo diariamente. A multidão derrubou os 20 centavos e também o consenso através do qual nos faziam crer que o povo brasileiro aceitaria sempre passivamente o jogo mafioso feito na política tradicional.
Desde junho, a elite política que ocupa os diferentes níveis de governo não tem mais consigo dormir porque o barulho feito nas redes e na rua não cessa. No Rio, Cabral já não sabe mais como pedir pra que lhe deixem recuperar o sono. Em São Paulo, Alckmin acendeu todas as luzes de alerta com o vazamento do escândalo do cartel milionário do metrô e um novo chamado às ruas feito pelo MPL, principal organizador daquilo tudo que vimos em junho. Enquanto isso em Brasília, apesar do esforço de Dilma em tentar viabilizar uma Reforma Política, o Congresso já não faz mais nenhuma questão de ‘mostrar serviço’ pois acreditam estar livres do sufoco em que se viram com a multidão às suas portas.

Um fantasma ronda as redes sociais

Desde que o MPL anunciou sua volta às ruas marcada para esta quarta-feira, dia 14/08, o sono tem ficado ainda mais difícil para os todos os nossos governantes e principalmente para os que temem as ruas. Com a multidão de volta à cena em SP, em pleno escândalo do tucanoduto, em meio ao teatro da Reforma Política ‘subir no telhado’ e somados às ocupações de Câmaras Municipais pelo país poderíamos mesmo estar diante do estopim de questionamentos ainda maiores e principalmente de um novo ciclo de protestos gigantescos como fizemos em junho.
Evitar que a multidão volte às ruas dia 14 e pare São Paulo tornou-se a principal ocupação do obscurantismo que liga o governador de SP, a elite tucana e ‘comitê central do conservadorismo’ cujos porta-vozes mais conhecidos são Reinaldo Azevedo e a Veja.
A estratégia utilizada por eles não é nova: a criação de um ‘factoide político’ capaz de ‘dividir para conquistar’. Os factoides obedecem sempre à mesma lógica: trazem a público alguma ‘revelação’ capaz de instalar uma ‘crise moral’ para dividir aqueles que estão juntos realizando coisas em comum. Pautados pela crise moral, os organizadores dos protestos se dividem em longas discussões de acusação e defesa, cujo resultado é a natural desmobilização das ruas e o consequente fracasso do chamado à mobilização.
A revista Veja, desde junho, procura construir ‘dossiês antídoto’ contra os organizadores dos protestos para criarem factoides na medida de sua necessidade. O MPL, exemplar em sua organização e blindado pela vitória da revogação dos 20 centavos, dificultou a armação do factoide contra eles. Foi por isso que o alvo escolhido pelo obscurantismo do tucanato para boicotar o chamado às ruas tornou-se a Mídia NINJA. Plataforma surgida no calor das ruas, os NINJA alimentaram a rede social com a continuidade do processo aberto em junho. Não foi difícil para o obscurantismo saber de críticas que se faz Fora do Eixo e de suas inegáveis contradições, afinal, qual organização não as tem? Os NINJA tornaram-se então o melhor alvo para instalar a crise moral. O convite ao Roda Viva, aceito ingenuamente por eles, já obedecia à estratégia de colocá-los no olho do furação. Ao mesmo tempo, buscaram incentivar ‘testemunhos’ que fossem capazes de impactar nas redes e por em colapso a organização dos novos protestos. Acertaram no alvo. Qual organização está livre de críticas? Quem não tem entre seus ex-membros quem acuse incoerências? Gerando desconfiança e provocando a divisão, neutraliza-se ou minimiza-se compartilhamento das convocatórias e das transmissões online dos protestos

As acusações feitas ao FdE obedecem à lógica do factoide.

Acusações gravíssimas para tornar a necessidade de apuração uma exigência que o próprio ativismo se veja obrigado a fazer e também para abrir a via legal de criminalização através do Ministério Público é mesmo o método tradicional do factoide. Mas quando falamos em ‘trabalho escravo’, ‘fanatismo’, ‘estelionato’, ‘abuso sexual’, etc não estamos falando de coisas graves demais para terem perdurado tanto tempo em silêncio?
É mesmo estranho demais que, poucas horas depois de postado, um ‘depoimento’ feito via Facebook se replique de forma ainda mais completa no blog de Reinaldo Azevedo e na Veja para sintonizar uma campanha difamatória e causar a repercussão que causou. A cineasta cujo depoimento foi o estopim da campanha e o blogueiro da Veja já seriam antes “amigos no Facebook”? Qual ‘duto’ da rede social ligaria os dois?

Conheço pessoalmente Beatriz Seigner e mantivemos longos diálogos sobre o Fora do Eixo. Em janeiro, durante o Festival de Tiradentes, passamos horas analisando o coletivo e suas limitações e potência. Até então, não havia qualquer referência a ‘trabalho escravo’, ‘fanatismo religioso’, ‘estelionato’ ou ‘abuso sexual’ no relato de sua experiência com eles. Consultei outros amigos sobre as ‘denúncias’ expressas por ela e todos constatam que jamais tiveram o teor criminal que o ‘testemunho’ pós-Roda Viva trouxe dando início ao processo de satanização e ‘caça às bruxas’ feito contra este coletivo. O que mudou agora? Por quê? A última novidade da campanha é a criação de uma plataforma anônima de denúncia contra o Fora do Eixo na internet nos moldes do Wikileaks.
Não pretendo lançar qualquer dúvida sobre a participação ativa de Beatriz Seigner na armação do factoide. Sei que ela não aceitaria fazê-lo de modo explícito. Mas teria sido incentivada a fazer isto, nesta hora e neste tom?  Se sim, quem incentivou? O que pessoalmente mais me decepciona em relação àquilo que eu esperava de Bia é não ter visto qualquer texto seu, 10% sequer dos caracteres usados contra o Fora do Eixo, expressando seu repúdio à apropriação de seu depoimento pela Veja ou palavras suas que colocassem Reinaldo Azevedo em seu devido lugar. Alguém viu? Tem o link?
Atenção, senhores! Tentam nos desviar do foco!

Apurar e investigar o Fora do Eixo? Fala sério! Eu quero apurar a máfia dos transportes, o escândalo do metrô paulista, os estádios da Copa, as relações inescrupulosas da grande mídia. Eu quero lotar o Anhangabaú com o MPL no dia 14 de agosto. Eu quero que as manifestações convocadas na rede sigam seu curso vitorioso. Que os NINJA continuem ao nosso lado transmitindo a porra toda. Que não venham querer sabotar as lutas como se nós fôssemos otários. Não é hora de dividir! Não se faz isso quando a rua está viva e temos a obrigação de vencer. Precisamos, isso sim, é fortalecer as lutas.

Mudar o mundo exige bem mais que curtir e compartilhar. Vínhamos vencendo porque estávamos no caminho certo, apontando os alvos verdadeiros daquilo que nos sufoca. Não permitam que nos confundam o alvo. Não permitam que nos esvaziem as ruas. Não permitam estratégias sórdidas pra nos calar e vencer.

O bom combate continua.

A nossa primavera apenas começou!

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Yasmin Bidim

ex-integrante do Fora do Eixo

Na boa, eu ia fica bem na minha nessa história toda, sou ex integrante do Fora do Eixo, me desliguei a mais de um ano, sem nenhum rancor, gritaria ou “choque pesadelo”, na real nunca vi isso enquanto tava lá, mas “choque pesadelo” seria um ótimo nome pra uma banda de metal! Converso com todos que ficaram, numa boa. E claro que, se eu saí, foi pq aquela forma de vida em coletivo simplesmente não fazia mais sentido pra mim. Contradições? Existem várias, como em TODOS os movimentos sociais. Tbm tive a oportunidade de conhecer de perto o MST, durante a aproximadamente 1 ano conheci assentamentos e centros de formação, inclusive colaborei na produção de um documentário com eles, e TBM haviam contradições. As contradições NÃO DESLEGITIMAM nenhum movimento social, pelo contrário, só aponta como é difícil nadar contra a corrente.

Mas na real, não quero entrar muito nesse debate mais profundo sobre movimentos sociais, até poderia, mas não é o objetivo. O que eu tiver que resolver com o FdE vou resolver pessoalmente, no boca a boca com as pessoas com quem eu convivi por um ano.

A minha implicância na real é com a Beatriz Seigner. Entrei no seu perfil e no dia 12/08, anteontem, haviam 10 compartilhamentos de posts de alguém metendo o pau no FdE (alguns inclusive escrotos, antiéticos e com certeza vindo de pessoas totalmente desinformadas). Tudo bem, todo mundo tem direito de criticar. Mas na boa Beatriz, parece que vc ta sendo promovida pra isso. Não tem nenhum filme ai pra vc fazer? Vc não é cineasta?

Passei um ano DENTRO do Fora do Eixo, dentro desse um ano, 4 meses na Casa Fora do Eixo São Paulo. Sai qdo quis, fui estimulada a ficar e totalmente apoiada qdo realmente decidi sair. Lá, ficaram muitos amigos.

Eu vi que eu tava lá! E vc, tava onde?

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Geanini Hackbardt

A Vida Fora do Eixo e o mimimi dos aspirantes ao Olimpo

Geralmente quando nos deparamos com algo radicalmente diferente há uma tendência de auto proteção, um medo que está associado à mudança, à sair de uma certa posição de conforto em que nos posicionamos inconscientemente com a monotonia do cotidiano. O novo assusta, constrange, gera dúvidas e preconceitos. Por isso, as polêmicas em torno das ações do Fora do Eixo são intrigantes.

Algo novo, para quem descobriu agora, está despertando diversas reações e julgamentos (ou pré julgamentos) que surgem desde a ultra direita à esquerda mais “vanguardista”. Uma variação de opiniões partindo de interlocutores num giro de 360° graus em termos de posições no espectro político e social. Então, senti a necessidade de contribuir com este debate, relatando aqui minha experiência.

Conheci o Fora do Eixo através de um amigo que estuda a rede no doutorado. Sou militante do MST na Zona da Mata mineira e começamos um diálogo na região, logo após o início da articulação no âmbito nacional. A princípio, como integrante da esquerda mais tradicional, também desconfiei da forma como são organizados os festivais, da aparente falta de “formação política” e de linhas estratégicas claras.

Construímos as ações da I Jornada Nacional de Lutas da Juventude com grande sintonia e desde então estabelecemos um diálogo contínuo que passa pelo trabalho de formação que realizamos em nossas áreas com a juventude e pela articulação dos movimentos sociais em Juiz de Fora, para realizar ações unificadas.

À medida em que fui entendo a prática das casas e a forma como se organiza o trabalho, percebi que não falta formação e enriquecimento dos sujeitos. A riqueza neste caso, não se trata de acúmulo de dinheiro ou bens materiais. Trata-se do acúmulo de novos valores, na tentativa, dentro deste sistema perverso do capital, da práxis do novo homem e da nova mulher.

O bem coletivo e o compromisso com o outro são prioridades na organicidade do Fora do Eixo. O fato de não haver recursos individuais nas casas gera uma condição para repensar o modo como se utiliza o recurso disponível e logo, à reduzir o consumo de futilidades. O processo de construção das ações, o diálogo e a valorização da relação com o outro está sempre presente. A solidariedade, a compreensão, a troca afim de multiplicar o conhecimento são premissa de tudo. Nada está escrito em tratados, ou contratos, são exercícios diários permeados pelas contradições inerentes ao processo. Estas, nos levam a avançar e à crescer.

Para aqueles que defendem a tese da exploração ou auto exploração no FDE, fica a questão. Onde está o proprietário dos meios de produção que acumula com o trabalho, cara pálida? Além disso, estamos falando de trabalho improdutivo, que não gera valor, potencializa o valor. Não tem ninguém proprietário de uma mineradora, por exemplo, extraindo a riqueza e gerando mais-valia na produção. Acrescentamos sim, valor à uma riqueza que já existe, onde é possível conectar o sujeito que a produz para compartilhar.

No caso da cultura, há todo um diálogo, muito claro, com aqueles que se aproximam para potencializar e dar visibilidade ao resultado do seu trabalho. Em nenhum momento, se propõe o enriquecimento ou a elevação do artista ao Olimpo mercadológico. A lógica, não é de mercado. Não se trata da propagação da indústria cultural pelo interior. O eixo, não é uma questão geográfica apenas, é econômica e geopolítica.

A promoção da cultura e da informação é subversiva. Não só porque as centenas de festivais garantem o acesso à uma diversidade cultural, de mundos e ideias que a indústria cultural e a mídia de massa escondem e monopolizam para se locupletar, mas porque os eventos vêm com o bônus de espaços formativos, abertos, de debate sobre os temas mais variados.

A consequência disso é a popularização das nossas riquezas culturais, criadas por artistas que dificilmente teriam oportunidades de mostrar sua capacidade e talento, dependo do caminhar, arrisco a dizer que leva até uma reinvenção da democracia, na qual todos podem ser protagonistas, nos mais recônditos cantos. Contra-hegemonia!

De fato, o artista que pensa em fazer carreira junto aos deuses do Olímpo acaba deslocado e não entende a construção. Mesmo assim, se o artista quer se vender ao mercado e não compartilha do mesmo sonho, a parceria o beneficia com a visibilidade que a plataforma dos festivais proporciona para tal.

É verdade que algumas relações construídas deram visibilidade, não só aos que se conectaram, mas também ao Fora do Eixo. Inclusive aquelas relações que não funcionaram e que geraram críticas. Isso também acontece nos MST. As vezes realizamos ações coletivas, que são distorcidas pela mídia de massa. Basta haver uma bandeira, uma foice, um símbolo e a autoria passa a ser do MST. Não há oportunismo, há uma distorção da realidade por parte de quem não a compreende.

Submeter produções alheias à “marca” e “capitalizar” sobre estas produções é algo impossível se não há comercialização, se o princípio é a troca. A mercadoria simplesmente não se realiza. Agregar valor à uma “marca” que tem como objetivo a auto implosão, a própria superação por ações maiores, que envolvam cada vez mais outros sujeitos, não faz nenhum sentido. Simplesmente não existe oportunismo, seria um despropósito, algo contraditório à toda prática.

Depois de entender tudo isso, e participar de alguns eventos, acabei mudando para a Casa FDE em Juiz de Fora. Atualmente, divido meu tempo entre as tarefas colocadas pelo MST e as demandas do Fora do Eixo. Não recebo nada por isso. Nunca recebi salário do MST, nem do FDE. Contribuo sustentada por uma bolsa de estudos e ocasionalmente trabalhos freelance. Sim, invisto o pouco de recursos que tenho nisso e o retorno desse “investimento” são experiências maravilhosas, uma casa onde vivo com companheiros incríveis e o suprimento de todas as necessidades básicas para uma vida de qualidade, inclusive com livre acesso ao conhecimento e ao melhor da arte. Nenhum trabalho formal poderia me trazer tamanha realização e liberdade.

Somos parceiros, comungamos de um mesmo sonho, para isso não precisa assinatura. Somos militantes por que optamos por fazer diferente, não escravos, não há cárcere, não há obrigatoriedade, é uma opção. Trabalhamos por amor, pela fé na possibilidade real de transformação, porque o processo é tão estimulante que já compensa todo o esforço. E o resultado do trabalho está em nossas mãos, sabemos exatamente porque estamos trabalhando, nos tranformamos com ele e todos usufruem do que é produzido.

Nós criamos uma narrativa própria da história, em que acreditar que é possível, é um primeiro passo para fazer. Pode parecer idealista, e seria, se não viesse junto com o pé enraizado no trabalho, conectado de forma rizomática, aos mais diversos movimentos sociais. Parece também pós moderno, e seria, se não houvesse um compromisso com a mudança e um processo inacreditável de transformação dos sujeitos através do trabalho e da práxis.

A necessidade do FDE lançar um “portal da transparência” não parte somente da visibilidade do coletivo e de suas ações, mas também porque eles passaram a incomodar. E o que incomoda o poder, é logo inserido na lista negra da mídia, dos poderosos, da oligarquia que manda nesse país e no mundo.

Incomoda também àqueles que acreditam no sucesso individual, por mérito próprio, numa sociedade em que o sucesso pertence a escolhidos e herdeiros. É certo que estes, sempre cairão em crises de protagonismo, frequentemente revestidas de um discurso demagógico, que tenta travestir de politicamente correto a aflorada a mesquinhez de seu projeto pessoal de vida, individualista e egocêntrico.

Informação, cultura, comunicação devem ser universalizas, libertadas e multiplicadas. Isso é impossível sem um processo, no mínimo, revolucionário. Utopia? Difícil de pensar? Assusta?

Encarar de frente e conhecer o objeto ou o processo que leva ao medo é um ato de ousadia e coragem, ao qual a maioria não se propõe. Àqueles que já se posicionaram covardemente ou confortavelmente, é uma pena, só têm a perder. Àqueles que têm dúvidas, está lançado o desafio.
E aí, você vai ousar descobrir o que é a vida fora do eixo?

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Mariana Soldi

Então a moda que pegou nesse verão é o Fora do Fora?

Qual será a proposta de alocação do capital intelectual, humano e científico? Das tecnologias sociais e gestoras desenvolvidas?

Será que vamos ter espaço para reposicionamento dessas preciosidades que incluem de mao de obra qualificadíssima e tecnologias de pontas?

Tem proposta de reforma? Vai ter disputa interna e renovação de gestores-diretores? É necessário?

Eu não sei… alguém propôs?

Pq matar por matar, sem propor, sem provocar a reforma, sem negociar, é tão inapropriado, burro e imaturo quanto qualquer fato ilícito ou violento acusado contra o FdE (seja verdadeiro, fruto de mentes criativas e/ou simples argumento para manipulação).

Tem gente que tem o mesmo DNA e não vê a irmandade. Participa ou participou dos mesmos editais, passa ou passou noites escrevendo projetos, negocia ou negociou permuta com artistas e contrapropostas eternas para fechar a sua planilha no tão amado 0 x 0. Isso é família tb. Mesmo que seja primo de quinto grau que já deu treta no casamento da seu irmão.

Na minha opinião, quem trabalha com cultura e música e está colocando fogo inconsequente nessa fogueira das vaidades, está também tomando doses homeopáticas (pero fatais) do mais letal veneno, a ignorância com aroma de orgulho, capaz de comprometer a sua própria atuação na indústria cultural/criativa .

E não é pq o fantasma do PAN vai te atormentar a noite com “conversas infinitas” ou em pseudo “choques pesadelos” 220 V, é pq pode ser que essa pessoa esteja dando corda para o maior enforcamento coletivo da cultura independente e dos seus mecanismos de financiamento e geração de conteúdo. Todos estimulados com fervor e construídos com suor na última década e com franca e direta atuação fora-do-eixoana. O famoso: dessa água eu bebi e fiz alambique, e vc?

Ou a idéia é todo mundo se encontrar no cordão do próximo carna-axé-pagode-open-house? (nada contra, aliás todo mundo sabe que sou ‪#‎thiaguinhoteam‬ e ‪#‎iveterainha‬ forever e como eu estimo com amor e dedicação os bons momentos open bar da vida).

Eu tenho minhas experiências com o FdE, das mais variadas intensidades e resultados, de cunho pessoal ou profissional, todas elas baseadas em mais de década de rolê, que trouxe além do zig zag “tamu junto – tô fora” um apreço pela noção de construção e qualidade que só o tempo e a paciência trazem.

Como contexto vale reforçar que como a maioria dos grupos em atuação recente, esse tb é feito de trintinhas, tão mirins quanto qualquer trintinha, tão new-ego quanto qualquer classe média candy crush, todos bons candidatos para momentos bafônicos, assim como eu e vc ( na real, all ages included).

O lance é que para mim, primo é primo e casamento sem bafão dá em divórcio.

E faz um favor de vida: bota fogo na VEJA mais próxima (válido para qualquer edição, passada e/ou futura)

P.S- nem tô aqui pra quem quer palanque, tô postando num exercício de liberdade de expressão e pq a demanda de e-mail ou msg sobre o tópico tá maior do que o tolerável e gerar esse link vai ser vida 

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Pedro Alexandre Sanchez

jornalista

Em 1968, Geraldo Vandré sentiu necessidade de falar de política em forma de música: “Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores (Caminhando)”.

A tropicália já vinha vindo, e Gilberto Gil ainda sentia a mesma necessidade, de fazer política com música: “Procissão” (1965 e 1968), “A Luta contra a Lata ou A Falência do Café)”, “Questão de Ordem”, “Soy Loco por Ti, América” (1968). Caetano Veloso também: “Enquanto Seu Lobo Não Vem”.

Chico Buarque ensaiava comentar política por intermédio de música desde 1966: “Pedro Pedreiro”.

Antes de Chico, Nara Leão e, mais que ela, Maria Bethânia transformaram em canção política uma canção política que apenas nas vozes do Trio Mossoró talvez não tivessee sido compreendida como política.

Antes ainda do “Carcará”, o “despolitizado” Roberto Carlos fazia de tudo para levar o rumo da conversa para outros lugares: “É Proibido Fumar” (1964), “Quero Que Vá Tudo pro Inferno” (1965).

Gil, Caetano, Gal CostaTom Zé e os Mutantes sentiram necessidade de misturar política com comportamento em prol da música. 1968. “Panis et Circensis”, “Queremos Guerra”, “Divino, Maravilhoso”, “São São Paulo”.

O AI-5, de 13 de dezembro (dia do aniversário do des-politizado Luiz Gonzaga) de 1968, expulsou do Brasil os cabeludos transviados que queriam misturar comportamento, cultura, arte, música e política. Foram, voltaram e continuaram trançando pernas na música e na política (Chico também).

Em 1973, Milton Nascimento precisou cantar a política disfarçada em (falta de) liberdade, e chamou a des-politizada Clementina de Jesus para ajudá-lo: “Os Escravos de Jó”. A des-ultra-politizadíssima Elis Regina veio na cola: “Caxangá”, 1977.

Os jornalistas, atarantados, se estilhaçaram em mil nas bancas de jornal (quem lia tanta notícia?). Receitas de bolo. Policiais infiltrados nas redações. O Pasquim. Jornalistas apolíticos, despolitizados, des-politizados, P2 “apolíticos”, anônimos pré-anonymous, robertoscarlos munidos de máquina de escrever. Ponto, pronto, tracinho, tração: Chico Buarque e Os Trapalhões, “Meu Caro Barão”.

Diziam (dizem) eles, os jornalistas: nós não participamos dos fatos, (nós somos nulos,) nós só relatamos os fatos dos outros.

A ditadura civil-militar se mobilizou para tornar FEIA e indesejável qualquer tentativa de misturar política com música, politica com cultura, política com arte. Mesmo os mais engajados absorveremos feito esponjas a demonização da política na arte. “Chatos”, “panfletários”, “música de protesto”, “argh!”. Mesmo assim, a ditadura civil-militar começou a acabar, a conta-gotas, gotinha por gotinha.

Hoje são 24 anos da volta das eleições diretas, e ainda existe gente demonizando a política nossa de cada dia – seja na arte, seja fora dela.

E os fora-do-eixo.

E antes deles, os desobedientes.

Em 1990, os Racionais MC’s começaram a remisturar política com alguma coisa que muitos não queriam chamar de música: “Pânico na Zona Sul”.

Em 1994, Chico Science & Nação Zumbi transformaram mangue em música, manguebit em política, política em comportamento, comportamento em caldo de política cultural: “A Cidade”. Pântano fedorento e nutritivo – por vezes autofágico.

Em 1995, o Planet Hemp começou a ser preso pela polícia por remisturar música, comportamento e  – sim! – política: “Legalize Já”. Uma erva natural prejudica muita gente?

Em 1994, O Rappa já vinha pisando fundo no acelerador da música-de-protesto, contra a corrente dos demonizadores e linchadores, via canção política antirracista: “Todo Camburão Tem um Pouco de Navio Negreiro”.

Mulheres e homossexuais seguiram trançando as pernas (sempre trançam?) – mas houve Cazuza, houve Renato Russo, houve Cássia Eller.

E os fora-do-eixo.

E então os Fora do Eixo.

No Inverno Brasileiro de 2013, os MPL e os Fora do Eixo e os Mídia Ninja conquistaram assento na tela do Roda Viva, na tucaníssima TV Cultura, enquanto por debaixo do asfalto jorrava o escândalo do propinoduto paulista. “O PSDB tem por princípio não dialogar com nenhum movimento cultural”, diz o índio-negro de pele manchada do Mato Grosso. O Brasil entra em tilt. Os (quase) sempre calados jornalistas se inflamam.

O escândalo. A grana pública. O sexismo. A exploração dos artistas. A exploração das mulheres. A exploracão dos negros. A exploração dos indios (Pablo Capilé?). A homofobia. Todos os males do mundo concentrados em um “quero que vá tudo pro inferno” só.

Em 2013, médicos não querem #MaisMédicos e jornalistas fazem bicos como donos de bares, promotores de shows, donos de casas noturnas. Jornalistas não querem #MaisJornalistas. Não querem o eixo (ou ainda querem?) nem querem o fora-dele. #MenosJornalistas.

O jornalista André Forastieri faz política com pê pequeno, escrevendo textos “antipolíticos” sobre cultura fora-do-eixo (ou não) no R7, o portal da TV Record, financiado como todo mundo sabe por verba público-privada da Igreja Universal do Reino de Deus.

O jornalista indie meio avançado em anos Alvaro Pereira Jr. escreve colunas antipolíticas anticulturais na Folha de São Paulo, nas horas em que não está editando o programa mais conservador da televisão brasileira, o Fantástico, da Globo, rede público-privada afeita aos “planejamentos fiscais” em padrão Fifa. Política pura – rasa como uma canção pop de Roberto Carlos, mas política, ainda assim.

A ombudsman da Folha de São PauloSuzana Singer, escandalizada com quem não está nos eixos, utiliza o espaço que arrendou no mesmo jornal, espaço destinado à suposta “defesa do leitor”, para entabular seguidas receitas de bolo em defesa cega do jornal que lhe paga o salário. Política privada praticada em parceira público-privada.

O jornalista (???) Arnaldo Jabor sustenta em rede nacional (pairando sobre cascatas de “planejamentos fiscais”) que um menino de 13 anos assassinou uma família inteira de policiais – a família dele (ele, o menino, não ele, o “jornalista”). O dinheiro público-privado irriga tudo – menos 30%.

No Twitter, o jornalista decano ultracapitalista Sandro Vaia, amigo de uma estranha blogueira cubana e servidor do misteriosíssimo Instituto Millenium, cala-e-consente a repetidas perguntas do jornalista desempregado (ou melhor, free-lancer) Pedro Alexandre Sanches: sim, o Instituto Millenium utiliza verbas públicas para desenvolver suas atividades. Ninguém dá a mínima para a revelação do decano.

Estamos porventura ocupados demais (as pessoas na sala de jantar?) no delírio de exterminar 513 anos de antropofagia, com um único, certeiro e mortal golpe. Alguns de nós se vestem de toda a canastrice disponível para, ainda, se autovomitar de “contra os partidos”, “contra a política”, “contra isso tudo que está aí”.

Contra isso tudo que está AÍ. Não contra isto tudo que está AQUI.

Na hora gloriosa e vertiginosa do tilt coletivo, todo mundo percebe de repente, não mais que de repente: do índio capixaba de Cachoeiro do Itapemirim ao índio mato-grossense de Cuiabá, passando pelas garotas de Ipanema, estávamos todos fazendo política este tempo todo!!!

E o que mesmo havia de errado nisso? Quem foi mesmo que lhe enfiou na cabeça que havia algo de errado nisso?

Bem-vindos, todos, à POLÍTICA, este lugar perturbador onde moramos durante nossas vidas inteiras.

(Obrigado à jornalista Bia Abramo pelas fagulhas de inspiração.)

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Gabriela Reis

ex-integrante do FdE

Bom, vou dar uma opinião rápida e prática a respeito do que tenho lido nesses últimos dias.. e tbm não vou dar nomes aos bois, pois acho que a carapuça está aí a quem servir… prefiro me manter neutra diante do assunto e diante dos pedidos de depoimento, pq eu tenho o direito de não me expor, e como não envolve somente a mim e existem pessoas que estimo muito, devo respeita-los…

críticas tem muitas, eu vivi e convivi por quase 1 ano me dedicando de forma integral, e vi de dentro como a coisa funciona, não estou aqui para fazer discurso em defesa de nada, mas vou dizer que diante de toda a opinião que tenho (e não é pouco), acho de um extremo exagero a forma como estão polemizando a coisa… como toda experiencia, existem prós e contras, e quem está em evidencia será sempre o alvo, tanto do que é feito de bom, como as falhas, os abusos e absurdos…

resumindo: parem de tirar conclusões por experiencias alheias e por mais centralizada que a coisa seja, tá lá aberta para quem tiver dúvidas… não vamos repetir demagogias, como toda seita, religião, partido, entre outras coisas, nós temos o direito de escolha, e entra quem quer…
o escravo é aquele que se deixa escravizar. ‪#‎ProntoFalei‬

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Breno Dallas

ex-integrante da rede

No ano passado tive uma vivência muito intensa pelas Casas FdE. Creio que a mídia de massa está fazendo mto alarde nesse momento em relação à tal “obscuridade da‪#‎MídiaNinja‬“, principalmente pq tb é capaz de enxergar a anomalia no sistema vigente, q dá brechas pra expressão midialivrista, q a cada dia só ganha força; além disso, temos o sistema financeiro, q tb não admite novas formas de fazer e viver. Pela vivência que tive com o FdE em 2012, só tenho a dizer que foi um aprendizado muito intenso, que realmente fez parecer que 1 ano parecessem 5. Tem toda uma galera que trabalha e discute políticas públicas dia e noite pra chegar onde está, nada é por acaso. Não acho que o sistema concebido pelos CARDs seja falho ou incompreensível, como foi citado inúmeras vezes por esses jornalecos do Século XX; apenas é um processo em constante formulação. Respeito máximo ao pessoal do Fora do Eixo, incluindo Capilé e Torturra.

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Paula Ribas

 

Todos esses caras da foto eu conheço!!

E já fui diversas vezes a FDE, balela o que dizem sobre vcs Filipe Peçanha Thiago Dezan , entre os outros parceiros.

Vcs tão causando (rssss) não posso negar o quanto gargalho a cada matéria que leio sobre vcs. OS caras piram pq não conseguem decifrar e nem dominar vcs….

Deve tá phoda, mas guenta o tranco que é assim mesmo…..”ninguém bate em cachorro morto”. Eu sempre ouvia isso na época do Nova Luz….

O que a grande imprensa não quer reconhecer é que a Nova Era na Comunicação chegou!! Já existem muitos como vcs, com trabalho ótimos e em grupos decentralizados e espalhados pelo mundo.

NA FDE encontrei gente de cabeça aberta, nova visão de mundo e a fim de fazer acontecer.
Pessoal, no apoio e na torcida desse enfrentamento!!!

Beijos e valeu

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Raíssa Galvão

 

Não sei em qual patamar elevado a Beatriz está para chegar e jogar críticas a minha vida e às minhas escolhas assim, de forma leviana e irresponsável como fez. Mas já que colocou, me coloco também em total condição de responder a elas, mostrando o quanto são rasas e fruto de uma visão preconceituosa de alguém que, permita-me pontuar, acha que só chega cultura aos rincões do Brasil quando os moradores dessas regiões tem acesso ao cinema ou teatro e podem ler os autores clássicos que ela tanto idolatra. ¬¬

Se é pra produzir um relato sincero, claro e lúcido sobre a minha realidade, deixa que eu escrevo, Beatriz, ou você que se apropriar da minha vida e ganhar likes em cima dela?

Eu conheci o Fora do Eixo e eu ainda estava no terceiro ano do ensino médio, produzindo um festival de música independente em minha escola junto com o grêmio estudantil. Entrei, conheci mais, me dediquei, viajei, curti, aprendi e estou vivendo a coisa mais louca que já tive contato até hoje. Não estou comparando a nenhum outro lugar e nem colocando como único espaço para isso, mas viver em uma rede em que você constrói junto desde uma rede de festivais de 800 mil até um tweet, é incrível.

Sempre fui filha única, neta única, sobrinha única, mimada. Hoje eu moro em uma casa coletiva. São 15 morando comigo e dezenas de pessoas circulando pela casa todos os dias. Meu quarto eu divido com mais 3, meu guarda-roupas com mais 4, o estoque de comida, com quem ta na casa e a grana, com mais 2 mil. E nada, absolutamente nada disso me faz menor, ou muito menos escrava de qualquer sistema maquiavélico que se aproveita de jovens indefesos pelo país. Estamos propondo e vivendo uma outra lógica, que questiona e contradiz a vigente, mas que convive e hackeia por dentro.

Desde que entrei pra rede já aprendi coisa que aqueles que estão na turma que eu estaria no curso de comunicação não tem nem ideia, ou alguém aí já pensou em fazer parte de uma inciativa de jornalismo colaborativo que ganhou repercussão internacional e mostra ao vivo e de dentro dos protestos o lado dos manifestantes? E pra não parar no NINJA, que é nada menos que a consequência de anos de experimentações na área da comunicação, lembro-me da minha primeira oficina de midialivrismo.

Em setembro de 2010 eu começava o primeiro semestre de Comunicação Social na UFMG e, Durante o Festival Transborda e o I Congresso do Fora do Eixo Minas, participei da oficina de mídia livre, onde ouvi pela primeira vez sobre a origem dos zines, de iniciativas como o CMI e o Overmundo. O objetivo prático da oficina era realizar a cobertura do evento que contava com 51 bandas em 5 dias de programação. Essa foi uma das melhores experiências da minha vida. Junto a uma turma de cerca de 10 pessoas dividimos a equipe em produção de texto, atualização de redes sociais, fotografia, filmagem e transmissão via web rádio e assim, registramos tudo! Eu, que nunca tinha escrito uma resenha de show, conheci bandas incríveis (muitas das quais virei fã nessa época) produzi dezenas de textos e fui, pouco a pouco, com a própria prática, descobrindo algumas das “manhas” da escrita, aprimorando linguagem, conceito, abordagem.

Não é pra dizer que saí daí expert e a partir de então virei uma jornalista cultural. Não. Mas esta foi uma experiência incrível onde eu me provoquei a produzir e, em uma construção colaborativa, chegamos ao final com um produto foda e não quero dizer foda por ter excelentes textos, mas sim porque foi fruto de uma troca e de um aprendizado coletivo onde todo mundo saiu realizado e com uma bagagem ainda maior. É o império do empírico. É o laboratório diário de erros e acertos que faz avançar, crescer e entender.

Saindo dessa experiência resolvi buscar mais sobre a mídia livre, entender a fundo de onde veio, o que era, quem fazia, como faziam… No mês seguinte eu fui para o III Congresso Fora do Eixo em Uberlândia, onde me imbriquei ainda mais dentro desse emaranhado de conceitos práticos que o FdE propõe. Foi lá que fui entendendo mais sobre caixa coletivo, políticas culturais, produção em rede e nos debates sobre comunicação estávamos falando de uma cidade/aldeia digital, formada por cidadãos multimídia, sobre textos intimistas e estratégias para as redes sociais.

De lá pra cá, ministrei dezenas de oficinas de midialivrismo e cobertura colaborativa, viajei por vários estados do país, fiz planejamento de cobertura de 5 grandes eventos simultâneos, geri equipes de adolescentes mostrando a realidade local a partir de ferramentas multimídia, já fiz assessoria de imprensa para artistas em festivais, já participei de twittaço, já editorei a página do NINJA e a cada dia um novo desafio é posto, continuo aprendendo. A minha formação não passou pelos autores clássicos da comunicação, passou pela prática e pela vivência, a troca e a experiência que fazem com que a cada dia você agregue um pouco mais a sua bagagem e ainda possa compartilhá-la com cada vez mais gente.

Isso é pra mostrar que a cada dia eu aprendo mais e to ainda mais disposta a somar pra poder dividir. Tudo que faço e venho fazendo há 3 anos da minha vida é por acreditar no que faço, é por querer colaborar com um processo de mudança de imaginário e não de alimentação cega de uma instituição privada que acumula os meus ativos com o dos outros 2 mil agentes como tem gente que anda falando por aí.

Fica atento irmão, a vida é muito maior que o seu recalque. Abre o horizonte e tenta entender uma outra lógica, uma outra proposta, algo que vai além do salário no fim do mês.

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João Paulo Mehl

 

Esta discussão agora sobre o FDE é a PEC 37 das mobilizações de julho, uma baita nuvem de fumaça pra tirar o foco do movimento.  Os caras foram no Roda Viva, falaram de um monte de pautas históricas e urgentes que a gente não vê na mídia e a gente passa a semana discutindo os problemas do FDE!!!

Eu to junto, por que conheço a fundo o funcionamento do FDE, são uma organização impressionante, com as mesmas pautas politicas, inovadores pra caralho e por isto, cheios de defeito, natural de quem ousa.

Eu to firme na luta! Tamo junto!

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Isadora Machado

 

Há dois anos e meio que estou no Fora do Eixo e há um ano e meio vive em uma Casa Fora do Eixo. Hoje vivo com + 9 moradores fixos mais uma média flutuante de cinco viventes/hóspedes. O quarto é dividido, comida e guarda-roupas tambem. Exercita-se o desapego e a solidariedade – o que é meu também pode ser seu. E o aprendizado é feito na troca e na base do dia a dia. Do “como é mesmo que se cozinha esse frango?” a entender mais sobre reforma agrária conversando com o outro movimento que veio dividir a mesma sala, ao debate a qualquer hora do dia sobre novo jornalismo possivel,narrativas & afins.

A primeira vez que tive contato com o Fora do Eixo foi através de um postal azul que mostrava por um mapa cheio de alfinetes uma série de cidades conectadas. Acompanhando o gráfico vinha escrito Circuito Fora do Eixo. Eu fiquei por algum tempo me perguntando e muito curiosa como tanta cidade e gente reunida pela cultura em um circuito, fazendo as coisas circulares, fluxo, possibilidades mil, etc e como surgiu tudo aquilo.

Anos mais tarde, em 2011, a aproximação inaugural com as tecnologias da rede no Grito Rock 2011 em Florianopolis. Logo depois o Cardume Cultural se estruturou e passou a realizar as diversas ações na cidade. E no mesmo ano pisei pela primeira vez na Casa FdE São Paulo, durante imersão do coletivo. Três dias fervilhantes onde pude ver de perto – e o mais importante – vienciar na prática como se dá essa experiência radical de coletividade e compartilhamentos.

Sim, de fato 30 pessoas podem morar juntas, trabalhar no que gostam, sem chefes, propor projetos e executá-los, somar com mais um montão de gentes. Tudo sem o “putz, tenho que ir pro trabalho só saio às 18h”, mas podem escolher quantas horas vão querer fazer determinada coisa. Isso não é escravidão, é autogestão. No mesmo ano, no Congresso FdE em São Paulo, na época‪#‎ideiasperigosas‬, vi/vivi novamente que os alfinetes que o postal indicavam existiam fora dos avatares e que sim, é possível organizar-se socialmente de uma maneira diferente e trabalhar na construção um novo mundo possível.

No ano seguinte iniciei vivência na Casa FdE Sul, em Porto Alegre, onde num processo muito orgânico me tornei moradora. Não à toa quando mudei de cidade optei – sim, escolhi – sair de casa para a Casa, deixei a faculdade. Na época cursava já a metade do curso de Jornalismo da UFSC – já era a segunda tentativa universitária – com meses de embate sobre o que estudávamos e muitas inquietações para que&quem serve a instituição. Então, em um ambiente coletivizado e extremamente instigante, com uma série de informações pipocando de todos os lados é que se deu – e continua! – minha formação. Que, ao contrario dos clássicos e chavões que nos metiam goela abaixo na faculdade, é fruto da prática vivência e pela troca com o outro, e a “autonomia intelectual” se dá justamente aí. O que muitos não conseguem entender porque ultrapassa a barreira de tempos definidos de sua vida agora estou estudando // agora estou curtindo adoidado // agora estou trabalhando. Por que permite construir na prática nova possibilidade de viver, trampar e ser feliz, sem que se estabeleça relação de exploração, muito menos auto-exploração, pois se faz o que se gosta. Não é workaholic, é viver em sua máxima potência 

Por essa trajetória que entrei no processo. Trocar o apê, o carro na garagem, cartão de crédito, a terapia, por sair do casulo individualista e se abrir prum processo complexo, veloz e deliciosamente provocador. É também estar disposto a rever os seus vícios mais arraigados. É saber que o caixa coletivo é uma tecnologia foda, funciona e é de longe uma das coisas mais tranquilas. Que todas essas vivencias possibilitaram um contato muito mais vivo com a realidade e pessoas do que se tivesse seguido a faculdade de jornalismo – da dança contemporanea no uruguay ao agreste de alagoas. Que não tem plano de carreira e decimo terceiro, é plano de vida e como a gente resolve agora. É também sair da logica egoica do artista ilumiado & sua querida obra. Nenhum processo criativo é isolado, o artista não é filtro entre subjetividade e realidade, que vem trazer uma mensagem de deleite, pura fruição ou forte caráter político. Assumimos a radicalidade coletiva e quanto a autorilidade por entender que o percurso para produto que possa ser é sempre difuso, vindo de participações e repertórios.

Acho que esse e uma série de outros relatos que tão rolando por aqui, a contribuição de quem tá dentro do processo todo dia, em seus 99% ralação e 1% inspiração, devem ser mesmo muito difíceis de entender para intelectuais que não saem de suas zonas de conforto e altares sagrados de arte&cultura.

No mais, a gente segue juntos, atentos e fortes. ‪#‎VidaFdE‬

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Jivagos Pilhas

 

Meu primeiro encontro com a Fora do Eixo foi sem saber, depois de ter uma banda cover a 10 anos, e ter um trabalho autoral em mãos sem espaço no mercado pra ser usado, ao menos era o que eu pensava na época, comecei a procurar caminhos para começar a viver minha própria musica e não ser apenas mais um fantoche, pois graças a muitas bandas clássicas de diversos gêneros musicais que acreditaram e fizeram seus próprios sons, muitos músicos sustentam famílias hoje em dia, mas claro, cada um encontra algum sentido dentro de cada escolha, e a música é tão complicada pelo fato de ser um produto e devido a isto, envolver administração com seu marketing, finanças, qualidade , contabilidade, e principalmente por ser arte, eu digo principalmente por que é através da arte que surgem a maioria dos pontos de vista, das fugas de vaidade, dos mitos, enfim da realidade difusa.

Conheci o Portal TNB (Toque no Brasil), com suas oportunidades e possibilidades para enxergar um mercado que parecia tão distante. Através dele, comecei a acreditar que era possível tocar música autoral e ser feliz, mas sempre acreditando principalmente que eu deveria ter a mente aberta pra enxergar ferramentas e não para criar expectativas de que alguém encontraria minha banda e faria dela uma banda de sucesso, e muitos outros pensamentos com realidades de outros tempos.
Depois de tudo isso minha banda foi selecionada pra tocar creio eu no maior festival de banda independente do estado, Morrostock! Pelo fato de não ter contato com ninguém da equipe organizadora e curadoria que pudesse influenciar no resultado da seleção, fiquei muito feliz, comecei a acreditar na minha música e também que existem pessoas corretas. E foi lá que comecei a conhecer o papel da Fora do Eixo dentro da cena independente e onde fiz uma breve vivencia, vivendo a realidade de tudo que estava acontecendo.

Semanas depois o destino me aproximou de pessoas que fazem parte da organização, e em conversa direta comecei a ser “Abduzido” rsrsrs! pelo fato de estar conhecendo um sistema extraterrestre, pelo menos foi o que imaginei num primeiro momento. Depois desde encontro, comecei a manter contato e me envolver produzindo eventos e descobrindo que eu era um colaborador da organização.
Com muitas reuniões via Skype e presenciais, com algumas vivencias e emersões em casas Fora do Eixo, notei uma grande evolução no meu pensamento e passei a ter maior capacidade pra produzir os eventos, mas claro, sempre com a ajuda de outras pessoas e suporte total da Fora do Eixo. Se eu tivesse meus vinte e pouco anos e não tivesse na situação que estou no momento, certamente estaria morando em uma casa Fora do Eixo, vivendo esta vida alternativa, disseminando arte, cultura, ajudando artistas, comunidades e evoluindo como ser humano.

Depois desta experiência que tive e continuo adquirindo, posso afirmar que acredito e muito na Fora do Eixo por vivenciar seu sistema que é desenvolvido através de diversas pontas, que trabalham com foco pra desenvolver melhor o conjunto da obra. Pude ver bandas brasileiras e de outros países que receberam hospedagem solidaria, alimentação e recursos oferecidos pela condição de cada evento produzido por casas Fora do Eixo ou por colaboradores, serviços que se fossem revertidos em custos diretos da banda poderíamos dizer que seria impossível uma banda independente realizar uma turnê e se as pessoas que só falam sem saber direito nas redes sociais soubessem a dificuldade que encontramos em produzir eventos com bandas autorais por falta de pessoas e casas que acreditam e apoiem este movimento de bandas independentes buscando espaço pra divulgação de seus trabalhos, não falariam tanta besteira, dando ibope para mídias manipuladoras, que não dão a mínima pra tudo isso.
Eu tiro o chapéu pra Fora do Eixo para os viventes, Colaboradores e pra todas as pessoas que apoiam de alguma forma os artistas independentes, e deixo um recado para as bandas com trabalho autoral:
– Não esperem que alguém pegue vocês no colo e que deem tudo o que precisam, vocês precisam mais de vocês mesmas que de qualquer outra coisa, evoluam, façam autocrítica, e se quiserem realmente se profissionalizar, se profissionalizem para assim encontrar possibilidades e oportunidades.

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Rodolfo Gullar

Coletivo Semifusa

 

Na moral, Caras como Chico Rei, Zumbi dos Palmares e outros negros de centenas de anos atrás devem está se retorcendo lá no além, ao ouvir que jovens brancos, bonitos e de classe média estão reclamando que estão sendo escravizados por pretos, pardos e feios… Será isso que teria preço para eles?

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Renato Rovai

 

Como sabem, sou amigo da galera do Fora do Eixo. Mas também sou amigo de muitos que têm críticas a algumas práticas do grupo. Sempre considerei os erros e acertos parte do processo de uma construção difícil. Hoje a rede amanheceu quente por conta de um texto da cineasta Beatriz Seigner, que o Bruno Torturra acaba de responder. Publico os dois no blogue. E quero ajudar na construção de pontes. De conversas. Há muita gente boa fazendo muita coisa interessante. E não me parece que nos interesse o conflito pelo conflito.

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Paulo Zé

 

O tempo está cada vez mais rápido, no prática são as mesmas 24 horas do dia porém a velocidade com que tudo acontece é muito mais rápida, há quem diga que na proporção estas 24 horas valem somente 18 horas ou menos no tempo quântico. Mas o que isso tem haver com o que eu vou falar aqui na frente? TUDO!

Conheci o FDE lá em 2007 quando ele ainda engatinhava aqui no RS, de lá pra cá muita coisa aconteceu de uma forma tão intensa e rápida que muitas vezes era impossível acompanhar a dinâmica do processo tamanhas as atualizações diárias, bastava estar fora da internet por 24 horas para no outro dia o F5 levar mais de 3 horas só lendo mensagens e estar de novo no fluxo. Essa velocidade de construção da rede também é fundamental para que possamos entender o momento que estamos vivendo agora.

A mudança do Milênio, o final da contagem larga de tempo dos maias, tudo isso culmina no aqui agora e não é por acaso que tudo está acontecendo, uma rede que cresce da forma com que cresceu, de forma horizontal e colaborativa, em um processo com mudanças no dia a dia onde nada é fixo e estático, onde tudo está em transmutação, onde as ideias e disputas estão em constante debate num fluxo sem fim, onde o trabalho se mistura diversão e vice versa, onde há o sorriso de satisfação das pessoas em estarem se entregando ao processo de peito aberto pra o que vier pela frente, sendo livre para ousar é muito interessante. Nessa velocidade toda pode claro se ter uma margem de erro o que é normal, o aperfeiçoamento vem justamente da prática e dos experimentos.

Não há unanimidade pelo Fora do Eixo, óbvio que não é uma rede impecável sem erros, são 2 mil pessoas ou mais distribuídas pelo Brasil e América latina que tem autonomia de vida e assim como entraram podem sair a qualquer momento pois existe liberadade. Já houveram muitas desadesões e muitas adesões no processo de vida em rede, o que era de uma forma foi sendo moldado de outra e está tudo em constante mudança o fluxo é intenso e rápido pois acada dia o tempo acelera ainda mais, mas o mais interessante nessa história é que a velocidade do FDE acompanha o fluxo real de tempo que não é esse do relógio mas sim o tempo quântico e isto tb é uma forma de revolucionar.

Não vou me ater ao histórico processo do FDE aqui no RS pois queria fazer um texto curto, muito já foi escrito e lido e minha colaboração gostaria que fosse mais pontual e direta, mesmo assim já tá grandinho, então vamos aos dias de agora!

A Mídia Ninja chegou causando alvoroço, bateu forte em alguns pontos que eram intocáveis, pisou no calo de muito gigante e tava DADO que isso teria uma forte retaliação, por parte de esquerdistas descontentes e amargurados, direitosos loucos pela retomada do poder, dissidentes esperando uma brecha pra atacar se alimentando do rancor de outros e os que só querem mesmo é ver o circo pegar fogo. Outras pessoas já tentaram no passado fazer acusações e externar suas mágoas desqualificando o FDE mas isso não parecia assim tão importante para tirar a atenção dos gigantes da comunicação e do poder político. Porém com a velocidade dos tempos associada a velocidade das ideias, dos projetos, da ocupação cognitiva do campo de disputa, das pautas em comum e questionamentos de pontos proibidos como a reforma da comunicação, política e estética chegou um ponto onde a visibilidade alcançada pelo FDE passou a incomodar legal estes gigantes.

Essa visibilidade também dá espaço e coragem para muitos que entraram na REDE e saíram sem entender de fato a própria REDE se manifestarem tendo assim uma visibilidade gerada pelos grandes meios de comunicação igualmente em cima desta mesma REDE, ou seja a REDE continua alimentando em valor agregado o processo construído. No caso da cineasta, além de ter circulado pelos festivais fazendo muitas exibições de seu filme, aproveitado da estrutura toda mesmo sem entender o processo, consegue hoje dar continuidade a ele divulgando o seu filme atingindo a grande mídia e muitas pessoas graças a um post relatando em sua forma de ver uma situação com o FDE, ou seja ainda assim cuspindo no prato que comeu a rede continua alimentar em valor agregado a sua carreira e o seu filme, isso no mínimo é de parar pra pensar.

Pessoas que não conseguiram se atualizar com a velocidade devida e que esperavam alcançar o sucesso financeiro através da REDE, sem compreender a lógica do card, do valor agregado sempre saem decepcionadas e acho que esse foi o grande erro de todos que se aproximaram somente por interesse pessoal.

O FDE não é governo para ser cobrado com tanta ênfase, não teria teoricamente que prestar contas do dinheiro que circula ali dentro, senão aos que participam dela, mesmo assim o farão e em breve tenho certeza, e essa cobrança onde parece que um só homem que nem é líder de porra nenhuma mas sim é uma cabeça pensante, articulada e inteligente que iniciou todo o processo e que parecesse estar enriquecendo as custas do dinheiro público e do trabalho escravo? a convenhamos que isso é conto da carochinha, isso não existe! Se uma coisa é claro dentro do FDE e é que o dinheiro que entra alimenta a REDE e com o tempo cada vez mais está alimentando a cadeia produtiva em volta dela e que as pessoas que lá estão é porque amam lá estar.

Sou um parceiro, um Out Sider, que acompanha o processo desde o inicio aqui no sul do país e tenho amigos que fazem parte do FDE que converso muito, tenho amigos que passaram pelo FDE, tenho amigos que questionam o FDE, tenho parceiros que não curtem o FDE , e tenho amigos que nem sabem o que é FDE, todos eu respeito e me respeitam. O diálogo é saudável e a cultura como um todo é que sai ganhando pois o que todos querem no fundo é discutir política cultural, mais incentivo e mais clareza no processo. O dialogo, a avaliação e uma auto crítica se tornam fundamentais nesse momento para evoluirmos cada vez mais aperfeiçoando o processo na velocidade e intensidade que esse o merece.

Pais sem cultura é um país falido!
Mais amor menos rancor!

‪#‎issoésóumareflexão‬

Abraços

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Israel do Vale

 

eu tou “vendo coisas” ou essa operação gigantesca em torno da tentativa de desqualificar o FORA DO EIXO é [para além do que há de objetivo a se criticar, claro] mais uma enorme operação-cortina-de-fumaça da velha mídia [em conchavo com a velha política] pra desviar o foco [e a energia de um agente capaz de levar as pessoas em massa pra rua outra vez] do PROPINODUTO do PSDB de SP –que, tudo indica, toma pra si o cetro de “maior escândalo de corrupção da história do país”?!

não parece coincidência demais que isso se dê justamente nesse momento –e que tudo tenha começado com uma entrevista num programa de uma TV comandada justamente pelo… governo de SP?

‪#‎NÃOcabeINGENUIDADEnesseMOMENTO‬

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Daniel Fróes

Coletivo 103

 

Falar do outro é fácil, falar besteiras, sem conhecimento de causa, é jogar merda no ventilador. A tentativa de desqualificar o Fora do Eixo – os coletivos e as Casas FdE -, ao dizer que seus agentes são como “escravos”, alienados, é pedante. Análise de gente que faz questão de não entender o novo. Há muita desinformação no ar. Esta é a questão. Ouvir quem está de fora é sempre mais cômodo, confortável. Dar ouvidos a quem vivencia o “processo” é mais importante do que ouvir o observador… Afinal, a escolha é livre e consciente. Acho que isso, por si só, limpa a sujeira feita pela Beatriz Seigner, ao dizer que os agentes FdE são “escravos pós-modernos”. Piada pós-moderna, só pode!

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Gildázio Santos

 

Parabéns o Fora do Eixo, parabéns Ninja, a “grande ” mídia quer saber daqui a pouco eles começarão a desqualificar e criminalizar o pessoal, firmeza galera eles estão com medo, vcs conseguiram um exito que deixou os editores deles de olha em pé, eles agora querem ser ninjas também, é hora de popularizar mas não revele todo o segredo deixa eles continuar querendo entender, eles precisam entender o povo Brasileiro e sua História, os donos da mídia podre estão ficando doidos deixa ficar…

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Ygor Sas

É incrível a capacidade das pessoas pra falar de tudo, e do Fora do Eixo, com o referencial no umbigo.
De qualquer forma é sintomático de quem não entende nada de um processo coletivo e em rede. De quem sabe falar demais, mas pouco faz. De quem ainda reproduz a lógica do “dez pra um”. E nisso tudo o que mais me agride é duvidar da capacidade de discernimento das inúmeras pessoas pra fazer suas escolhas do modelo de vida e das praticas. Impressionante mesmo é ver como as pessoas falam, reclamam que “assim não dá”, mas deixam tudo do mesmo jeito num “pessimismo ingênuo”.
Do lado de fora é, realmente, tudo muito estranho. Mais estranho ainda é falar besteiras sem conhecimento de causa. Eu ESCOLHI fazer parte desse processo todo, e estou aberto pra dialogar com quem quiser conhecer meus referenciais. Respeito quem não compreender e acredito que o contrário deve prevalecer também.
E como falou o parceiro Daniel Froes: “Quando a escolha é livre e consciente, não se é escravo.”

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Lucas Willians

Eu não consigo acreditar nas coisas inacreditáveis que estão escrevendo sobre o Fora do Eixo. De verdade, é assustador como algumas pessoas são manipuláveis e rancorosas com algo que não conhecem! Por favor, estudem, conheçam uma Casa FdE, entendam o mecanismo de trabalho e depois formem sua opinião. Parem de consumir os lixos escritos por gente que tem seus interesses maquiavélicos ameaçados por novas formas de pensar, trabalhar e se desenvolver… Todos nós precisamos do novo, mas ninguém é obrigado a faze-lo, ninguém é obrigado a se relacionar com o Fora do Eixo. Eu tenho muito orgulho de tudo que já foi construído e pra mim faz sentido participar desse processo de criação de um novo mundo possível.

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Luz Anna

Primeiramente quero responder a todos que não posso afirmar que os depoimentos de Beatriz Seigner e Laís Bellini sejam verídicos, pq antecederam meu período de vivencia no FDE. Abaixo relato o meu percurso no Fora do Eixo.

No primeiro semestre de 2013 tive a oportunidade de encontrar Pablo Capilé que me convidou para um período de vivência na casa Fora do Eixo.

O que eu sabia: “Fora do Eixo, é uma rede de coletivos formada por músicos independentes, produtores culturais, comunicadores, midialivistras que surgiu do desejo de acesso a diferentes linguagens, conceitos e técnicas na área da comunicação, presente hoje em todos os estados do Brasil e ainda promovendo o intercambio cultural com vários artistas e ativistas cultuais da america latina. Algumas das plataformas criadas pela Rede: Grito Rock, Uni – Universidade Livre Fora do Eixo e Mídia Ninja.”

O choque é grande ao chegar na Casa Fora do Eixo, de fato não há remuneração direta, as pessoas vivem de um caixa coletivo, de forma colaborativa, que implica em por vezes dividir até as roupas de um “guarda roupa coletivo”, as demandas de cama, mesa e banho onde moram em média 20 pessoas são compartilhadas e sim todos trabalham demais de 9:00 às 4:00 da manhã.

Nada que me remeteu a uma “escravidão -pós moderna”, encontrei rapazes e moças formadas em nível superior ou não. Abertos a uma nova possibilidade de está na vida, e isso numa escolha consciente. Como foi inclusive meu caso!

O caixa coletivo é uma realidade, literalmente uma gaveta de um móvel onde ficam todos os recursos da casa, ganhos dos eventos promovidos pelo FDE. Todos tem acesso aos rendimentos cientes que os gastos são compartilhados coletivamente. É possível comprar equipamentos e utensílios (camera, celular e roupas individuais) e utilizar parte desse recurso em bens cultuais. E diga-se de passagem o eixo responsável pela manutenção da Casa não deixa faltar nada, desde absorventes á Nutella. Essa vivência me fez pensar muito quanto ao que realmente precisamos para pra viver.
Caso esse valor não seja suficiente para manter os residentes é transferido de outras casas através do Banco FDE onde é sistematizado os fluxos da Rede e prestação de contas. As planilhas são abertas a todos do FDE e quem mais desejar ter acesso. Pedi acesso a todos os arquivos e nenhum me foi negado.

O Fora do Eixo promove através de circuitos de bandas independes a circulação músicos e produtos (cd’s, revistas, camisas) das regiões norte á sul do país, sem gasto do artista em translado ou hospedagem. Essa negociação é uma variável de Casa FDE, coletivo parceiro e banda. Posso afirmar os valores de venda dos CDs das banquinhas são destinados aos artistas, (trabalhei nas vendas, contagem e entrega desses recursos). Não tive nenhuma acesso a informação de que os produtos audiovisuais, tenham qualquer obrigação moral ou legal de estar vinculado ao FDE.
Pra quem trabalha com artes no geral sabe que se existe uma vantagem nesse tipo de acordo é a formação de plateia.

A produtividade é uma questão a parte, especialmente na Mídia Ninja eles estão sempre conectados entre si via whatsapp, com as plataformas colaborativas, com as noticias locais e do mundo. Correm pelo corredores, correm para as coberturas, eles correm… mas quando topam com os outros há uma gentileza, uma harmonia, um toque leve no ombro; isso me fez entender que não existe um certo ou errado ali, nem em parte alguma. É tudo muito antropológico.

Pelo tempo que estive vivendo nas Casas FDE e mesmo na volta ao RJ não sofri nenhuma tipo de pressão quanto a postura que deveria ter ou sobre com quem poderia me relacionar, durante minha vivencia na Casa de BH tive um envolvimento de semanas com rapaz de fora da Rede o que não gerou nenhum problema.

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Bruno Torturra

FORA DA TIMELINE

Deprimido, confesso.

É chocante para mim ver tanta gente legal, tanta gente que gosto e admiro, comprando uma versão tão sombria, tão injusta e tão mesquinha sobre o Fora do Eixo e o Pablo Capilé. E, principalmente, desconsiderando a inteligência, o comprometimento e a coragem de centenas de jovens do Brasil todo que enxergaram no coletivismo, na vida compartilhada, uma escapatória, uma vida mais interessante do que a normalidade oferecia.

Centenas de jovens, sobretudo das cidades pequenas e médias do Brasil, lugares que pouquíssima gente que hoje acusa de “seita” o Fora do Eixo pisou. Centenas de jovens que, graças à conexão dos coletivos, à libertação que a cultura digital representou para artistas e comunicadores, viram uma chance de disputar, enfim, espaços, verbas e protagonismos que, antes, eram quase que exclusivos dos grandes centros. Do eixo…

Foi justamente essa libertação, esse comprometimento, essa nova autonomia cultural e política que me atraiu quando, há dois anos e meio, conheci a Casa Fora do Eixo em São Paulo. A turma havia acabado de se mudar para a cidade, e cheguei lá como repórter. Não entendi exatamente e até hoje luto para entender como funciona a economia pulverizada do FdE. Como uma moeda complementar se tornou o verdadeiro lastro de uma rede enorme.

Mas uma coisa era clara, e ainda é para mim: a criação de uma economia paralela, de um sistema de circulação cultural que não se separa da política, que emerge da rede, que tem uma ideologia contaminada pelo empirismo radical não me despertou desconfiança, mas muita curiosidade.

Já naquele tempo, no distante ano de 2011, desafetos e arranca-rabos online tentavam denunciar o FdE e apontar Capilé como um pilantra. A discussão era a mesma: cachês, promessas não cumpridas e conclusões dedutivas de que “algo estava errado naquilo tudo”. Sempre li e escutei essas acusações com paciência e certa perplexidade. E ver tanta gente, tanto artista, logo eles, acusando o FdE de ser simplesmente uma máquina interessada em dinheiro público era bizarro.

O que me chocava no FdE, e ainda choca, é a capacidade deles de realizarem grandes coisas quase sem recurso. De desmonetarizar relações em busca de um modelo de vida mediado por algo que não dinheiro… Isso, antes de ser revolucionário, é muito novo. Feito por gente tão jovem, sem lastro teórico, é ainda mais novo, ainda mais interessante e, necessariamente, cheio de defeitos, precipitações e contradições.

Para mim, que sigo vivendo sozinho, pagando contas com meu caixa nada coletivo, sempre vi a experiência deles como um expansor de consciência. Gente que, na prática, oferece muito mais do que demanda. Um laboratório riquíssimo onde eu era muito mais do que um observador. Eu era muito bem vindo, muito questionado, desafiado, confrontado. E onde eu encontrei companhia e um enorme comprometimento para tocar adiante ideias sobre mídia e ativismo que meus amigos de fora do fora do eixo sempre defenderam, mas nunca estiveram dispostos a colocar na rua. Por que não? Porque “precisam pagar as contas”. Esse desapego à mera viabilidade contábil é que permitiu que o FdE se tornasse uma potência. E isso incomoda, ofende, levanta todo tipo de desconfiança.

Não é fácil assumir a vida que os moradores da Casa Fora do Eixo escolhem. Dividem quartos, roupas, espaço. Abdicam mesmo de tempo livre em nome de construir algo juntos. E acho um profundo desrespeito a eles dizer que aquilo é uma seita, que sofreram lavagem cerebral por Pablo Capilé. O que muitos enxergam como autoritarismo em sua fala, para mim é uma urgência enorme que ele sente. Capilé é uma virtuose da articulação mental, verbal e política. Sua liderança não é imposta, é merecida e conquistada na prática. Ele vive na mesma casa, divide as mesmas roupas, o mesmo dinheiro curto e a mesma rotina atolada. Nunca foi meu chefe, mentor. É, e cada vez mais, meu amigo.

Muito além dele, nunca na vida conheci gente de 19, 20, 21 anos de idade tão inteligente, curiosa e articulada. E Beatriz os acusa de não frequentar cinema… Mas a maioria por ali não completou 25 anos e passa a vida circulando o país, discutindo política, cultura, mídia, pautando o Brasil e conversando, diretamente, com algumas das melhores cabeças da academia, da cultura e da política. Isso não é cinema, Bia. É realidade. Quando comparo com os universitários convencionais que conheço fica claro o abismo. Se isso é uma seita… amén.

No meio tempo, segui amigo de alguns dos maiores detratores do FdE. Inclusive de Beatriz Siegner, que conheci justamente naquele ano, enquanto nós dois nos aproximávamos da rede. Testemunhei alguns dos episódios que ela relata em seu texto. Estive, inclusive, do lado dela quando discordamos juntos de algumas posições de Pablo, Felipe, Talles… justamente sobre a importância do “tempo livre”, “ir ao cinema”, “passear mais”. Sigo discordando – brigando, inclusive – com eles quase todo dia. Mas meu ponto é outro.

Não quero, nem tenho como, destrinchar o texto dela aqui. Mas me ater ao básico: a leitura dela e de muita gente sobre o FdE não revela tanto sobre a rede quanto sobre a própria mentalidade automática à qual o FdE tenta resistir. Onde a “integridade”, como ela cobrou da rede, é medida sobretudo por grana, ego, logotipos. Mais ligada a uma dinâmica econômica do que um real compromisso com a transformação e com a tolerância ao erro, ao vacilo, até ao calote que um processo tão sério como esse pode, e vai, gerar.

Dito isso, volto ao início. Deprimi mesmo. Só quem está no dia a dia dessa construção sabe da bucha que é. De como não sobra tempo, energia, cabeça para lidar com coisas, no fundo, mais gostosas de fazer.

E o pior, não me revolta… me enfraquece mesmo ver o gente em geral passiva, cínica em seu emprego, insatisfeita com o status quo, ao mesmo tempo salivando com a possibilidade de minar um laboratório de algo novo. Ver meus amigos, gente que escolhi gostar, sem provas, sem evidências alguma, preferindo ver conspiração e sujeira. Sem paciência ou abertura, preferindo ver burrice e alienação. Escolhendo o sarcasmo no lugar da reflexão. Cobrando transparência de quem divide tudo. E, de quebra, tentando implodir a imagem do Fora do Eixo e da Mídia Ninja sem oferecer nada em troca. E ainda chamam o texto de Beatriz de corajoso… francamente.

Investiguem, mas não acusem dessa forma. Discordem, mas não agridam simplesmente. Não precisa gostar, não precisa aderir, não precisa defender nem passar pano. Mas vamos ser honestos: há algo muito maior em jogo do que cachês e impressões de uma cineasta.

Vou desplugar aqui. Não contem com respostas minhas aos comentários nessa timeline tão cedo. Quem quiser conversar ao vivo, eu topo. Prefiro. Com um ânimo quase zerado, preciso seguir trabalhando para erguer e organizar o site, a equipe, a proposta de financiamento da Mídia Ninja. E, quando arrumar tempo livre, tentar ver um filme, ler um livro, tomar LSD e falar sobre passarinho em vez de assistir a esse showroom de hidrofobia que minha timeline virou.

Em frente…

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Caiubi Mani

Casa Fora do Eixo São Paulo

 

Na boa, tem um monte de falador passa mal aí querendo arrastar. Utilizando os discursos mais maniqueístas pra dizer que tamo sendo desonestos. Entoando em alto e bom som, cadê a prestação de contas desse tal Fora do Eixo?

Quer saber? Vai procurar se tem alguma irregularidade por aí na praça. O que, eu duvido que vá encontrar, porque não tem mecanimos melhor de hosnestidade financeira do que esse tal Caixa Coletivo de que tanto falamos. Eu não vou entrar no debate conceitual sobre o caixa coletivo agora, mas tem muita gente criticando nosso sistema de compartilhamento radical encômico e financeiro, simplesmente porque ouviram de uma tal Beatriz Seigner que somos escravos (pos) modernos.

Na boa, quer etender melhor mesmo? Então porque não chega aqui na Casa Fora do Eixo São Paulo? é facinho. Todo mundo sabe onde fica, e a casa tá sempre aberta a visitas.

Sendo bem objetivo e prático. O Caixa coletivo fica logo na sala da frente, um movelzinho branco com gavetas, alí fica o livro caixa, ali ficam as notas e recibos e o dinheiro. E acreditem, temos notas e recibos de TUDO. Tudo detalhado, entradas e saídas de caixa. Tudo no preto e no branco pra quem quiser e se dispo a ver.

Eu já disse pra algumas pessoas e vou repetir, a transparência e a auto-gestão estão no pão de cada dia, no fazer o almoço, no tomar um café, no se trombar 5 vezes por dia no corredor, no lavar as roupas, limpar os banheiros e a cozinha, e dividir tudo por igual com quem tá com você. Por isso não me venha falar de que somos escravos (pos)modernos. Eu quero ver é você compartilhar a sua vida nos mínimos detalhes com um grupo de pessoas pra discutir a horizontalidade plena e transparência nos processos decisórios. Isso eu quero ver!

Apenas um desabafo rápido, porque eu to passado de tanto ver gente mesquinha e individualista falando mal do que nem se quer consegue compreender.

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Camila de Oliveira

Tantas pessoas se manifestando em relação à Casa Fora do Eixo que decidi manifestar também.
Quando conheci a Casa Fora do Eixo foi no aniversário de 10 anos da Revista Fórum. Gostei muito dos debates no dia do vento e as cabeças pensantes por lá.
Ali comecei minha jornada a ser parceira da FDE, pois , na época, debatíamos o projeto Nova Luz que impactava os moradores da região central, projeto esse imposto pelo ex-prefeito de SP, Gilberto Kassab.

No começo dessa relação com a FDE foi importantíssima, afinal, enfrentar a máquina pública se colocando contra um projeto urbanístico injusto era denso demais para nós. Nisso os “Felipes”, o da FDE e o da Revista Fórum, produziram um vídeo com a Paula Ribas, moradora da região da Luz e fundadora do movimento Apropriação da Luz e AMOALUZ com a intenção de expandir como articulávamos nossas ações e estreitar a relação desta parceria.
Participamos de reuniões, debates, programas até que realizamos juntos com outros coletivos o projeto “Preliminares”, em dezembro de 2012. Foi realizado na região da Luz debates, transmissões ao vivo, exibições de filmes nos prédios antigos da Rua Santa Ifigênia que tinha como objetivo de discutir a região central com sua complexidade in loco.

Em 2013, fomos além e avançamos na realização do programa Apropriação da Luz no Postv. Pensei no quanto seria importante trazer o protagonismo com as pessoas que moram e constroem o centro de SP. Esse projeto teve algumas edições e rendeu vários programas na qual revelou a identidade da região.

Foram momentos importantes para meu crescimento como pessoa e como profissional de comunicação que sou.
Tivemos que dar uma pausa no programa por novas e inéditas demandas.

O que eu tenho para falar sobre os “meninos e meninas” da Casa Fora do Eixo, em especial a de São Paulo, pelo estreito convívio? Gosto muito do Filipe Peçanha (Carioca), Thiago Dezan, Rafael Vilela (Pira), Dríade, já o Capilé pouco convivi. Mas, já nos encontramos e pelo facebook leio um pouco do seu raciocínio.

Desde sempre vi a Fora de Eixo como uma parceria e onde existem trocas importantes de experiências, de informações sem qualquer tipo explorações e abusos.
Sempre busquei aprender e conhecer processos tecnológicos de transmissão ao vivo que acho algo do momento que busca a transparência e mais participação pública. E foi na FDE que tive essa atenção.
Sempre digo aos “meninos” da casa de Sampa que precisam investir mais equipamentos para Postv uma vez que ainda não possuem equipamentos adequados e aproximar mais a molecada ociosa na cidade de SP que já vem com o “chip da tecnologia” no sangue. Si que isso demanda mais tempo, o que eles pouco tem nessa vida correria.

Noto uma dedicação total ao trabalho que realizam, mas não entendo isso como exploração ou alguém dando ordens do que fazer e, sim, algo que queriam fazer por envolvimento e por acreditarem naquilo que fazem. Como eu também queria fazer e fiz. Sempre tive sede de inovar e fazer algo em prol de algo que partisse da cultura, da arte, da política e do social.

Sou uma colaborada da Mídia Ninja nas horas que posso, pois tenho um trabalho, faço faculdade e vivo meu lazer indo ao cinema, parques, praia e assim vai.
O que digo aqui sobre a Casa Fora do Eixo é a minha relação que tenho de um tempo considerável, e desconheço alguns assuntos de como a casa se mantém e a vida colaborativa que vivem. Isso de fato não me interessa muito, o que interessa é a parceria que construímos.

Todos tem o direito de falar sobre as suas verdades e a minha neste momento é essa.

Enfim, nunca tive problemas absurdos, gosto muito desse pessoal. Para mim eles acharam uma razão e motivo de seguir a vida em prol de algo que acreditam. E cabe a cada um que participa da casa ou é parceiro escolher. Digo que as parcerias têm limites, amizades tem limites e cada um se relaciona com aquilo que pode dar, isso se estiver afim. Mas se não estiver afim, nem se aproxima. Parceria tem dessas coisas.
E sobre “jovens se entregarem assiduamente a essa casa”, cada um sabe de suas responsabilidades e escolhas, mesmo que elas sejam ainda de um jovem. Mas, que as escolhas podem nos oferecer alguns caminhos: a dor ou nos fazer florescer.
Vejo tudo isso realmente como um laboratório, lógico que todo laboratório tem as suas falhas. Talvez não tão graves quanto as praticadas a décadas pela velha e prejudicial grande imprensa. É outro e um novo caminho para uma expressão mais livre e com mais transparência. Acho que é uma renovação na proposta em comunicar e organizar as narrativas atuais. Pois, é esse novo olhar que vai definir uma nova história.

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Ynaiã Benthroldo

De tudo que esta sendo falado e compartilhado , o que mais agride é colocar em cheque a capacidade de discernimento das pessoas, a escolha do modelo de vida, praticas, e questionar a minha vida com o referencial do umbigo.
É muito baixo o nível dos ataques a rede, com uma visão distorcida do que é o fora do eixo e as pessoas que o forma. Ataques preconceituosos, caluniosos, e que ferem não só a um mais a todos os membros da rede. No texto de Beatriz, ela carrega a crise em seu umbigo, e faz um filme de terror baseado em seu discurso de vitima. Nos pinta de religiosos fervorosos e zumbis … falta com respeito e conhecimento de causa, experiência aprofundada… é um ataque sem escrúpulos.

Estamos a 10 anos ai dispostos a viver a nossa vida quebrando paradigmas e cada vez mais nos aproximando da nossa ancestralidade , gerando conflitos com esse “projeto branco” que está posto. Na música, na política, na economia, nas redes e nas ruas Estamos colorindo as nossas vidas e editando as melodias sopradas pelos novos tempos. No final, a historia vai dizer.

Quem ta junto nesse bonde sempre se fortalece, nunca se abala!

Axé!

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Pena Schmidt 

 

“As pessoas que trabalham para um mundo pior não descansam.
Como eu posso?”

Bob Marley em cima do palco, dois dias depois de baleado por um assassino.

Lembrei de meus amigos. Pablo Capilé e Bruno Torturra, que estão perdendo um tempo precioso numa inquisicao. Não esmorecer, é o recado. Firmeza e nobreza.

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Luis Felipe Marques

Eu sou do Fora do Eixo.

Eu não sou um Robô.

Tenho uma história, tenho opiniões, leio muito e reflito muito a respeito de tudo que acontece ao meu redor. Não sou fanático, tenho muitas dúvidas em relação a muita coisa do mundo e estou na missão de retirar cada uma delas, passo a passo.

Minha idade é de 24 anos, nasci em Mirassol (SP) e depois de muito rodar pelo interior e fazer alguns anos de Física, conheci o Fora do Eixo através da Casa Sanca, que na época consolidava sua segunda geração em São Carlos (SP). Era 2011, o primeiro ano da Casa Fora do Eixo São Paulo, a qual eu conheci na semana da Primeira Marcha da Liberdade. Naquela semana eu senti como se um portal tivesse se aberto na minha frente. Eu, que começava uma tímida militância entre amigos pela causa da maconha, de repente via a 20 minutos a pé de casa uma conexão com um mundo que não parava de me surpreender.

“Quer dizer que eu posso trabalhar de forma autônoma com projetos culturais e de comunicação, praticar ativismo e viver coletivamente?” . Eu não sabia nada de redes, nunca fui produtor cultural e tinha muita vontade de estar envolvido com aquilo. Larguei a universidade, não disse tchau pra ninguém, e abracei a oportunidade. Poucos meses depois, bem mais cedo do que eu esperava ou imaginava – como tudo que acontece nesse mundo – estava morando na Casa Fora do Eixo, na capital onde sempre quis viver.

De militante casual e restrito da legalização, em poucos meses eu pude participar de Marchas da Maconha, conhecer grupos de militância, vivenciar diferentes experiências na cidade, além de todos os dias poder acompanhar e narrar ao meu lado centenas de debates na Pós TV sobre meio ambiente, política, cultura, jornalismo, esquerda, direita, militarismo, morte da juventude, situação do Haiti, liberdade de expressão, democratização da comunicação, fotografia, cinema, teatro, e a lista continua. Isso sem contar o sem número de pessoas que circulavam nas casas trazendo perspectivas e costumes de todos os tipos possíveis: músicos, atores, atrizes, dançarinos, produtores, escritores, designers, fotógrafos, acadêmicos, ativistas do Brasil, Argentina, Alemanha, Guatemala, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Peru, Portugal, Espanha, Cabo Verde e eu poderia continuar citando ocupações e lugares. Isso tudo sem contar a vivência conhecendo experiências e coletivos de todo tipo de realidade em São Paulo. Além disso, conheci lugares, realidades e contextos diferentes com oportunidades de visitar o Rio, Luziânia, Vitória, Porto Alegre, Paraisópolis, Catalão, e a lista corre…

Eu poderia continuar por parágrafos e parágrafos relatando detalhes de como foi conhecer o Andrew Jennings, participar do Existe Amor em SP, estar presente em manifestações, parada LGBT, escrachos, aulas públicas, assembléias, fóruns de mídia livre, espaços cognitivos diferenciados e avançados. Mas o meu ponto aqui é: se isso não é vivência cultural, o que é então?

E depois do relato de ontem, da Beatriz Seigner, sintetizando um monte de mito e um monte de mimimi sobre a rede, recentemente, eu gostaria de fazer algumas considerações.

Eu tô há 2 anos e alguns meses na rede, e eu ainda acho que sei muito pouco sobre políticas de rede, economia solidária, porque quanto mais experiências eu conheço, mais eu descubro que há coisas a conhecer. Eu, que vivo intensamente e respiro isso todos os dias, tenho a humildade de dizer que ainda tenho muito conhecer, e sou obrigado a ler um relato de alguém que circulou pouquíssimo pela rede, achando que entendeu tudo dela.

Eu não sou manipulado e nem sou escravo, e exijo respeito com as decisões que eu tomei pra minha vida. Eu invisto o que eu sei nisso porque eu acredito, e pode ter certeza que a minha digital tá impressa em muitas das metodologias que estão por aí, entre elas o NINJA, que muito me envolvi na construção. Muito me admira ver, não só nesse relato, mas na timeline de um monte de gato-pingado que nunca vi na vida, revoltados porque estamos sendo explorados ou porque somos “proibidos” de vivenciar práticas culturais e condenados a viver em uma “seita maléfica” que só quer poder.

Agradeço à bondade de todos os salvadores da pátria que querem me tirar das garras do novo capitalismo, mas eu tô bem diboa desse papinho intelectual que quer engavetar tudo que não entende e só quer revolução se for com marca registrada. Estou muito bem, obrigado! Faço o que gosto, vivo feliz e não concordo com nenhuma das acusações irresponsáveis que não só a Beatriz como muita gente anda espalhando por aí sem o menor conhecimento de causa.

Viver em uma casa coletiva é transformador. É entender as micropolíticas, é ser generoso com quem tá no corre com você, humilde pra assumir os erros e forte. A não separação de vida e trabalho não é uma conveniência, é uma escolha, e não passa de interpretação de palavras.

Não existem processos perfeitos, mas existem processos honestos, que se corrigem, e estar em um processo como esse é incomparável com qualquer experiência que eu poderia ter, me fez crescer de verdade e realizou mais desejos do que eu imaginava, e por isso eu luto diariamente pra que o processo se amplie, se sistematize e consiga ressurgir em diferentes contextos e diferentes roupagens. Quem vive dentro sabe que a metodologia das redes é muito mais eficiente do que um confortável salário que te permite um mundinho onde eu tenho minha válvula de escape pra não precisar enfrentar de verdade questões complexas. Ela busca soluções porque conta com várias contribuições pelo caminho.

Repito, pra finalizar, a célebre sentença de Sabotagem que já citei em outras ocasiões semelhantes:

“Há 3 tipos de gente:

os que imaginam o que acontece
os que não sabe o que acontece
e os que faz acontecer”

Cada um tá deixando claro a qual grupo pertence.

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Jandira Feghali

Em 2011 retornava à Câmara com um desejo latente: reinstalar a atual e combativa Frente Parlamentar em Defesa da Cultura. Antes de assumir a atual Comissão de Cultura, era meu objetivo reintegrar a pauta da área ao cenário político do parlamento nacional e suas demandas sociais, regionais e populares. Essa brasilidade estava sem um motor potente. E foi na presidência da Frente que pude ter contato mais próximo da turma do Fora do Eixo, ancorada pelo Pablo Capilé e já frequentador assíduo de fóruns, conselhos e debates sobre a cultura nacional. E quer saber? Eles são incríveis.

Onde já se viu jovens que rompem a geopolítica da mídia nacional e tradicional, funcionando num coletivo plural, diversificado e empenhado dentro de todos os estados brasileiros? Empenho rima, muitas das vezes e na maior parte delas, com juventude. Suas casas fomentam ideias, formam midialivristas de enorme capacidade para atuação e constroem uma sociedade que desafia a lógica do capitalismo arcaico.

Eles nascem como um coletivo – distante da concepção ou da realidade mundana de todos nós – e se desenvolvem como teias de ação em causas. Se a madeireira do Norte está dando problemas aos indígenas, provavelmente um Mídia NINJA irá relatar o desespero real de sua tribo com seu iPhone. Se um festival de rock precisa de fôlego no Sul, provavelmente o Fora do Eixo atuará naquilo que desenvolve com paixão, o marketing e o ressoar de informações das redes sociais. Se autocapacitam e se autodesenvolvem numa sociedade própria que não só divide roupas e camas, mas também ideias e potencialidade da comunicação em massa.

O Fora do Eixo rompe com aquilo que está programado e é realmente difícil entender ou aceitar esta iniciativa por quem não se relaciona corriqueiramente com a diversidade de nossa modernidade. É perigoso e injusto acusa-los de propagadores de escravidão pós-moderna, visto que seus membros são jovens libertários, de cabeça aberta, ligados no mundo e ativistas sociais. É duvidar da inteligência de seus membros e, pior, atacar suas liberdades individuais. Será que suas vidas realmente estão “presas” ao FdE? Ou será que encontraram um modelo de acúmulo de experiência e desenvolvimento técnico muito mais enriquecedor, onde seus objetivos diários se correlacionam profundamente com seus desejos internos por lutar por uma causa?

O FdE incomoda muita gente, obviamente. Quem desafia um sistema acaba desafiando muitas pessoas comprometidas com interesses próprios na montagem de uma realidade restrita. Mas ao contrário destas pessoas, o FdE abre o debate de ideias sempre. Basta acessar o perfil de seus articuladores ou participar dos encontros abertos do coletivo. Não se escondem e nem abafam acusações. Pelo contrário, participam do embate. Mostram seus argumentos. Num país onde os reacionários tentam pregar o obscurantismo na liberdade de expressão e a direita conservadora achacar os movimentos populares e sociais, quem se abre para o diálogo é espécie em extinção. Mas no caso do Fora do Eixo é incorreto afirmar isto. Ao se abrirem para a conversa democrática mostram-se mais interessantes. E melhor, mais verdadeiros ainda.

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Diná Matias

Sim, eu tenho 18 anos e desde os 16 dedico 24 horas do meu dia a trabalhar com o que gosto e acredito. Faço parte do Fora do Eixo e divido a casa, a vida, o trabalho, as alegrias e pesares com muita gente! Pra quem acha que é trabalho escravo ou algo do tipo, desculpa mas vou bem, obrigada!
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Nilmário Miranda

O Fora do Eixo existe há dez anos e construiu uma rede respeitável de intervenção cultural. Foi totalmente ignorado pela mídia hegemônica, como se não existisse. Construiu seus 200 coletivos com mais de dois mil ativistas. Foi subestimado como força social na cena cultural. Virou inimigo quando entrou na comunicação com a Pós Tv e a Mídia NINJA e teve papel importante aos transmitir as manifestações. Com a prisão de dois jornalistas da Mídia Ninja, virou notícia na imprensa internacional. Na matéria da Veja o que menos importa é a verdade.

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Branca Schulz

Casa Fora do Eixo Porto Alegre

 

Quando estava na faculdade muitos amigos ou até colegas achavam que eu fugiria com o circo e teria uma vida mambembe. Hoje, quando penso na construção e nas opções de cada passo que dei até chegar aqui e estar fazendo parte do processo do Fora do Eixo, conectando as pontas do sul às demais pontas desse “continente”, sei que não fugi com o circo, mas aderi a vida mambembe, desterritorializada, diversificada, cheia de sotaques, culturas e desafios.

De formação clownesca e de laboratórios em web performances, minha dedicação à essas linguagens, por muito tempo foi integral. Dediquei no mínimo os 11 anos, que precedem minha migração para Porto Alegre (onde hoje resido na Casa FdE Sul), ao fazer cultural, sendo ele em cima de um palco ou nas coxias. Durante esse período de formação acadêmica a também impírica, compreendi que meu campo de estímulo pairava na gestão e elaboração de estruturas, plataformas e maneiras criativas para a viabilização dos sonhos, que todos nós, artistas, temos.

Dentro do Fora do Eixo, mais de 50% de seus integrantes já foi um artista, ou ainda o é. E é, a partir desta também vivência que construímos uma das, digo “das” porque existem várias, plataformas de circulação e distribuição de bens culturais existentes em nosso país. Porém, essa construção se dá por meio do “aqui e agora” da escassez e não da abundância. O desenvolvimento dos aplicativos do precariado, ou seja, de ferramentas de uso comum, hoje apropriadas por inúmeras redes e movimentos que também possuem em seu DNA a circulação desses bens, são provenientes da “sivirologia” e da capacidade de exercitar a inteligência coletiva embebidos pela sensibilidade cultural de cada um que aplica sua digital neste processo. A abundância reside ai. Logicamente que a estruturação e manutenção dessa plataforma se dá pela dedicação diária das mais de 2 mil pessoas conectadas em rede. E os desafios, percalços e obstáculos são constantes. Cada ponta é um território e cada território tem sua esfinge. Decifrá-las é uma das questões. Os aplicativos do comum se tornam ferramentas para que mais e mais pessoas, vinculadas ou não ao Fora do Eixo, colaborem com a descoberta destes enigmas.

Depois de 7 anos a plataforma de circulação desenvolvida é sincera. Não há promessas. O que há é um mapa, um georreferenciamento, de cada cidade conectada e de suas realidades, tendo claro que cada uma delas apresenta e propõem suas condições para receber qualquer pessoa. E o “qualquer pessoa” entenda-se como artista, gestor, colaborador, público, vizinho, extrangeiros, comunidades, etc. Não privaremos, nenhuma cidade desse Brasil Profundo a fazer parte do Mapa da Cultura e do Movimento das Culturas. A descentralização da cultura é pensada e milimétricamente calculada em planos de viabilidade onde o capital vigente é o simbólico. Flanar por ela também é uma opção livre e esclarecida.

A lógica do R$ 1 para FdE$ 10 (card) está na capacidade de abertura para uma economia coletiva que pauta o capital, ou seja, não é pautada por ele, a lógica se inverte. Criam-se alternativas de sustentabilidade, criam-se formas de vida. Todos se tornam multiplicadores e investidores do processo cultural do país. A capacidade de articulação e mobilização bem como dedicação em um projeto de vida, são investimentos e não horas perdidas. Se fossemos fazer um cálculo por alto do valor necessário de fomento público e/ou privado para todas as ações culturais dos movimentos e coletivos desse país, a quantidade de zeros subsequentes ao primeiro número extrapolariam as laúdas de qualquer artigo e/ou rancor. E se fossemos esperar por esses recursos, seríamos responsáveis pela mumificação da cultura de nosso país. Não é o caso.

O lastro da moeda (card) e do próprio Fora do Eixo está na confiança no outro e no processo. Se optamos por essa vida que é elevada ao ‪#‎tudoaomesmotempoagora‬ é porque temos claro os desafios e, principalmente, as responsabilidades como investidores da cultura. Não iremos nos eximir em nenhum momento delas. E estamos abertos a todo e qualquer debate. Cada minuto “depositado” na cultura nos propõem também a quebra dos gruilhões que prendem muitos artistas e produtores culturais às premissas e práticas da indústria cultural e na passavidade de : “se não tenho o recurso, não faço”. A partir dessa perspectiva, quem é o escravo?

Pensar que nossa dedicação à cultura do país e da América Latina nos exime de nos alimentar de bens culturais é muito nonsense, beira a leviandade. Quem mininimanete consegue fazer o exercício de visualizar além de seu próprio úmbigo enxerga o histórico da rede que se construíu pelo circuito cultural. Desde de 2011 a Casa Fora do Eixo São Paulo, por exemplo, a residência cultural já recebeu mais de 2 mil agentes na hospedagem solidária, realizou 450 eventos e 80 imersões, todas pautadas ou demandadas pela esfera da cultura, sendo que mais de 80% foram realizados colaborativamente e financiados pelo card, ou seja, pelas inúmeras mãos que constituem redes em redes.

Elaborar uma leitura sobre a complexidade do Fora do Eixo a partir de uma vivência de circulação é no mínimo ingênuo. Quem realiza produção cultural sendo um festival de pequeno, médio ou grande porte, por exemplo, sabe o quanto de energia e concentração se precisa para que a ação planejada saia redonda. Logicamente que dentro do Fora do Eixo, as produções das ações no interior, normalmente, são realizadas por um grupo de reduzido de pessoas (2, 3, 4…) e dar conta de toda a estrutura, logística, programação e demais funções é colocar em prática o R$ 1 para FdE$ 10. Eu já produzi um número expressivo de festivais e posso contar nos dedos quantas vezes consegui assistir um espetáculo de artes cênicas ou um show de uma banda na íntegra. Foram poucos, mas isso não é porque não tenho interesse, apresento outra mirada, isso é porque o objetivo maior é fazer com que a porra do skype funcione para que alguém da outra ponta do país se conecte, ou que a banda não atrase para o show, e que o grupo de teatro tenha uma boa alimentação, que equipe esteje estimulada, que o receptivo não falhe no atendimento de nenhum participante do festival e por ai vai… produção de evento, quem faz sabe.

Hoje, após 5 anos de cumplicidade compartilho radicalmente minha vida e trabalho com aqueles que optaram por construir juntos um novo mundo possível. A ‪#‎Economiadavida‬ aplicada à sua última potência. O compartilhamento dos saberes, das alegrias, das tristezas, dos medo e angústias, mas acima de tudo o exercício da generosidade para com o processo do outro. Desapegar-se aos costumes tradicionais e o consumismo exacerbado. Desapegar-se dos conceitos e práticas pequeno burguesas. Levantar a cabeça, olhar o horizonte e voltar a imergir. Optei sem medo em ser Fora do Eixo por me sentir aqui representada e com espaço de atuação livre e horizontal. Aprendi a respeitar a opção do outro, buscando tentar realizar exercício de olhar de dentro e não de fora. Falar é fácil, difícil é o fazer.

Os paradigmas estão sendo, cotidianamente, quebros, reconfigurados e ressiginificados. Há, e sempre haverá, os incomodados, os ciêntistas do “achismo”, os filósofos de poltrona e os “artistas iluminados”. Há, e sempre haverá, os provocadores, os pró ativos e os ativistas. Sempre averá o rancor, o amor, o campo de diáologo e a (con)vivência. Há campos de atuação para tudo e todos. O que não há é a certeza que o velho discurso vitimizado será o protagonista.

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Kaley Michelle

A galera vem me cobrando um posicionamento sobre NINJA e Fora do Eixo, visto que, já participei ativamente do núcleo-coletivo que se estabeleceu em Curitiba durante entre 2011-2012. Participei de reuniões nacionais e regionais em Porto Alegre diversas vezes. Tenho lido textos e postagens daIvana BentesPablo CapiléAlex AntunesLaís Bellini, amigos contra, amigos a favor, músicos que já lucraram através da rede e dizem “aiiin, posso achar legal Midia Ninja e odiar FdE?”. Minha opinião é que não há maniqueísmo se tratando de cultura, política, PT, PSOL (ou qq partido outro),Fundação Cultural de Curitiba (grande exemplo, com gente competentíssima e dedicada, e outros que não gostam de trabalhar), mídia tradicional, mídia alternativa, redes, coletividade e acima de tudo SERES HUMANOS. Portanto, minha opinião é que Fora do Eixo é tipo Herbalife. Os produtos (objetivos) realmente fazem diferença e são de qualidade. Virar vendedor da Herbalife (viver dentro da rede com dedicação integral) exige um puta investimento de tempo e finanças. Ninguém mora numa casa, abre mão da sua privacidade e individualidade, nem vive de caixa coletiva à força. Aproveitei muito o meu tempo acompanhando a rede, conheci gente legal, acho que transmiti conhecimento também. Talvez eu não tenha investido igual a Laís porque já tentei vender Herbalife antes e me fudi…rsrs. A lição mais valiosa que tirei da FdE é a de que artista (e produtor) TEM OBRIGAÇÃO de se posicionar politicamente, pois só assim teremos as mudanças que queremos. Não existem capetinhas e anjinhos galera, em lugar nenhum. Não gosta do FdE? Por amor, faça do seu jeito, inove, construa! Se cada crítico da rede estivesse ativamente fazendo algo para mudar a realidade da arte e da política no país, seria TUDO DIFERENTE. Quero ver a oposição ativa! Aqui em Curitiba ainda existe nosso Tubo Coletivo. Não estamos mais ligados á rede, porém nos ajudamos e apoiamos mutuamente e alguns conseguem sim, ainda atuar aproveitando as estruturas disponíveis. Assinado: alguém que não perdeu seu tempo.  (ah, outra coisa, não vou responder nenhum comentário a esse post, não é pra virar um debate na minha TM, é só pra eu me manifestar, se quiserem debater entre si fiquem à vontade.)

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Clayton Nobre

Também tenho minhas revelações sobre o Fora do Eixo. uuuu 

Muita gente sabe que eu faço parte da rede e muitos já tão acionado pra saber que história é essa de trabalho escravo. Tendo lucidez, todo mundo quer saber como eu e mais outras centenas de pessoas (!!) nos deixamos atuar sob o direcionamento e as ‘normatizações’ do Fora do Eixo?

A resposta é franca e não deixa de ter, espero, a profundidade que é própria da característica da rede. Eu poderia, se me tivesse tempo e paciência, esmiuçar cada detalhe da crítica feita por Beatriz Seigner, por exemplo. Prefiro me poupar um pouco e partir para um debate qualificado, absorvendo dali algumas ideias francas da cineasta que nos fazem perceber sua incompatibilidade com o trabalho que queremos construir. Mas, pior que isso, ela mistura ao texto uma gordura estética de calúnias, mentiras e frases de efeito usadas pra dar força à sua fúria e posição ideológica – pra não dizer outras qualidades.

1) Sobre o tal trabalho escravo. Eu entrei no Fora do Eixo quando estava em Manaus. A minha entrada e participação foi como a da maioria das pessoas que estão envolvidas nela. Entraram por alguma oportunidade de atuação no campo da comunicação e das artes até se dedicar integralmente ao coletivo. No meu caso, larguei emprego de uns bons R$ 2 mil mensais. Acho particularmente significativa essa parcela da classe média de diversos lugares do Brasil, que largam emprego e/ou universidade para uma vida sem salário e sem patrão. Eu, como essa galera toda, há uns 5 anos, tinha uma oportunidade de seguir a vida com tudo o que a sociedade tradicional tem direito: faculdade, salário, casa, emprego e a riqueza acumulando na poupança.

Entrei definitivamente quando havia a proposta de montar um núcleo de artes cênicas atrelada à plataforma que, até então, já construía sua história na música brasileira. Minha proposta era colaborar, o mínimo que fosse, com as artes cênicas. Ajudar a criar projetos que pudessem conectar os cênicos locais, a partir da experiência de amigos do Coletivo Difusão. À época, essa era minha ideia. Não obstante, o circuito cultural me puxou para um amplo movimento social. Largar tudo pra viver de cultura, ainda mais com um emprego fixo, já se mostrava como uma solução possível àquela época. E claro, pelo menos a mim, o medo era latente. Não à toa, persisti em outro desejo: sair de Manaus, conhecer o mundo, continuar estudando sempre. Veio a oportunidade recente de construir a Casa Fora do Eixo Minas, e a escolha foi definitiva.

Eu lembro muito bem quando o Coletivo Difusão se firmou em Manaus. A realidade que a gente tinha era que nenhum empreendimento, um cineclube que seja, conseguia se sustentar por mais de seis meses. A ideia de conectar um coletivo da Amazônia ao resto do mundo pareceu fenomenal e deu caldo que agora rende pra região inteira. Um coletivo se sustenta porque é um nó de rede, e trabalhar numa perspectiva de desmonetizar essas relações entre arranjos de norte a sul é fundamental. A matemática parece complicada, mas o fato é que a resistência pelo modelo de negócios analógico ainda é vigente no pensamento retrógrado de muita gente. O exemplo que Anderson Foca trouxe dia desses é exato: você tem um amp de 200 contos, o designer faz um cartaz pelo mesmo preço. O dinheiro desaparece num processo simples de colaboração. Imagina isso numa perspectiva de trabalho em rede.

2) A matáfora do duto. Essa é ótima! É preciso relevar um pouco a raiva da Beatriz ao fazer seu relato sobre o debate que presenciamos aqui em BH e perceber como ela própria dá o tiro no pé. Retomo aqui o que escrevi pra uma amiga há pouco: se tirarmos as mentiras deslavadas que ela põe na fala dos outros, ela mesma deixa perceber o próprio ego inflado de artista com A maiúsculo. Eu acompanhei esse debate na época. Resumindo muito ligeiramente, a discussão feita é que o artista criador não basta por si só, se ele próprio não se compromete com o escoamento de sua produção (o duto).

Mas essa é uma das lógicas que distancia muito artista do Fora do Eixo e que gera os debates mais picantes. Chegamos a falar que todo mundo é artista. O artista que se sente protagonista em pleno século XXI, seja músico, cineasta, ator, sente falta desse mercado que estabiliza a indústria, concentra riqueza e sonega. Quem é o escravo nessa história?

3) Tem outras acusações que não deixam de ser engraçadas, se não fosse o teor calunioso. Chamar geral pra sair na foto pra mascarar a grandeza do Fora do Eixo é uma das pérolas mais brilhantes! E a proibição à leitura, é outra balela. Ainda com uma dissertação e R$ 40 da biblioteca de dívidas, vivo o Fora do Eixo e não deixo de ler livros  Conhecimento que, na nossa perspectiva, também é multiplicado, já que em rede estamos em fluxo constante. De que valeria o banco e os grupos de estudos promovidos pelo FdE se há não adeptos à leitura?

4, pra terminar) Muita gente tá reclamando que o Fora do Eixo só rebate críticas apontando “rancor” na opinião das pessoas. No caso da Beatriz, veio de graça. É simples o porquê. Os fatos que ela contam já duram há mais de um ano. Poderia ter vindo à tona há muito mais tempo. Por que vieram agora? 

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Marcelo Monteiro

Vou aqui dar meu depoimento, pois estou vendo mais uma vez uma enxurrada de compartilhamentos, sobre um tal depoimento de uma tal cineasta, da qual eu nunca ouvi falar, sobre como funciona o Fora do Eixo.
Eu tenho tido contato com os integrantes do FdE desde 2009, quando participei pela primeira vez do Macondo Circus em Sta Maria, e vou dizer, este é sem dúvida o maior, melhor e mais bem organizado evento cultural de nosso estado. Lá tive a chance de ver e rever novamente em 2012, como esses jovens de diferentes áreas atuam, em prol de um grande evento, envolvendo centenas de artistas das mais diversas áreas, com rapidez, agilidade, responsabilidade e seriedade.
Fui sempre tratado com seriedade e respeito pelo trabalho que faço, sem ter aquela ponposidade e exagero de estrelismos, que a mídia e a maioria das pessoas acham que se deve tratar um artista.
Vi a Casa Fora do Eixo nascer em Porto Alegre, e conheço todos desta casa, e os que por ela passaram. Sempre houve espaço pro debate, e uma abertura para o diálogo e entrosamento das areas de comunicação e cultura. O que por outra vez o próprio estado e prefeitura nunca propuseram.
Nos movimentos sociais, e tragédias pouco assistidas pelo governo e burguesia desta província, eu os encontro sempre, presentes, ativos e atentos.
Sei bem de alguns artistas que participam ativamente do FdE, que por opção, deixaram o glamour do palco, das turnês, pra se engajarem nessa causa, que é urgente e legitima. E não vejo ninguem enriquecendo dentro dessa casa, bem pelo contrário, vejo um numero de seres-humanos exercitando o desapego do ego, por uma causa verdadeira, a qual o mercado e o governo já não dão conta.
Eu não creio que o mecanismo capitalista vigente de trabalho, seja na comunicação como na cultura, funcionarem no nosso presente atual, e vejo no movimento Fora do Eixo uma nesga de otimismo, na troca e no fortalecimento entre redes de coletivos, de agentes, artistas e pessoas com nenhuma preguiça, pra ter um futuro, com uma relação mais humana nas nossas necessidades de produção.
E me surpreende gente que trampa com cultura, que inscreve projeto pra edital furado do governo e da prefeitura, se deixar levar por notícia e fofoca manipuladora e duvidosa, logo num prazo de menos de uma semana depois de transmitido um programa de entrevista que esclarece o fortalecimento e força de uma proposta, que não é nem mais tão nova, mas que incomoda a velha guarda da direita e do falido jornalismo deste país aprisionado e hipnotizado por uma cultura televisiva calhorda, logo agora que temos a web pra nos salvar de tanta babaquice.
E como artista, vou dizer, eu me valorizo e não me deixo enganar, nem pelo governo nem por jovem que mora em república, eu me faço respeitar e não pago pau pra governo, empresa privada, banco nem ong. Se cada artista se colocar e se posicionar com segurança, o resto segue como tem que ser, e se for pra resolver, que se resolva cara a cara, não por depoimento jogado em rede social, pois isso sim, não tem nada de profissional.

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